Chama-se pessoa surda (ou surdo)[1] àquela que é portadora de surdez e que possui uma identidade, uma cultura, uma história e uma língua próprios.
Em meados dos anos setenta emergiu uma nova forma de encarar a surdez, que encara o surdo como pertencendo a uma comunidade linguística minoritária, pelo facto de usar uma língua distinta da maioria ouvinte. Estudiosos há que acreditam que "o problema dos surdos não é a surdez … mas as representações dominantes". Assim, a concepção antropológica defende como um de seus objectivos primários garantir o acesso dos surdos à língua gestual, a sua língua de aquisição natural.[2]
O Dia Mundial do Surdo é comemorado por membros da comunidade surda de todo o mundo (surdos e ouvintes) no último domingo do mês de Setembro, com objectivo de relembrar as lutas da comunidade ao longo das eras, como por exemplo, a luta em prol do reconhecimento da língua gestual nos diversos países do globo.[3]
Identidade e cultura surda
É a interacção social que nos socializa. As escolhas sobre o ambiente linguístico em que a criança crescerá, a opção do uso ou não da língua gestual e a escolha de ajudas técnicas e tipo de educação adoptado vão determinar a maneira como o desenvolvimento social da criança se irá processar.[4]
Se for negada à criança a oportunidade de adquirir e desenvolver uma língua natural, crescerá com um enorme défice a nível linguístico, que comprometerá todo o seu desenvolvimento social, cultural, psicológico e afetivo, o que dificultará na construção identitária de qualquer criança inclusive uma criança surda. Pelo contrário, se a criança for exposta a uma língua gestual poderá adquirir um conhecimento cultural, sobre o mundo e as relações interpessoais, semelhante ao adquirido por uma criança ouvinte, afinal criança é criança ouvindo ou não, enxergando ou não, andando ou não.
A comunicação é vital na construção da identidade. O contacto precoce entre o adulto surdo e a criança surda, através de uma língua gestual, é o que proporcionará o acesso à linguagem. Desta forma, estará também assegurada a identidade e cultura surda, que serão transmitidas naturalmente à criança surda pelo adulto surdo em questão.[5] Quanto mais precoce o acesso à língua gestual, mais cedo a criança adquirirá uma identidade própria, consciente e sólida.
No entanto, de acordo com a história dos surdos, as representações sobre a surdez sempre foram fundamentadas por mitos com base na religião, na ideologia, nos interesses de foro económico e nas diferenças sociais.[6] Estas representações afectam o processo identitário do surdo, participando de processos de inclusão/ exclusão dos membros da sociedade e padronizando a "normalização social".
Segundo estudos, o surdo apenas se sente pessoa se a sociedade o considerar como tal.[7] O surdo, na sua diferença, representa um perigo.[8] Daí advém a tentativa de muitos de considerá-lo apenas uma pessoa com deficiência. No entanto, o surdo como pessoa existe - esta é uma diferença que existe, que estigmatiza o surdo - a sua negação estigmatiza-o ainda mais, já que não permite o seu desenvolvimento, a sua formação de identidade como ser inteiro e integrante de uma comunidade de indivíduos diferentes como ele mesmo.[9]
As Diferenças Identidade Surda
- Identidades Surdas - Identidade Política
- Identidades Surdas Híbridas
- Identidades Surdas Flutuantes
- Identidades Surdas Embaçadas
- Identidades Surdas de Transição
- Identidades Surdas de Diáspora
- Identidades Intermediárias
Carta dos Direitos da Pessoa Surda
Em Portugal, a 27 de Abril de 2001, aquando do III Congresso Nacional de Surdos, na cidade de Beja, foram aprovados os seguintes direitos da pessoa surda:[10]
- Primeiro artigo: língua gestual - este artigo esclarece que toda a pessoa surda tem o direito de usar livremente a língua gestual, não podendo ser dela privada, deve ter acesso à LGP, acesso esse apoiado pelo Estado.
