Predefinição:Info/Escritor Josué Apolônio de Castro (Recife, 5 de setembro de 1908 — Paris, 24 de setembro de 1973), mais conhecido como Josué de Castro, foi um médico, nutrólogo, professor, geógrafo, cientista social, político, escritor e ativista brasileiro do combate à fome. Destacou-se no cenário brasileiro e internacional não só pelos seus trabalhos ecológicos sobre o problema da fome no mundo, mas também no plano político em vários organismos internacionais.
Partindo de sua experiência pessoal no Nordeste brasileiro, publicou uma extensa obra que inclui: Geografia da fome, Geopolítica da fome, Sete palmos de terra e um caixão e Homens e caranguejos. Exerceu a Presidência do Conselho Executivo da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO),[1] e foi também Embaixador brasileiro junto à Organização das Nações Unidas (ONU).
Recebeu da Academia de Ciências Políticas dos Estados Unidos o Prêmio Franklin D. Roosevelt. O Conselho Mundial da Paz lhe ofereceu o Prêmio Internacional da Paz e o governo francês o condecorou como Oficial da Legião de Honra. Foi ainda indicado ao Nobel da Paz nos anos de 1953, 1963, 1964 e 1965.[2]
Logo após o Golpe de Estado de 1964 teve seus direitos políticos suspensos pela Ditadura militar no Brasil.[3]
Biografia
1908-1929
Josué Apolônio de Castro nasceu no dia 5 de setembro de 1908, no Recife, capital do estado de Pernambuco. Seu pai veio de Cabaceiras, na Paraíba, durante a grande seca de 1877. Sua mãe, da região da zona da mata pernambucana. O menino mulato cresceu bem próximo aos mangues da cidade, região de mocambos, habitada por retirantes e caranguejos.[4]
Aos 20 anos formou-se na Faculdade de Medicina da Universidade do Rio de Janeiro, atual UFRJ.[3]
1930-1945
Apesar do interesse inicial pela psiquiatria, resolveu fazer nutrição e abriu sua clínica no Recife. Na mesma época, contratado por uma fábrica para examinar trabalhadores com problemas de saúde indefinidos e acusados de indolência, diagnosticou: “sei o que meus clientes têm. Mas não posso curá-los porque sou médico e não diretor daqui. A doença desta gente é fome”.[5] Logo foi demitido da fábrica. Vislumbrou então a dimensão social da doença, ocultada por preconceitos raciais e climáticos.
Efetuou um inquérito[6] pioneiro no Brasil, relacionando a produtividade com a alimentação do trabalhador, uma das bases para a posterior formulação do salário mínimo, e passou a chefiar uma comissão de estudos das condições de vida dos operários brasileiros. Como professor, lecionava Fisiologia e Geografia Humana.[7]
Casado com sua ex-aluna Glauce, mudou-se para o Rio de Janeiro em 1935. Após um período de dificuldades, passou a ensinar Antropologia.[8] Recorreu ao método geográfico para apresentar o mapa das regiões alimentares em A alimentação brasileira à luz da Geografia Humana.[9] Entre outros contos, crônicas, ensaios, estudos sociais e biológicos, publicou O ciclo do caranguejo, conto sobre os mangues de sua cidade natal.[10]
A partir de 1940, participou de todos os projetos governamentais ligados à alimentação, coordenando a implantação dos primeiros restaurantes populares,[11] dirigindo as pesquisas do Instituto de Tecnologia Alimentar[12] e colaborando para a execução de várias políticas públicas, como a educação alimentar. Sob sua direção foi lançado o periódico Arquivos Brasileiros de Nutrologia.[13]
1946-1963
O ano de 1946 foi marcado pela publicação de Geografia da fome.[14] Obra clássica da ciência brasileira, o livro buscou tirar da obscuridade o quadro trágico da fome no país. Enfatizou as origens socioeconômicas da tragédia e denunciou as explicações deterministas que naturalizavam este quadro.[15]
