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Desenho

O desenho é um suporte artístico ligado à produção de obras bidimensionais, diferindo, porém, da pintura e da gravura. Neste sentido, o desenho é encarado tanto como processo quanto como resultado artístico. No primeiro caso, refere-se ao processo pelo qual uma superfície é marcada aplicando-se sobre ela a pressão de uma ferramenta (em geral, um lápis, caneta ou pincel) e movendo-a, de forma a surgirem pontos, linhas e formas planas. O resultado deste processo (a imagem obtida), portanto, também pode ser chamada de desenho. Desta forma, um desenho manifesta-se essencialmente como uma composição bidimensional formada por linhas, pontos e formas.

A representação do homem vitruviano, como imaginado por Leonardo da Vinci, é um dos desenhos mais conhecidos do mundo

O desenho envolve uma atitude do desenhista (o que poderia ser chamado de desígnio) em relação à realidade: o desenhista pode desejar imitar a sua realidade sensível, transformá-la ou criar uma nova realidade com as características próprias da bidimensionalidade ou, como no caso do desenho de perspectiva, a tridimensionalidade.

Desenho como projeto

O desenho livre nem sempre é um fim em si. O termo é muitas vezes usado para se referir ao projeto ou esboço para um outro fim. Nesse sentido o desenho pode significar a composição ou os elementos estruturais de uma obra. Mais corretamente, isso é denominado bosquejo, debuxo, esboço ou rascunho.

Na língua espanhola existe a distinção entre as palavras diseño (que se refere à disciplina conhecida como design nos países lusófonos, ou ao projeto, de uma forma geral) e dibujo (que se refere ao desenho propriamente dito). Estudos etimológicos de Luis Vidal Negreiros Gomes indicam que também no português existiam essas nuances de significado, no entanto as palavras foram mudando de sentido. Debuxo atualmente significa apenas esboço, bosquejo, ou desenho nos seus estágios iniciais.[1] A palavra desenho além do sentido de projeto, ganhou as significações de "qualquer desenho", "qualquer esboço", "desenho (debuxo) no seu estado final". Com o tempo debuxo deixou de significar "qualquer desenho" e significa apenas "esboço", "bosquejo", "rascunho". Desenho mudou de significado (projeto apenas), e englobou vários outros, mas preservou algumas dos sentidos de projeto. Atualmente a língua portuguesa incorporou a palavra design que comporta o sentido de desenho como projeto. A palavra "debuxo" também está sendo usada no sentido de "design" (uma inversão do sentido original).

O primeiro registro da palavra Desenho com o sentido de projeto foi em 1548 na obra Diálogos em Roma do pintor e humanista português, Francisco de Holanda. ''O desenho, a que e outro nome se chamam debuxo, nele consiste e é a fonte e o corpo da pintura e da escultura e da arquitetura e de todo outro gênero de pintar e a raiz de todas as ciências."[2] Sobre este tema também merecem destaque as obras do mesmo autor: DA FÁBRICA QUE FALECE A CIDADE DE LISBOA e DE QUANTO SERVE A CIÊNCIA DO DESENHO E ENTENDIMENTO DA ARTE DA PINTURA NA REPÚBLICA CRISTÃ, ASSIM COMO NA PAZ COMO NA GUERRA, ambas de 1571.

Desenho, portanto, é uma palavra de origem portuguesa.

Desenho, gravura, pintura

Entre os suportes artísticos tradicionais, três deles manifestam-se em duas dimensões: o próprio desenho, a gravura e a pintura. Embora o resultado formal de cada um deles seja bastante diferente (embora o desenho e a gravura sejam similares), a grande diferença entre eles se encontra na técnica envolvida.

A gravura difere do desenho na medida em que ela é produzida pensando-se na sua impressão e reprodução. Seus meios mais comuns de confecção são a xilogravura (em que a matriz é feita de madeira), a litogravura (cuja matriz é composta de algum tipo de pedra), a gravura propriamente dita (cuja matriz é metálica) e a Serigrafia (cuja matriz é uma tela) uma técnica de imprimir sobre tecido. Existe ainda uma técnica chamada monotipia, mais próxima da pintura, na qual se obtêm apenas uma impressão.