- Segundo artigo: Vida associativa - mostra que todo o surdo tem o direito à participação na Vida Associativa, devendo ser o objectivo primário de toda a Associação de surdos a promoção da Vida da Comunidade Surda, a fim de que a cultura surda seja conservada e desenvolvida.
- Terceiro artigo: Vida Política e Cívica - os surdos tem direitos e obrigações, como todos os outros cidadãos de plena consciência, o que obriga a que sejam criadas as devidas condições para que a pessoa surda tenha acesso a uma informação e esclarecimentos plenos.
- Quarto artigo: Projectos e Decisões - Todo o surdo tem direito à participação na vida cultural, social, política e económica do país, tem ainda direito à protecção contra a discriminação (privada, social ou profissional). A comunidade surda deve ser ser consultada antes de assuntos privados ou públicos relativos à pessoa surda serem decididos
- Quinto artigo: Educação - todo o surdo tem direito à igualdade de oportunidades na educação, devendo essa prosseguir o desenvolvimento da personalidade surda, motivando o conhecimento da cultura, história e língua da Comunidade Surda. À Comunidade Surda deve ser reconhecido o direito de criar e de gerir os seus próprios estabelecimentos de ensino e formação.
- Sexto artigo: Crianças Surdas Filhas de Pais Ouvintes - estes surdos também têm o direito a participar na vida da Comunidade Surda.
- Sétimo artigo: Pais Surdos - os pais surdos devem ser respeitados ao exercerem o poder paternal.
- Oitavo artigo: Formação Profissional e Emprego - o surdo tem direito a escolher o seu emprego e formação profissional. Ninguém pode ser privado do seu emprego em razão da sua Surdez.
- Nono artigo: Serviços de Interpretação - todo o surdo tem direito ao serviço gratuito de intérpretes de língua gestual.
- Décimo artigo: Justiça - Toda a Pessoa Surda tem direito ao uso oficial da língua gestual em Tribunal.
- Décimo primeiro artigo: Informação e Cultura - todo o surdo tem direito ao acesso à informação e à cultura, através da língua gestual.
- Décimo segundo artigo: Segurança - os surdos devem estar devidamente informados quanto à sua segurança.
- Décimo terceiro artigo: Medicina - a pessoa surda tem direito de decidir submeter-se ou não a qualquer intervenção ou tratamento médico-cirúrgico. Nenhum tratamento da surdez, que possa afectar a sua integridade pessoal, pode ser imposto a um menor surdo.
- Décimo quarto artigo: Acessibilidade - a pessoa surda tem direito aos meios de acessibilidade gratuitos, que permitam abolir eventuais barreiras provocadas pela surdez.
- Décimo quinto artigo: Actividades Culturais, Desportivas e de Lazer - mostra este artigo que todo o surdo tem direito a aceder às actividades culturais, desportivas e de lazer.
- Décimo sexto artigo: Respeito dos Direitos - toda a pessoa surda tem direito a que sejam respeitados os seus Direitos.
- Décimo sétimo artigo: Surdos com Outros Problemas Físicos ou Mentais - toda a pessoa surda, mesmo que inclua deficiências a nível físico ou mental, deve ver respeitados todos os seus direitos de Pessoa Surda.
Referências
- ↑ Surdo vs surdo - Moura, Maria Cecília. O Surdo - Caminhos para uma nova identidade. Revinter.
- ↑ Perscrutar e escutar a surdez, pág. 84
- ↑ [1]
- ↑ A Criança Surda, pág. 66
- ↑ Lorena kozlowski, 1995 - http://www.ines.org.br/paginas/revista/espaco18/Reflexao03.pdf Arquivado em 24 de junho de 2007, no Wayback Machine.
- ↑ Perscrutar e Escutar a Surdez, pág. 23
- ↑ Perscrutar e Escutar a Surdez, pág. 24
- ↑ Goffman, 1988
- ↑ O Surdo - Caminhos para uma nova identidade, pag. 13.
- ↑ Associação de Surdos do Porto