No mesmo ano, foi o fundador e primeiro diretor do Instituto de Nutrição da Universidade do Brasil.[16] Efetivou-se como professor de Geografia Humana em 1947, na Universidade do Brasil (atual UFRJ).[17][18] A Conferência da FAO de 1948 registrou o início de sua participação neste órgão internacional.[19]
Geopolítica da fome, livro publicado em 1951, concebido como uma extensão da Geografia da fome, tornou-se um marco histórico e político nas questões de alimentação e população. Os princípios ecológicos e geográficos foram desta vez utilizados na escala da fome mundial. Posicionou-se contra as interpretações demográficas que entendiam a fome como consequência de excesso populacional e prescreviam um controle de natalidade de massa. Cuidou de “desnaturalizar” a fome mais uma vez e demonstrou os vários fatores biológicos, geográficos, culturais e políticos pelos quais a fome gera a superpopulação.[20]
Respeitado internacionalmente, foi eleito, por representantes de setenta países, Presidente do Conselho Executivo da FAO, cargo que exerceu entre 1952 e 1956. Enfrentou forte oposição dos países desenvolvidos à execução de projetos voltados para o desenvolvimento do terceiro mundo e não deixou de expressar sua frustração com a “ação tímida e vacilante” da agência das Nações Unidas, apesar da alta qualificação de seus experts e técnicos.[21]
Exerceu dois mandatos como Deputado federal eleito pelo antigo PTB, representando o Estado de Pernambuco. Entre diversos projetos ligados a questões agrárias, educacionais, culturais e econômicas, apresentou o de regulamentação da profissão de nutricionista, que dispõe sobre o ensino superior de Nutrição[22] e o projeto para a reforma agrária, entendida como “um processo de revisão das relações jurídicas e econômicas entre os que detêm a propriedade rural e os que nela trabalham”.[23] Com seus pronunciamentos, deixou registrados relevantes acontecimentos históricos, assim como a defesa contra abusos da imprensa quando, em várias ocasiões, dá vazão a interesses subservientes.[24]
Em 1963, tornou-se Embaixador brasileiro junto à sede europeia da Organização das Nações Unidas, em Genebra. Era então uma personalidade de projeção internacional, convidado por reis e chefes de Estado, capaz de atrair uma plateia de 3 500 pessoas na cidade de Rouen, interior da França.[4]
1964-1973
Com o Golpe de Estado de 1964, foi destituído do cargo de embaixador-chefe em Genebra e seus direitos políticos foram suspensos pela Ditadura militar no Brasil em seu primeiro Ato Institucional.
No exílio, sentiu agudamente a falta do Brasil. Impedido de voltar ao país, aceitou asilar-se na cidade de Paris, onde procurou dar prosseguimento a suas atividades.
Fundou e dirigiu o Centro Internacional para o Desenvolvimento, além de ter presidido a Associação Médica Internacional para o Estudo das Condições de Vida e Saúde. Foi designado professor estrangeiro associado ao Centro Universitário de Vincennes e da Universidade de Paris,[25] onde trabalhou até sua morte.
Faleceu em Paris, em 24 de setembro de 1973. Seu corpo foi enterrado no cemitério de São João Batista no Rio de Janeiro.
Obras
- O Problema Fisiológico da Alimentação no Brasil. Recife: Ed. Imprensa Industrial, 1932.
- O Problema da Alimentação no Brasil. Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1933.
- Condições de Vida das Classes Operárias do Recife. Recife: Departamento de Saúde Pública, 1935.
- Alimentação e Raça. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1935.
- Therapeutica Dietética do Diabete. In: Diabete. Livraria do Globo, Porto Alegre, 1936. p. 271-294.
- Documentário do Nordeste. Rio de Janeiro: José Olympio, 1937.