Gesto

Um desenho composto basicamente de linhas, com algumas texturas e sombreados

A composição pictórica expressa pelo desenho pode representar situações e realidades diversas: aquilo que o artista vê quando desenha, uma cena lembrada ou imaginada, uma realidade abstrata ou, no caso do desenho automático (proposto pelos surrealistas), pode vir a surgir com o movimento livre da mão do artista através do papel (ou de outra superfície). No processo da grafomania entóptica,[carece de fontes?] em que os pontos são feitos nos locais das impurezas ou de variações de cor em uma folha de papel em branco, e as linhas são feitas então entre os pontos, superficialmente falando, o tema do desenho é o próprio papel.[carece de fontes?]

Estas várias atitudes do desenhista em relação ao resultado do desenho manifestam-se através da técnica escolhida por ele, evidenciada pelo seu gesto. O gesto está profundamente relacionado à natureza dos movimentos da mão humana e à forma como a visão (ou o raciocínio visual, de uma forma geral) os influencia. Algumas técnicas, quando de uma abordagem figurativista do desenho, incluem:

Linha pura

Este é um desenho composto predominantemente por linhas (as quais simplesmente delimitam os objetos desenhados, sem a intenção de explicitar seus sombreados ou texturas). É normalmente o primeiro tipo de desenho com o qual um estudante entra em contato - o que não significa que seja este um tipo de desenho de pouca complexidade. A linha pura também é utilizada como etapa inicial do desenho de uma perspectiva.

Tom de linha

Este é um tipo de desenho que pretende, além de delimitar os objetos, representar suas texturas, mas ainda não incorpora dégradés ou matizados, gerados pela gradação de tons de cinza (embora o peso das texturas aplicadas assumam efetivamente tal papel). Pelo seu caráter, é também uma técnica bastante utilizada na gravura.

O principal elemento deste tipo de desenho é o traçado, trama ou textura, padrões gráficos que são usados para representar uma determinada textura, cuja manipulação e gradação de peso permite sombrear os objetos. A aplicação de valores tonais, organizados a partir de uma fonte de luz que indica zonas de luz e sombra, acentua a percepção de volume e tridimensionalidade dos objetos em uma composição, características que reforçam a ilusão de profundidade em um desenho. Os materiais mais comuns para o uso dessa técnica são os nanquins (bico-de-pena) e lápis de grafite mais rígido, em espessuras variadas.

Tom puro

Este tipo de desenho faz uso extenso das técnicas conhecidas como sfumato e chiaroscuro, de modo a construir formas, figuras e espaços através de relações de contraste entre luz e sombra e meios-tons, sendo assim uma representação composta por manchas e texturas suaves onde a linha praticamente desaparece entre vários degradês. Os materiais mais usados aqui são o grafite, o carvão e os pastéis. Instrumentos como o esfuminho auxiliam o espalhamento do grafite e a gradação de meios-tons e sombras. Materiais como nanquins e bicos de pena são inadequados para evidenciar os volumes, as sombras e as formas dos objetos, sendo mais apropriado o uso de aguadas em nanquim aplicadas em pincel, técnica que concilia tanto uma grande versatilidade expressiva como um refinado detalhamento tonal.

Material

Diversos materiais para traçado

A escolha dos meios e materiais está intimamente relacionada à técnica escolhida para o desenho. Um mesmo objeto desenhado a bico de pena e a grafite produz resultados absolutamente diferentes.

As ferramentas de desenho mais comuns são o lápis, o carvão, os pastéis, crayons e pena e tinta. Muitos materiais de desenho são à base de água ou óleo e são aplicados secos, sem nenhuma preparação. Existem meios de desenho à base d'água (o "lápis-aquarela", por exemplo), que podem ser desenhados como os lápis normais, e então umedecidos com um pincel molhado para produzir vários efeitos. Há também pastéis oleosos e lápis de cera. Muito raramente, artistas utilizam tinta invisível (geralmente já revelada).

