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O Quilombo dos Palmares foi um quilombo da era colonial brasileira. Localizava-se na Serra da Barriga, na então Capitania de Pernambuco, região hoje pertencente ao município de União dos Palmares, no estado brasileiro de Alagoas.[1]
Conheceu o seu auge na segunda metade do século XVII, constituindo-se no mais emblemático dos quilombos formados no período colonial. Resistiu por mais de um século, o seu mito transformando-se em moderno símbolo da resistência do africano à escravatura. Os quilombos foram uma forma de rebelião contra a condição de escravo e chegaram a oferecer resistência contra o sistema escravista, que obrigava homens e mulheres trazidos da África a prestarem serviços forçados. Os escravos trabalhavam de maneira desumana e sem qualquer tipo de remuneração. Foi na região da Serra da Barriga, na então Capitania de Pernambuco, que Ganga Zumba e outros escravos fugidos formaram o Quilombo dos Palmares. Este foi atacado diversas vezes até ser derrotado, demonstrando assim sua grande organização política e militar.[1]
História
Antecedentes
As primeiras referências a um quilombo na região remontam a 1580, formado por escravos fugitivos de engenhos da Capitania de Pernambuco.[2][3]
O apogeu
À época das invasões holandesas do Brasil (1624-1625 e 1630-1654), com a perturbação causada nas rotinas dos engenhos de açúcar, registrou-se um crescimento da população em Palmares, que passou a formar diversos núcleos de povoamento (mocambos). Os principais foram:
- Cerca Real do Macaco - o maior centro político do quilombo, contando com cerca de 1 500 habitações;
- Subupira - centralizava as atividades militares, contando com cerca de 800 habitações;
- Zumbi - era o líder do povo. Tornou-se símbolo da luta dos afro-brasileiros contra a opressão e a discriminação;
- Dandara - esposa de Zumbi, liderava as falanges femininas do exército palmarino.
Embora não se possa precisar o número de habitantes nos Palmares, de vez que a população flutuava ao sabor das conjunturas, historiadores estimam que, em 1670, alcançou cerca de vinte mil pessoas. No principal mocambo, a Cerca Real do Macaco, calcula-se que viviam em torno de 6 mil pessoas, quase a população do Rio de Janeiro, estimada em aproximadamente 7 mil habitantes no ano de 1660 (incluindo indígenas e africanos).[4]
Essa população sobrevivia graças à caça, à pesca, à coleta de frutas (goiaba, caju, abacate e outras) e à agricultura (feijão, milho, mandioca, banana, laranja e cana-de-açúcar). Complementarmente, praticava o artesanato (cestas, tecidos, cerâmica, metalurgia). Os excedentes eram comercializados com as populações vizinhas, de tal forma que colonos chegavam a alugar terras para plantio e a trocar alimentos por munição com os quilombolas.[1]
Pouco se sabe, também, acerca da organização política do quilombo. Alguns supõem que se constituiu ali um verdadeiro Estado, nos moldes dos reinos africanos, sendo os diversos mocambos governados por oligarcas sob a chefia suprema de um líder.
Outros apontam para a possibilidade de uma descentralização do poder entre os diferentes grupos, pertencentes às diversas etnias que formavam os núcleos de quilombos, que delegavam esse poder a lideranças militares conforme o seu prestígio. As mais famosas lideranças foram Ganga Zumba e seu sobrinho, Zumbi. Apesar disso, alguns historiadores sugerem que existe a possibilidade de que alguma forma de trabalho compulsório tenha sido praticada dentro do quilombo.Predefinição:Nota de rodapé
As relações de trabalho forçado encontradas dentro dos Quilombos não podem ser enquadradas na mesma condição dos regimes escravocratas latino-americanos, porque se tratavam da sujeição de indivíduos aprisionados, inimigos de guerra, ao trabalho forçado. Estes indivíduos eram provenientes de etnias diferentes, considerando que a África seja um continente inteiro, repleto de reinados ideologicamente divergentes entre si. Zumbi não era, afirmam estudiosos do Museu Afro Brasil, um líder libertário com foco na libertação dos negros da mesma forma que se põem as questões raciais atuais, mas focava na proteção dos indivíduos de sua etnia, cultura e regionalidade. O Museu AfroBrasil indica que: “Estado” dentro do quilombo era baseado em um tipo de “Estado africano” — o chefe (chamado de rei por força de expressão) era eleito, contestado e até podia chegar ser afastado por uma assembleia geral dos quilombolas. Mas isso não significa que Palmares era uma democracia: o local ainda tinha muitas das características sociais do século".[5]
A repressão
Com a expulsão dos holandeses do Nordeste do Brasil, acentuou-se a carência de mão-de-obra para a retomada de produção dos engenhos de açúcar da região. Dado o elevado preço dos escravos africanos, os ataques a Palmares aumentaram, visando a recaptura de seus integrantes.