- A Alimentação Brasileira à Luz da Geografia Humana. Rio de Janeiro: Livraria do Globo, 1937.
- Festa das Letras. Co-autoria de Cecília Meireles. Rio de Janeiro: Livraria Globo, 1937.
- Fisiologia dos Tabus. Rio de Janeiro: Ed. Nestlé, 1939.
- Geografia Humana. Rio de Janeiro: Livraria do Globo, 1939.
- Alimentazione e Acclimatazione Umana nel Tropici. Milão, 1939.
- Geografia da Fome: A Fome no Brasil. Rio de Janeiro: O Cruzeiro, 1946.
- La Alimentación en los Tropicos. México: Fondo de Cultura, 1946.
- Fatores de Localização da Cidade do Recife. Rio de Janeiro: Ed. Imprensa Nacional, 1947.
- Geopolítica da Fome. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1951.
- A Cidade do Recife – Um ensaio de Geografia Urbana. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1956. Reedição de Fatores de Localização da Cidade do Recife.
- Três Personagens. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1955.
- O Livro Negro da Fome. São Paulo: Brasiliense, 1957.
- Ensaios de Geografia Humana. São Paulo: Brasiliense, 1957.
- Ensaios de Biologia Social. São Paulo: Brasiliense, 1957.
- Sete Palmos de Terra e um Caixão. São Paulo: Brasiliense, 1965.
- Ensayos sobre el Sub-Desarrollo. Buenos Aires: Siglo Veinte, 1965.
- ¿Adonde va la América Latina?. Lima: Latino Americana, 1966.
- Homens e Caranguejos. Porto: Ed. Brasília, 1967.
- A Explosão Demográfica e a Fome no Mundo. Lisboa: ltaú, 1968.
- El Hambre - Problema Universal. Buenos Aires: La Pléyade, 1969.
- Latin American Radicalism. Edited by Irving Horowitz, Josué de Castro and John Gerassi. New York: Vintage Books, 1969. Coletânea organizada por Irving Horowitz, Josué de Castro e John Gerassi.
- A Estratégia do Desenvolvimento. Lisboa: Cadernos Seara Nova, 1971.
- Mensajes. Bogotá: Colibri, 1980.
- Fome: um Tema Proibido - últimos escritos de Josué de Castro. Anna Maria de Castro (org.). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
Honrarias e homenagens
- Prêmio Pandiá Calógeras, em 1937.
- Prêmio José Veríssimo, da Academia Brasileira de Letras, pelo livro Geografia da fome, em 1946.
- Professor Honoris-Causa da Universidade de San Domingos, na República Dominicana, em 1950.
- Professor Honoris-Causa da Universidade de San Marcos, no Peru, em 1950.
- Prêmio Franklin D. Roosevelt, da Academia de Ciências Políticas dos Estados Unidos, pelo livro Geopolítica da fome, em 1952.
- Grande Medalha da Cidade de Paris, em 1953.
- Prêmio Internacional da Paz, do Conselho Mundial da Paz, em 1954.
- Oficial da Legião de Honra da França, em 1955.
- Foi indicado para o prêmio Nobel em 3 ocasiões: em 1954, para o Nobel de Medicina, e nos anos de 1963 e 1970, ao Nobel da Paz.[26]
Póstumos:
- O Instituto de Nutrição da UFRJ, fundado por ele, passou a chamar-se Instituto de Nutrição Josué de Castro, em 1996.[27]
- Doutor Honoris-Causa in memoriam pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 2003.
- Patrono do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).
- Grã-Cruz in memoriam da Ordem de Rio Branco, admitido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2005.[28]
- Grã-Cruz in memoriam da Ordem do Mérito Cultural, do Ministério da Cultura, em 2006.[29]
Ver também
Referências
- ↑ Josué de Castro foi eleito presidente do Conselho Executivo da FAO
- ↑ «Nomination Database». www.nobelprize.org (em inglês). Prêmio Nobel. Consultado em 7 de novembro de 2016
- ↑ 3,0 3,1 CASTRO, Josué de. Fome: um tema proibido - últimos escritos de Josué de Castro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
- ↑ 4,0 4,1 MENEZES, Francisco R. de Sá. Josué de Castro: Por um mundo sem fome. São Paulo: Mercado Cultural, 2004. 120p. il. (Projeto Memória, 8).