Computação gráfica

Desde a década de 1990 o computador tem se tornado um instrumento importante na produção e acabamento de desenhos. Originalmente ele era usado principalmente para simular as técnicas e os materiais supracitados, mas nos últimos anos tem sido desenvolvidas linguagens próprias da ilustração em tela. Entre os programas mais utilizados estão o Corel Draw, Adobe Illustrator, entre outros. No campo do desenho técnico, existem diversos aplicativos CAD responsáveis por um considerável aumento de produtividade e velocidade na produção de desenhos. Existem também programas mais simples, como o Microsoft Paint, distribuído com o sistema operacional Microsoft Windows, e que possuem mais um apelo recreativo que efetivamente produtivo. Os softwares de modelamento 3D, como o 3D Studio Max, o Autodesk Maya e o Blender, ainda que não sejam tecnicamente aplicativos voltados à produção de desenhos, também possuem um papel importante nesta área (são bastante utilizados pela indústria cinematográfica e publicitária).

Os softwares de computação gráfica tem evoluído muito rapidamente. À medida que os equipamentos de hardware ficam mais eficientes, o nível de qualidade das imagens estão cada vez melhores. Hoje em dia quase não distinguimos o que é gráfico computacional e o que é real. O ramo do entretenimento é um dos que mais se beneficiam com esta evolução. Cada ano que passa vemos efeitos especiais nos filmes, jogos eletrônicos e filmes completamente digitais cada vez mais realísticos. É quase impossível prever até que ponto esta tecnologia poderá nos oferecer em criações e realidade.

Modalidades de desenho

O desenho não é necessariamente sempre um fim em si mesmo, podendo vir a assumir uma função ou caracterizar-se como mediação para outro fim. Entre as várias modalidades possíveis de desenho, incluem-se:

  • Desenho geométrico - estudo padronizado e normatizado do desenho em duas dimensões, voltado à representação plana de entes geométricos para a simples exibição ou resolução geométrica de problemas de Matemática;
  • Desenho projetivo - estudo padronizado e normatizado do desenho em duas dimensões acerca de entes de três dimensões. É composto de variações como o desenho técnico (representação de elementos tridimensionais em duas dimensões, voltado primordialmente para a exibição em si), Geometria descritiva (representação de elementos tridimensionais em duas dimensões, voltado principalmente para a determinação da verdadeira grandeza de ângulos, distâncias e áreas);
  • Desenho arquitetônico - desenho voltado especialmente ao projeto de arquitetura;
  • Ilustração - um tipo de desenho que pretende expressar alguma informação, normalmente acompanhado de outras mídias, como o texto;
  • Croquis ou esboço - um desenho rápido, normalmente feito à mão sem a ajuda de demais instrumentos que não propriamente os de traçado e o papel, feito com a intenção de discutir determinadas ideias gráficas ou de simplesmente registrá-las. Normalmente são os primeiros desenhos feitos dentro de um processo para se chegar a uma pintura ou ilustração mais detalhada. Os croquis são muito usados por estilistas de moda;
  • Modelo vivo - ilustração feita a partir de cópia do natural, tendo-se como tema o corpo ou a situação vivida por um modelo.

História

Desenhos egípcios, guardados no Museu do Louvre.

O desenho tem sido um meio de manifestação estético e uma linguagem expressiva para o homem desde os tempos pré-históricos. Neste período, porém, o desenho, assim como a arte de uma forma geral, estava inserido em um contexto tribal-religioso em que acreditava-se que o resultado do processo de desenhar possuísse uma "alma" própria: o desenho era mais um ritual místico que um meio de expressão. À medida que os conceitos artísticos foram, lentamente, durante a Antiguidade separando-se da religião, o desenho passou a ganhar autonomia e a se tornar uma disciplina própria. Não haveria, porém, até o Renascimento, uma preocupação em empreender um estudo sistemático e rigoroso do desenho enquanto forma de conhecimento.