A prosperidade de Palmares, por outro lado, atraía atenção e receio, e o governo colonial sentiu-se obrigado a tomar providências para afirmar o seu poder sobre a região. Em carta à Coroa Portuguesa, um governador-geral reportou que os quilombos eram mais difíceis de vencer do que os neerlandeses.
Foram necessárias, entretanto, cerca de dezoito expedições, organizadas desde o período de dominação holandesa, para erradicar definitivamente o Quilombo dos Palmares.[1]
No último quartel do século XVII, Fernão Carrilho ofereceu a Ganga Zumba, um líder que implementou táticas de guerrilha na defesa do território, um tratado de paz (1677). Por seus termos, era oferecida a liberdade aos nascidos no quilombo, assim como terras inférteis na região de Cocaú. Grande parte dos quilombolas rejeitou os termos desse acordo, nitidamente desfavoráveis e, na disputa então surgida, Ganga Zumba foi envenenado, subindo ao poder o seu irmão, Ganga Zona, aliado dos portugueses. O acordo foi, desse modo, rompido, tendo os dissidentes se restabelecido em Palmares, sob a liderança de Zumbi.
No primeiro momento, Zumbi substituiu a estratégia de defesa passiva por um tipo de estratégia de guerrilha, com a prática de ataques de surpresa a engenhos, libertando escravos e apoderando-se de armas, munições e suprimentos, empregando-os em novos ataques.
A ação de Domingos Jorge Velho
Após várias investidas relativamente infrutíferas contra Palmares, o governador e capitão-general da Capitania de Pernambuco, Caetano de Melo e Castro, contratou o bandeirante Domingos Jorge Velho e o capitão-mor Bernardo Vieira de Melo para erradicar de vez a ameaça dos escravos fugitivos na região.
O quilombo passou a ser atacado pelas forças do bandeirante e, mesmo experientes na guerra de extermínio, tiveram grandes dificuldades em vencer as táticas dos quilombolas, mais elaboradas que a dos indígenas com quem haviam tido contato. Ademais, tiveram problemas para contornar a inimizade surgida com os colonos da região, vítimas de saques dos bandeirantes em diversas ocasiões.
Em janeiro de 1694, após um ataque frustrado, as forças do bandeirante iniciaram uma empreitada vitoriosa, com um contingente de seis mil homens, bem armados e municiados, inclusive com artilharia. Um quilombola, Antônio Soares, foi capturado e, mediante a promessa de Domingos Jorge Velho de que seria libertado em troca da revelação do esconderijo do líder, Zumbi foi encurralado e morto em uma emboscada, a 20 de novembro de 1695.
A cabeça de Zumbi foi cortada e conduzida para Recife, onde foi exposta em praça pública no Pátio do Carmo, no alto de um mastro, para servir de exemplo a outros escravos.[6]
Sem a liderança militar de Zumbi, por volta do ano de 1710, o quilombo se desfez por completo.[1]
Escravidão em Palmares
Apesar ser vista por alguns movimentos e setores da sociedade como representantes da resistência à escravidão, muitos quilombos contavam com a escravidão internamente. Esta prática levou vários teóricos a interpretarem a prática dos quilombos como um conservadorismo africano, que mantinha as diversas classes sociais existentes na África, incluindo reis, generais e escravos.[7]
Para alguns autores, no entanto, a escravidão nos quilombos em nada se assemelharia à escravidão dos brancos sobre os negros, sendo os escravos considerados como membros das casas dos senhores, aos quais deviam obediência e respeito,[8] semelhante à servidão entre brancos, comum na Europa na Alta Idade Média.[carece de fontes] Para estes autores, a prática da escravidão teria dupla finalidade:[8] aculturar os escravos recém-libertos às práticas do quilombos, que consistiam em trabalho árduo para a subsistência da comunidade, já que muitos dos escravos libertos achavam que não teriam mais que trabalhar, e diferenciar os ex-escravos que chegavam aos quilombos pelos próprios meios (escravos fugidos, que se arriscavam até encontrar um quilombo. Sendo, neste trajeto, perseguidos por animais selvagens e pelos antigos senhores, e ainda, correndo o risco de serem capturados por outros escravistas), daqueles trazidos por incursões de resgates (escravos libertados por quilombolas que iam às fazendas e vilas para libertar escravos).
