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Alexis de Tocqueville

Alexis de Tocqueville

Alexis-Charles-Henri Clérel,[1] visconde de Tocqueville, dito Alexis de Tocqueville (pronúncia em francês: [alɛkˈsi dətɔkˈvil]) (29 de julho de 180516 de abril de 1859) foi um pensador político, historiador e escritor francês. Tornou-se célebre por suas análises da Revolução Francesa, cuja pertinência foi destacada por François Furet, no contexto da democracia americana e da evolução das democracias ocidentais em geral. Raymond Aron pôs em evidência sua contribuição à sociologia.

Baseando-se na observação das interações sociais e na análise de suas causas e efeitos, Tocqueville defendeu a liberdade individual e a igualdade na política, sendo os dois conceitos, para ele, inseparáveis. Ele defendeu a democracia e identificou os riscos inerentes que dela derivam. Tocqueville enfatizou, em particular, a possível evolução da democracia em direção a uma ditadura da maioria em nome da igualdade e rejeitou claramente qualquer orientação socialista a esse respeito. Ele também insistiu no papel fundamental dos organismos intermediários e na descentralização de poderes, posicionando-se em oposição ao jacobismo centralizador. Por fim, ele identificou o fato de que a democracia pode promover, através da perda de laços sociais, comportamentos individualistas contrários aos interesses da sociedade como um todo. Tocqueville é uma das maiores referências da filosofia política liberal.[2]

Biografia

Gravura de Tocqueville presente em Da Democracia na América, edição de 1899.

Alexis de Tocqueville pertenceu a uma grande família aristocrática normanda. Era bisneto de Chrétien Guillaume de Malesherbes e tinha ligações familiares com o visconde de Chateaubriand. Um de seus antepassados, Guillaume Clarel, foi um companheiro de Guilherme, o Conquistador.[3] Seus pais, Hervé Louis François Jean Bonaventure Clérel, conde de Tocqueville, soldado da guarda constitucional do rei Luís XVI, e Louise Madeleine Le Peletier de Rosanbo, escaparam da guilhotina graças à queda de Robespierre no Ano II (1794). Destino diferente teve seu avô, o Marquês de Rosanbo, que foi executado.[4]

Em 20 de outubro [de 1794], fomos todos postos em liberdade: havia dez meses, dia após dia, que estávamos presos. [.] Como o céu nos parecia sereno! como o ar nos parecia puro! como o horizonte era vasto! Mas também como era doloroso o pensamento que se instalava em meio à nossa felicidade e vinha obscurecê-la! Éramos nove quando entramos naquela casa da dor e saímos apenas quatro. Nossos pais, nossos amigos, haviam desaparecido e os cacos de duas famílias só tinham por chefe um jovem homem de vinte e dois anos que conhecia pouco o mundo e tinha apenas a experiência da infelicidade.[5]

Após exílio na Inglaterra, Hervé e Louise retornaram à França durante o Primeiro Império (1804-1815), quando Hervé se tornou pair de France[6] e préfet sob a Restauração.

Embora consagrado pela posteridade como homem de letras, sociólogo da democracia moderna e historiador do Antigo Regime, Alexis de Tocqueville sempre ambicionou ser um homem da política.[7] Após estudar direito em Paris, em 1827 ingressou na magistratura em busca de uma carreira provisória enquanto não se cumpria a exigência de idade mínima de quarenta anos para a candidatura à câmara dos deputados. A Constituição de 1830 reduziu essa exigência para trinta anos, o que permitiu que Tocqueville lançasse, em 1836, sua primeira candidatura, na qual foi derrotado. Em 1839, conseguiria a primeira de uma série de vitórias que o manteriam na câmara até o golpe de estado de 1851. Entre junho e outubro de 1849, assumiu a pasta dos negócios exteriores do ministério Odilon Barrot sob o governo de Luís Bonaparte na Segunda República.[8]