A partir do Século XV, paralelamente à popularização do papel, o desenho começou a tornar-se o elemento fundamental da criação artística, um instrumento básico para se chegar à obra final (sendo seu domínio quase uma virtude secundária frente às outras formas de arte). Com a descoberta e sistematização da perspectiva, o desenho virá a ser, de fato, uma forma de conhecimento e será tratado como tal por diversos artistas, entre os quais destaca-se Leonardo da Vinci.

Mestres do desenho nos séculos XV e XVI incluem Leonardo da Vinci, Albrecht Dürer, Michelângelo e Rafael. No século XVII, destacam-se Claude Monet, Nicolas Poussin, Rembrandt e Peter Paul Rubens. No século XVIII, Jean-Honoré Fragonard, Francisco Goya, Giovanni Battista Tiepolo, e Antoine Watteau. No XIX, Jacques Louis David, Edgar Degas, Theodore Gericault, Odilon Redon, Henri de Toulouse-Lautrec, Paul Cézanne e Vincent Van Gogh. Finalmente, no século XX, pode-se destacar Max Beckmann, Willem de Kooning, Jean Dubuffet, Arshile Gorky, Paul Klee, Oskar Kokoschka, Henri Matisse, Jules Pascin, Pablo Picasso.

Desenhistas historicamente importantes

  • Leonardo da Vinci - Mestre renascentista, usava o desenho como instrumento para compreender a realidade.
  • Albrecht Dürer - Mestre do desenho e gravura renascentista. Seu desenho teve especial importância no desenvolvimento da ilustração através da gravura.
  • Filippo Brunelleschi - Arquiteto renascentista, atribui-se a ele as regras para o desenho em perspectiva com um ponto de fuga.
  • Rembrandt - Mestre do desenho e gravura barroca, conhecido por seus estudo de claro-escuro.
  • Michelângelo Buonarroti - Mestre renascentista cujo desenho expressivo não segue necessariamente a harmonia do Renascimento.
  • Ingres - O grande mestre do desenho na França do século XIX.
  • M. C. Escher - Mestre do desenho e da gravura cujo trabalho é baseado em questões de percepção visual e do desenho na geometria.

Referências

  1. [1]
  2. HOLANDA, Francisco de, "Diálogos em Roma", Lisboa: Livros Horizonte, 1984, p.61

Referências bibliográficas

  • ARNHEIM, Rudolf, Arte e Percepção Visual, São Paulo, EDUSP, 1997.
  • CHAVES, Dario, JUBRAN, Alexandre, Manual prático de desenho, São Paulo, Editora Tipo, 2002. ISBN 8588516160
  • DONDIS, Donis A., Sintaxe da linguagem visual, São Paulo, Martins Fontes, 1997. ISBN 8533605838
  • EDWARDS, Betty; Desenhando com o lado direito do cérebro, São Paulo, Ediouro, 2001. ISBN 8500007486
  • FRUTIGER, Adrian, Sinais e Símbolos: Desenho, projeto e significado, São Paulo, Martins Fontes, 1999. ISBN 8533610998
  • HOLANDA, Francisco de, Diálogos em Roma, Lisboa, Horizonte, 1984.
  • HOLANDA, Francisco de, Da Pintura Antiga, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1983.
  • KANDINSKY, Wassily, Ponto e linha sobre o plano, São Paulo, Martins Fontes, 2001. ISBN 8533605781
  • PAIXAO, Pedro A.H., Desenho: A Transparência dos Signos. Estudos de Teoria do Desenho e Práticas Disciplinares Sem Nome, Lisboa, Assírio & Alvim, 2008. ISBN 978-972-37-1297-1
  • SILVA, Vitor Oliveira da, Ética e Política do Desenho: Teoria e Prática do Desenho na Arte do Século XVII, Lisboa, Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, 2004. ISBN 972-9483-62-0
  • WONG, Wucius, Princípios de Forma e Desenho, São Paulo, Editora Martins Fontes. ISBN 8533608616

Ver também

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