Por outro lado, outros autores apontam a existência de uma escravidão até mesmo predatória por parte dos habitantes do quilombo dos Palmares, que realizavam incursões nos territórios vizinhos, de onde traziam à força indivíduos para trabalharem como escravos em suas plantações, desenvolvendo assim uma espécie de "escravismo dentro da própria 'república'".[9][10] Escravos que se recusavam a fugir das fazendas e ir para os quilombos também eram capturados e convertidos em cativos dos quilombolas.[11]
Filmografia
- Ganga Zumba, de Cacá Diegues, 1963
- Quilombo, de Cacá Diegues, 1983
Ver também
Referências
- ↑ 1,0 1,1 1,2 1,3 1,4 Nicolette, Carlos Eduardo. «Material Didático: O Quilombo dos Palmares» (em português)
- ↑ «Estado é exaltado em festa nacional». Ministério da Cultura. Consultado em 6 de dezembro de 2018. Arquivado do original em 17 de novembro de 2018
- ↑ «Quilombo dos Palmares: Verdades e mitos sobre o quilombo e Zumbi». UOL. Consultado em 6 de dezembro de 2018
- ↑ (1) SCHWARCZ; (2) STARLING, (1) Lilia, (2) Heloisa (2015). Brasil: uma biografia. São Paulo: Companhia das Letras. 101 páginas
- ↑ Revista Galileu (22 de novembro de 2019). «Afinal, Zumbi dos Palmares tinha escravos?». Revista Galileu. Consultado em 27 de outubro de 2020
- ↑ 6,0 6,1 «Afro-descendente recebe medalha». UOL.com.br. Consultado em 7 de março de 2015
- ↑ Libby, Douglas Cole e Furtado, Júnia Ferreira. Trabalho livre, trabalho escravo: Brasil e Europa, séculos XVIII e XIX. págs. 321-322. Annablume, 2006 - ISBN 8574196274, 9788574196275
- ↑ 8,0 8,1 Landmann, Jorge. Tróia Negra. Mandarim, 1998 - ISBN 8535400931, 9788535400939
- ↑ Risério, Antonio. A Utopia Brasileira e os Movimentos Negros. [S.l.]: Editora 34 data = 2007. p. 406. ISBN 8573263857, 9788573263855
- ↑ Berger, Marc (2007). O Quilombo - Forma de Resistência Histórica dos Escravos. [S.l.]: GRIN Verlag. p. 11. ISBN 3638943577, 9783638943574
- ↑ Martins, José de Souza, professor titular de Sociologia da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo, O Estado de S. Paulo, 19 de novembro de 2006. Citado em Mendonça, Armando. 'Vi Li Ouvi VI, p. 71. Thesaurus Editora, 2008. ISBN 8570627610, 9788570627612.
Bibliografia
- CARNEIRO, Edson. O quilombo dos Palmares. São Paulo: Nacional, 1958.
- FREITAS, Décio. Palmares. A guerra dos escravos. Porto Alegre: Movimento, 1973.
- MATTOSO, Kátia de Queirós. Ser escravo no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1982.
- MOURA, Clóvis. Os quilombos e a rebelião negra. São Paulo: Brasiliense, 1981.
- MOURA, Clóvis. Rebeliões da senzala. s.l.: Zumbi, 1959.
- NICOLETTE, Carlos Eduardo. "O Quilombo dos Palmares: a história narrada". Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2015
- PERET, Benjamin. O quilombo dos Palmares, ensaios e comentários de M. Maestri e R. Ponge (org.), Porto Alegre: EdiUFRGS,2002.
- REIS, João José; GOMES, Flávio dos Santos (org.) Liberdade por um fio. História dos quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
- Risério, António. Escravos de escravos.Nossa Historia . Editora Vera Cruz