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Utilitarismo

O utilitarismo é uma família de teorias consequencialistas, defendida principalmente por Jeremy Bentham e John Stuart Mill, que afirma que as ações são boas quando tendem a promover a felicidade e más quando tendem a promover o oposto da felicidade.[1]

Filosoficamente, pode-se resumir a doutrina utilitarista pela frase: Agir sempre de forma a produzir a maior quantidade de bem-estar (Princípio do bem-estar máximo)[2].

Trata-se então de uma moral eudemonista, mas que, ao contrário do egoísmo, insiste no fato de que devemos considerar o bem-estar de todos e não o de uma única pessoa.

Antes de quaisquer outros, foram Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873) que sistematizaram o princípio da utilidade e conseguiram aplicá-lo a questões concretas – sistema político, legislação, justiça, política econômica, liberdade sexual, emancipação feminina, etc.

Em Economia, o utilitarismo pode ser entendido como um princípio ético no qual o que determina se uma decisão ou ação é correta, é o benefício intrínseco exercido à coletividade, ou seja quanto maior o benefício, tanto melhor a decisão ou ação será.

Princípio da Utilidade

John Stuart Mill foi um dos filósofos que se debruçaram sobre o princípio da utilidade

Bentham expõe o conceito central da utilidade no primeiro capítulo do livro Introduction to the Principles of Morals and Legislation (“Introdução aos princípios da moral e legislação”), da seguinte forma:

“Por princípio da utilidade, entendemos o princípio segundo o qual toda a ação, qualquer que seja, deve ser aprovada ou rejeitada em função da sua tendência de aumentar ou reduzir o bem-estar das partes afetadas pela ação. (...) Designamos por utilidade a tendência de alguma coisa em alcançar o bem-estar, o bem, a beleza, a felicidade, as vantagens, etc. O conceito de utilidade não deve ser reduzido ao sentido corrente de modo de vida com um fim imediato."

Perspectiva moral e política

Características gerais

O utilitarismo, concebido como um "critério geral de moralidade", pode e deve ser aplicado tanto às ações individuais quanto às decisões políticas, tanto no domínio económico quanto nos domínios sociais ou judiciários.

O utilitarismo é um tipo de ética normativa com origem nas obras dos filósofos e economistas ingleses dos séculos XVIII e XIX. Jeremy Bentham e John Stuart Mill, segundo a qual uma ação é moralmente correta se tende a promover a felicidade e condenável se tende a produzir a infelicidade, considerada não apenas a felicidade do agente da ação mas também a de todos afetados por ela.

O utilitarismo rejeita o egoísmo, opondo-se a que o indivíduo deva perseguir os seus próprios interesses, mesmo às custas dos outros, e se opõe também a qualquer teoria ética que considere ações ou tipos de atos como certos ou errados independentemente das consequências que eles possam ter.

O utilitarismo assim difere radicalmente das teorias éticas que fazem o caráter de bom ou mal de uma ação depender do motivo do agente porque, de acordo com o utilitarismo, é possível que uma coisa boa venha a resultar de uma má motivação no indivíduo.

Antes, porém, desses dois autores darem forma ao utilitarismo, o pensamento utilitarista já existia, inclusive na filosofia antiga, principalmente no de Epicuro e seus seguidores na Grécia antiga. E na Inglaterra, alguns historiadores indicam o bispo Richard Cumberland, um filósofo moralista do século XVII, como o primeiro a apresentar uma filosofia utilitarista. Uma geração depois, Francis Hutcheson, com a sua teoria do "sentido interior da moralidade" (moral sense) manteve uma posição utilitarista mais clara. Ele cunhou a frase utilitarista de que "a melhor ação é a que procura a maior felicidade para o maior número de indivíduos". Também propôs uma forma de "aritmética moral" para cálculo da melhor consequência possível. David Hume tentou analisar a origem das virtudes em termos da sua contribuição útil.

O próprio Bentham disse ter descoberto o "princípio de utilidade" nos escritos de vários pensadores do século XVIII como Joseph Priestley, um clérigo dissidente famoso por ter descoberto o oxigénio, e Claude-Adrien Helvétius, autor de uma filosofia de meras sensações, de Cesare Beccaria, jurista italiano, e de David Hume. Helvétius foi posterior a Hume e deve ter conhecido o seu pensamento, e Beccária o de Helvétius.