Em 1850, foi obrigado a licenciar-se da assembleia em função de uma crise de tuberculose pulmonar que o levaria lentamente até a morte nove anos mais tarde.[8] Participou intensamente da revisão da constituição republicana, mas, com o golpe de 2 de dezembro, após denunciar a farsa bonapartista na imprensa inglesa, afastou-se da cena política e recolheu-se aos estudos.[8]

Individualismo

Predefinição:Liberalismo Igualdade de condições, segundo Tocqueville, é um dos valores que caracterizam e definem a democracia, dando à “vontade política uma certa  direção, uma determinada feição às leis, aos governantes as máximas informações, e hábitos peculiares aos governados”. No entanto, com o pensamento de que muitos outros poderiam anunciar estes bens que a igualdade proporciona aos homens, ele se dirige justamente aos perigos advindos dela, entre eles, o individualismo, pois, à medida que a igualdade se fortalece, o individualismo se manifesta e de forma lenta e gradativa vai pondo em risco a democracia.

Segundo Tocqueville, o individualismo difere do egoísmo. Este nasce de um instinto cego, sendo um sentimento tão antigo quanto o mundo, todas as sociedades o tiveram. Já o individualismo, é uma ideia recente que surge com a democracia,  procede muito mais de um juízo errôneo do que de um sentimento depravado, como o egoísmo, e se manifesta, à medida que a igualdade se fortalece, isolando cada cidadão da massa de seus semelhantes fazendo com que se isole com sua família e amigos, abandonando a grande sociedade a si mesma. Assim, enquanto o egoísmo resseca o germe de todas as virtudes, o individualismo esgota a fonte das virtudes públicas.

Segundo Tocqueville, nas eras democráticas o vínculo das afeições humanas se estende e se relaxa fazendo com que os cidadãos se fechem em si próprios e deixem de olhar para o mundo que os rodeia, pois rapidamente se esquecem da tradição que o precedeu, apagando-se os vestígios das gerações muito rapidamente. Como cada classe se aproxima das outras e se mistura com elas, seus membros se tornam indiferentes e como que estranhos uns aos outros, pois, na democracia eles “não devem nada a ninguém, não esperam, por assim dizer, nada de ninguém; acostumam-se a se considerar sempre isoladamente, imaginam de bom grado que seu destino inteiro está em suas mãos. Assim, não apenas a democracia faz cada homem esquecer de seus ancestrais, mas lhe oculta seus descendentes e o separa de seus contemporâneos; ela o volta sem cessar para si mesmo e ameaça encerrá-lo, enfim, por inteiro, na solidão de seu próprio coração”.[9]

Como a democracia não é um sistema perfeito, há sempre o risco de descambar para o autoritarismo. Esse isolamento se revela um grande risco, pois ao constituir sobre si uma pequena sociedade e voluntariamente perder seu interesse pela grande sociedade, ou seja, à medida que vão abandonando seus interesses políticos, os cidadãos acabam possibilitando, assim, o estabelecimento de um Estado que aos poucos tomará para si todas as atividades e irá também intervir nas liberdades fundamentais.

Segundo Tocqueville, somente a atividade política do cidadão, por meio de organização de associações políticas, ou partidos, que tenham como fim a defesa da cidadania, a manutenção do espaço da palavra e da ação pode dificultar o surgimento de um Estado autoritário, pois, as possibilidades criadas em uma sociedade democrática são sempre duplas, por isso é nelas mesmas onde devemos encontrar os “remédios” para os seus vícios. Por exemplo, em uma sociedade democrática os cidadãos têm a tendência de se filiar a ideias de fácil adesão, o que inclui ideias despóticas, mas com essa mesma facilidade que se poderia aderir a propostas despóticas, pode-se enraizar ideais democráticos que imunizam a democracia contra os totalitarismos.