- ↑ PROJETO MEMÓRIA. Josué de Castro: Por um mundo sem fome.
- ↑ CASTRO, Josué de. Condições de vida das classes operárias do Recife. Departamento de Saúde Pública, Recife, 1935.
- ↑ Respectivamente, na Faculdade de Medicina do Recife e na Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais do Recife, de cuja fundação participou.
- ↑ Na Universidade do Distrito Federal.
- ↑ CASTRO, Josué de. A Alimentação Brasileira à Luz da Geografia Humana. Livraria do Globo, Rio de Janeiro, 1937.
- ↑ CASTRO, Josué de. Documentário do Nordeste. Livraria José Olympio, Rio de Janeiro, 1937. Conto originalmente publicado no periódico A plateia.
- ↑ Do Serviço de Alimentação da Previdência Social (SAPS).
- ↑ ITA, do Serviço Técnico de Alimentação Nacional.
- ↑ A partir de 1944.
- ↑ CASTRO, Josué de. Geografia da fome: a fome no Brasil. Rio de Janeiro: O Cruzeiro, 1946.
- ↑ CASTRO, Josué de. Geografia da fome. Apresentação de Milton Santos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.
- ↑ A partir da incorporação do ITA à Universidade. Atual Instituto de Nutrição Josué de Castro da UFRJ.
- ↑ Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil.
- ↑ CASTRO, Josué de. Fatores de Localização da Cidade do Recife. Rio de Janeiro: Ed. Imprensa Nacional, 1947.
- ↑ Report of the Conference of FAO. 4th Session. Washington, D.C., November 1948.
- ↑ Geopolítica da Fome. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1951.
- ↑ CASTRO, Josué de. O livro negro da fome. S. Paulo: Brasiliense, 1966. p. 54-55.
- ↑ Projeto nº 904. Diário do Congresso Nacional, Seção I, de 14/4/1957, p.616.
- ↑ Projeto nº 11, de 1959. Diário do Congresso Nacional, Seção I, de 20/3/1959, p.1137-1138.
- ↑ Diário do Congresso Nacional, Seção I, de 3/7/1959, p.3816.
- ↑ «Josué de Castro | CPDOC». cpdoc.fgv.br. Consultado em 8 de setembro de 2021
- ↑ «Centro Josué de Castro | JC». www.josuedecastro.org.br. Consultado em 8 de setembro de 2021
- ↑ «Instituto de Nutrição - UFRJ.». Consultado em 23 de dezembro de 2015. Arquivado do original em 30 de agosto de 2011
- ↑ Predefinição:Citar lei
- ↑ MINISTÉRIO DA CULTURA. Ordem do Mérito Cultural. Brasília: Ministério da Cultura, 2006.
Ligações externas
- Projeto Memória: Josué de Castro
- Centro Josué de Castro
- Vídeo: Entrevista de Josué de Castro, outubro 1959 (em francês)
- Radio-Canada: Josué de Castro, junho 1960 (em francês)
Textos sobre Josué de Castro
- Josué de Castro e a Descoberta da Fome (Tânia Elias Magno da Silva)
- Josué, Um Brasileiro (Patrus Ananias)
- A coffin for Maltusianism: Josué de Castro's Subaltern Geopolitics (Federico Ferretti)
- Uma Vida Contra a Fome (Moacyr Scliar)
- A Divulgação Científica na Obra de Josué de Castro (José Marques de Melo)
- Biografia de Josué de Castro (Centro de Estudos e Pesquisas Josué de Castro)