Outro apoio ao utilitarismo é o de natureza teológica, devido a John Gay, um filósofo estudioso da Bíblia que argumentava que a vontade de Deus era o único critério de virtude, mas que, devido à bondade divina, ele concluía que Deus desejava que o homem promovesse a felicidade humana.

Bentham, que aparentemente acreditava que o indivíduo, no governo de seus atos iria sempre procurar maximizar o seu próprio prazer e minimizar o seu sofrimento, colocou no prazer e na dor a causa das ações humanas e as bases de um critério normativo da ação.

À arte de alguém governar as suas próprias ações, Bentham chamou "ética particular". Neste caso a felicidade do agente é o fator determinante; a felicidade dos outros governa somente até ao ponto em que o agente é motivado por simpatia, benevolência, ou interesse na boa vontade e opinião favorável dos outros.

Princípios fundamentais

Cinco princípios fundamentais são comuns a todas as versões do utilitarismo:

  • Princípio do bem-estar (the greatest happiness principle em inglês) – O “bem” é definido como sendo o bem-estar. Diz-se que o objetivo pesquisado em toda ação moral se constitui pelo bem-estar (físico, moral, intelectual).
  • Consequencialismo – As consequências de uma ação são a única base permanente para julgar a moralidade desta ação. O utilitarismo não se interessa desta forma pelos agentes morais, mas pelas ações – as qualidades morais do agente não interferem no “cálculo” da moralidade de uma ação, sendo então indiferente se o agente é generoso, interessado ou sádico, pois são as consequências do ato que são morais. Há uma dissociação entre a causa (o agente) e as consequências do ato. Assim, para o utilitarismo, dentro de circunstâncias diferentes um mesmo ato pode ser moral ou imoral, dependendo se suas consequências são boas ou más.
  • Princípio da agregação – O que é levado em conta no cálculo é o saldo líquido (de bem-estar, numa ocorrência) de todos os indivíduos afetados pela ação, independentemente da distribuição deste saldo. O que conta é a quantidade global de bem-estar produzida, qualquer que seja a repartição desta quantidade. Sendo assim, é considerado válido "sacrificar uma minoria", cujo bem-estar será diminuído, a fim de aumentar o bem-estar geral. Esta possibilidade de sacrifício se baseia na ideia de compensação: a desgraça de uns é compensada pelo bem-estar dos outros. Se o saldo de compensação for positivo, a ação é julgada moralmente boa. O aspecto dito sacrificial é um dos mais criticados pelos adversários do utilitarismo.
  • Princípio de otimização - O utilitarismo exige a maximização do bem-estar geral, o que não se apresenta como algo facultativo, mas sim como um dever.
  • Imparcialidade e universalismo - Os prazeres e sofrimentos são considerados da mesma importância, quaisquer que sejam os indivíduos afetados. O bem-estar de cada um tem o mesmo peso dentro do cálculo do bem-estar geral. Este princípio é compatível com a possibilidade de sacrifício. A princípio, todos têm o mesmo peso, e não se privilegia ou se prejudica ninguém – a felicidade de um rei ou de um cidadão comum são levadas em conta da mesma maneira. O aspecto universalista consiste numa atribuição de valores do bem-estar que é independente das culturas ou das particularidades regionais. Como o universalismo de Immanuel Kant, o utilitarismo pretende definir uma moral que valha universalmente.

O cálculo utilitarista

Um dos traços importantes do utilitarismo é seu racionalismo. A moralidade de um ato é calculada, ela não é determinada a partir de princípios diante de um valor intrínseco. Este cálculo leva em conta as consequências do ato sobre o bem-estar do maior número de pessoas. Ele supõe, então, a possibilidade de se calcular as consequências de um ato e avaliar seu impacto sobre o bem-estar dos indivíduos.

Para alguns utilitaristas, como o filósofo Peter Singer, o cálculo utilitarista de prazer e dor deve incluir todos os "seres dotados de sensibilidade", sendo legítimo assim incluir os animais no cálculo da moralidade de um ato. Singer se refere ao cálculo utilitarista como exclusivo do ser humano, como uma forma de "especismo", ou seja, preconceito de espécie.