Em verdade, para Tocqueville, a igualdade não apenas é o bem superior, mas também o valor, quando realizado, que possibilitou a reivindicação efetiva da liberdade. E é essa liberdade, gerada pela condição de igualdade, que deve combater o individualismo. Através da liberdade de participação política e do poder de ingerência nos assuntos públicos, que afetam direta ou indiretamente seus assuntos privados, os cidadãos atomizados se voltam para os assuntos gerais, equilibrando assim, as tendências construtivas e destrutivas da democracia.

Obras

As suas obras incluem: Du système pénitentiaire aux États-Unis et de son application en France (1833), De la démocratie (1840) e L'ancien régime et la révolution (1856). Foi um defensor da liberdade e da democracia.

A sua obra mais célebre, baseada nas suas viagens nos Estados Unidos, foi traduzida para o português com o nome de "A democracia na América" e é frequentemente usada em cursos de história americana do século XIX e de teoria política moderna.

Em 1831, Tocqueville foi enviado pelo governo francês (ele solicitou apoio para sua viagem, mas ela foi paga por sua família) para estudar o sistema prisional americano. Chegou a Nova Iorque em maio daquele ano e passou nove meses em viagem pelos Estados Unidos, tomando notas não só acerca das prisões, mas sobre todos os aspectos da sociedade americana, incluindo a sua economia e o seu sistema político, então único no mundo.

Após o retorno à França, em fevereiro de 1832, submeteu o seu relatório penal e escreveu Da democracia na América. Esta obra foi impressa inúmeras vezes ainda no século XIX e acabou por tornar-se um clássico.

Tocqueville ficou conhecido também por ser a primeira pessoa a cunhar o termo social-democracia, ideologia política que se espalhou pela Europa.

O sociólogo francês do século XX Raymond Aron escreveu as seguintes linhas a propósito de Tocqueville, colocando-o numa posição não muito diferente da sua: "demasiado liberal para o partido de onde ele provém, não muito entusiasta por ideias novas aos olhos dos republicanos, ele não foi adoptado nem pela direita nem pela esquerda, ele permanece suspeito a todos.[10]    

Ver também

Referências

  1. «Tocqueville, Alexis de». Oxford Dictionaries. Oxforddictionaries.com 
  2. Alexis de Tocqueville (1841). «Travail sur l'Algérie» (PDF) (em fracês) 
  3. Benoît, Jean-Louis,. (2013). Tocqueville un destin paradoxal [2e édition revue et augmentée] ed. Paris: Perrin. OCLC 862951779 
  4. Marquês de Rosanbo
  5. «Página sobre Alexis de Toqueville mantida pelo Ministério da Cultura e da Comunicação francês» (em francês). Tocqueville.culture.fr 
  6. literalmente par da França. Era um posto da coroa, usado para distinguir os nobres mais importantes do reino. Tinham o privilégio de só poderem ser julgados pela Corte dos Pares e, em contrapartida, prestavam uma homenagem especial ao rei. Na época do Antigo Regime, perdeu seus privilégios, tornando-se um cargo honorífico.
  7. Marcelo JASMIN. Alexis de Tocqueville: a historiografia como ciência da política. 2ª ed. Belo Horizonte: Ed. UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2005. p. 33; Françoise Mélonio, Tocqueville et les Français, Paris, Aubier Montaigne, 1993, 408 p.
  8. 8,0 8,1 8,2 Marcelo JASMIN. Alexis de Tocqueville: a historiografia como ciência da política. 2ª ed. Belo Horizonte: Ed. UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2005. p. 34; Arnaud Coutant, Tocqueville et la constitution démocratique, Paris, Mare et Martin, 2008, 680 p.
  9. TOCQUEVILLE, Alexis de (2014). A democracia na América: sentimentos e opiniões: de uma profusão de sentimentos e opiniões que o estado social democrático fez nascer entre os americanos. São Paulo: Martins Fontes. pp. pág. 121 
  10. ARON, R. Les étapes de la pensée sociologique". Paris: Gallimard, 1967. p. 18

Ligações externas

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