Influência do utilitarismo no direito penal

O pan-óptico. Desenho do arquiteto inglês Willey Reveley, 1791

O conceito de pena nos século XVIII e século XIX estava muito relacionado ao caráter retributivo, ou seja, se alguém cometesse certa infração penal, o agente deveria receber determinada sanção jurídica, encerrando a punição no próprio delituoso.

Pelo cálculo utilitarista, essa concepção retributiva do Direito só traria consequências ao criminoso em si. Com base no princípio máximo do utilitarismo - segundo o qual uma ação deve trazer felicidade ao maior número de pessoas - Bentham desenvolve o caráter preventivo da lei. Assim, a punição de um crime não termina no delituoso, mas em toda a sociedade, uma vez que a pena deve coibir futuras ações ilícitas. Destaca-se, ainda, a famosa ideia do pan-óptico, que consiste numa arquitetura penitenciária, que buscava disciplinar o detento.

Críticas

Segundo Judith Butler, o utilitarismo criou uma razão instrumental que nega a vida daqueles que se interpõem nas necessidades desta filosofia.[3]

Lei da selva

Os ideólogos do utilitarismo são acusados de promover sem justificativa uma sociedade superior ou de apoiar a "lei da selva" na economia. Para seus críticos, a ciência econômica utilitarista reduz o indivíduo a um objeto racional autossuficiente (quando na verdade os indivíduos são interdependentes com os demais) e se esquece das ligações sentimentais dos indivíduos entre si. Em sua defesa, os utilitaristas, entretanto, podem indagar se tais críticas não seriam fruto de um profundo desconhecimento da filosofia utilitarista, indevidamente associada a uma apologia do capitalismo selvagem.

Incalculabilidade das consequências

Os que se opõem ao pensamento utilitarista veem diversos problemas no cálculo utilitarista que mede a moralidade por suas consequências, a saber:

  • Incerteza – Para os críticos, as consequências exatas de um ato não são determináveis até que ele aconteça de fato. Dentro desta visão, jamais teremos a certeza de que as supostas consequências de um ato serão suas consequências reais. Assim, um ato aparentemente inocente poderá então se mostrar imoral à vista de suas consequências reais, assim como um ato supostamente malvado poderá se revelar moral.
  • Infinitude – As consequências formam uma cadeia, como num efeito dominó – se o ato A causa B, e se B causa C, então o ato A causa C indiretamente. Desta forma, avaliar as consequências de um ato gera o problema da identificação das suas consequências: quando podemos dizer que um ato não é mais causa? Onde terminará a cadeia de consequências?

Pensadores utilitaristas

Condillac

Condillac apresenta uma Teoria do Valor fundada na utilidade, contrariamente aos economistas clássicos que o fundavam no trabalho.

Condillac sugere que o valor das coisas advém da utilidade, o que torna um bem escasso é a dificuldade em o produzir.

Portanto como o nome indica, a grande contribuição da crítica Utilitarista foi exatamente o fundar o valor na sua utilidade.

Contudo um grande problema se levanta: como medir esta utilidade?

Jeremy Bentham

Bentham sugeriu uma forma de quantificar a utilidade em 7 critérios: Intensidade, Duração, Certeza, Proximidade, Fecundidade, Pureza, Extensão.

Jean-Baptiste Say

Jean-Baptiste Say recusa-se a acreditar que a produção deva analisar-se como o processo pelo qual o homem prepara o objeto para o consumo. Segundo Say a produção realiza-se através do concurso de três elementos, a saber:

  • Trabalho
  • Capital
  • Agentes Naturais (por "agentes naturais" entenda-se a terra, etc).

Tal como Adam Smith, considera o mercado essencial. Esta faceta é facilmente verificada quando Say afirma que os salários, os lucros e as rendas são preços determinados pelo jogo da oferta e da procura no mercado de fatores.

Say acredita, diferentemente de Smith, que não há distinção entre trabalho produtivo e trabalho não produtivo. Adam Smith defendia que o trabalho produtivo era aquele que era executado com vistas à fabricação de um objeto material, Say defende que "todos aqueles que fornecem uma verdadeira utilidade em troca dos seus salários são produtivos".

David Hume

O utilitarismo em si possui o caráter teleológico herdado da filosofia Aristotélica que consistia à felicidade o efeito da vida do homem. David Hume em inspeção aos juízos que dispomos em nossos modos e dos demais conclui[4] que a grandeza do indivíduo está inserido em atributos considerados úteis para ambos; a si próprio e aos que convivem com ele. A concepção de utilitarismo em Hume provém talvez de uma noção deste a partir de uma ótica aplicada àquilo que é público, daquilo que é útil em um contexto abrangente e que estão em harmonia o que é útil e o que é ético.

O filósofo visualiza[5] o útil como algo que impulsiona a um determinado fim, mas também como algo que pode produzir júbilo. Esta perspectiva de Hume está associada a um sistema universal de moralidade, em razão de o indivíduo gozar do estar em meio social e de notá-lo como algo bom aos homens. Um problema a respeito do utilitarismo em Hume é que em algumas vezes pensa o útil como algo que leva à felicidade e em outras o caráter de finalidade, como já citado a cima, teleológico. Essa ambivalência logo propõe dois eixos em que o filósofo irá trabalhar o conceito do útil, logo, Hume faz uma associação entre prazer, dor, e felicidade,[6] mas nota à felicidade uma não necessidade de ser obrigatoriamente o alivio do sofrimento e a obtenção do prazer.

Em suma, Hume também acredita³ que o anseio pelo júbilo, que aqui é retratada como felicidade, é que nos faz agir, e esta ação provém de fatores da tendência humana. As atitudes corretas para o caráter moral são as que os homens têm tendência a concretizar, logo, a razão possui apenas valor prático, isolada ela não define o que é correto ou não é. A partir daí Hume através de sua perspectiva de contribuição útil do indivíduo, permanece inserindo também a noção de Jeremy Bentham, um dos precursores do utilitarismo, em que defendia que o homem buscaria em normalidade atingir seu estado de prazer sempre em uma escala maior com tendência a minimizar toda e qualquer forma de sofrimento. O segmento do utilitarismo em si acaba se desvencilhando da expressão em senso comum e aderindo uma ótica com foco ontológico social para o ser, o princípio de utilidade aqui ganha uma outra noção, a de algo que está não só pertencente à natureza do homem mas a algo necessário a esta. Pelo utilitarismo de Hume a ação bondosa do ser humano é considerada a mais bela e nitidamente compensatória ação do ser que provoca assentimento inerente ao ser. Vale ressaltar que para o filósofo a conduta moral está incorporada as paixões do indivíduo e seria exatamente nela que se encontra a origem de toda a conduta moral, exemplo que é tratado de forma minuciosa no livro II do “Tratado da natureza humana”.[7]

A moral utilitarista também não exclui a concepção de altruísmo já que as ações praticadas devem atingir o maior número de indivíduos com a máxima felicidade, este é o principal objetivo de toda a filosofia utilitarista. Podemos concluir que para Hume o utilitarismo é uma transliteração da busca pela felicidade, pois é isso que estimula o ser humano a agir, a razão por si se torna uma ferramenta que determinaria o certo e errado. A filosofia moral do autor retrata conceitos como a lógica e a ética, a lógica partindo do lado racional e a ética do fato do ser humano ser um indivíduo social. Notamos então que a percepção utilitarista de Hume contribui em amplo aspecto para o debate ético dentro da história da filosofia, já que de acordo com ele podemos utilizar de nossa própria experiência para dizer o que é bom e/ou ruim em autonomia individual.

Outros utilitaristas

Ver também

Bibliografia

  • Mill, J. S. Utilitarianism. Hackett Publishing Company, 2001. Capítulos 1 e 2.
  • BRAGA, Antonio Frederico Saturnino. Kant, Rawls e o utilitarismo: justiça e bem na filosofia política contemporânea. Rio de Janeiro: Contraponto: ANPOF, 2006. 327 p. ISBN 9788578660420 (broch.).

Referências

  1. Hilton Japiassú, Danilo Marcondes (1993). 'Dicionário básico de filosofia, Zahar. p. 273. ISBN 978-85-378-0341-7.
  2. «Utilitarismo». Brasil Escola (em português). Consultado em 23 de novembro de 2019 
  3. Judith Butler, “Frames of War: When Is Life Grievable?” (Brooklyn, New York: Verso, 2009), p. 3.
  4. http://acervodigital.ufpr.br/handle/1884/45416
  5. http://www.revistas.usp.br/discurso/article/view/84722
  6. http://www.consciencia.org/david-hume-e-o-entendimento-humano-em-relacao-a-moral
  7. http://www.filoinfo.net/node/49
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