Há 10 Mil Anos Atrás | |||||||
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Álbum de estúdio de Raul Seixas | |||||||
Lançamento | dezembro de 1976 | ||||||
Gravação | Entre maio e novembro de 1976 | ||||||
Estúdio(s) | Estúdios Phonogram na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro | ||||||
Gênero(s) | Rock and roll, MPB, tango, hard rock, repente, forró e country rock | ||||||
Duração | Predefinição:Duração | ||||||
Idioma(s) | Português | ||||||
Formato(s) | LP e Fita cassete (lançamento original) CD (relançamento) | ||||||
Gravadora(s) | Philips Records, Fontana Records, Mercury Records, Universal Music | ||||||
Produção | Sérgio de Carvalho | ||||||
Cronologia de álbuns de estúdio por Raul Seixas | |||||||
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Singles de Há 10 Mil Anos Atrás | |||||||
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Há 10 Mil Anos Atrás é o quinto álbum de estúdio solo do cantor e compositor brasileiro Raul Seixas, lançado em dezembro de 1976 pela gravadora Philips Records e gravado entre maio e novembro do mesmo ano nos estúdios Phonogram na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Este disco representou uma volta ao misticismo que marcou o auge de sua carreira, após a relativa baixa de vendas de Novo Aeon, no ano anterior, em que o músico tinha mudado sua postura e a temática de suas canções.
O álbum teve uma recepção fria da crítica especializada, com críticos pontuais - mais próximos do cantor baiano - elogiando o trabalho. A divulgação pela gravadora foi boa, contando com clipe musical no programa dominical da Rede Globo, o Fantástico. As vendagens foram positivas, significando uma recuperação em relação ao álbum anterior, apesar do contínuo abuso do cantor de álcool e drogas, o que viria a prejudicar a sua carreira no futuro. O disco é visto hoje como um dos momentos altos da carreira do compositor baiano, trazendo dois de seus maiores sucessos: "Eu Também Vou Reclamar" e "Eu Nasci Há 10 Mil Anos Atrás".
Antecedentes
Após o lançamento de Novo Aeon, no ano anterior, Raul Seixas encontrava-se pressionado por sua gravadora para lançar um novo sucesso. Não que as vendagens do disco anterior tivessem sido baixas, chegaram a 60 mil. O problema é que as expectativas tinham subido após Gita, de 1974, que havia vendido mais de 100 mil cópias e sido certificado como "disco de ouro". Com a liberdade artística que Raul contava e o custo da produção dos seus discos, sua gravadora esperava resultados melhores. Por outro lado, Raul sentia-se desprestigiado porque acreditava que sua gravadora não reconhecia seus esforços e percebia que sua gravadora julgava-o meramente pelos resultados comerciais de seus discos, não por seus resultados estéticos.[1][2]
Desse modo, após o rompimento com o seu empresário, Guilherme Araújo, em 1974, Raul experimentou uma mudança de imagem em 1975, cortando seu cabelo e diminuindo o nível de signos e símbolos esotéricos presentes em seus álbuns naquele ano. A estratégia não foi considerada bem sucedida, levando a retomada da imagem do mago, do profeta, do guru neste álbum.[1][2]
Gravação e produção
O disco foi gravado entre maio e novembro de 1976, nos estúdios Phonogram, da gravadora Philips Records, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.[3] As sessões de gravação do álbum foram tensas, especialmente porque a gravadora de Raul pressionava o cantor por um disco que apresentasse boas vendagens e, ao mesmo tempo, o cantor percebia que não tinha grande liberdade artística e que sua gravadora não lhe dava o devido reconhecimento. Assim, o compositor baiano sabia que tinha um grande sucesso nas mãos, mas estava desiludido com o tratamento dispensado pela gravadora. Desse modo, as sessões tiveram momentos de tensão, com o músico chegando a apresentar-se bêbado e a recusar-se a gravar nos dias marcados.[1][4][2]
A produção também foi custosa, com muitos dispêndios em orquestração, coros de vozes e músicos adicionais.[1] Um exemplo dos custos associados à produção do álbum é a capa. Para fazer o que o músico queria, a gravadora teve que contratar um maquiador especializado que veio de São Paulo apenas para realizar a maquiagem em Raul para a sessão de fotos da capa do disco.[5]
Resenha musical
O álbum inicia com "Canto para minha Morte", um tango a lá Piazzola, que começa com uma parte declamada com um discurso sobre a morte, que "representa um irrecusável apelo à vida", no estilo de Albert Camus.[6] Nesta canção, Raul apresenta uma filiação ao mito da alma gêmea, afirma que talvez a morte seja o grande segredo da vida e "apresenta um elemento de imprevisibilidade que irrompe como uma perturbação sobre a 'normalidade' do quotidiano".[7] Continua com "Meu Amigo Pedro" que é uma crítica ao conformismo - fazendo ecos a "Dr. Paxeco", de Sociedade da Grã-Ordem Kavernista Apresenta Sessão das 10 - na qual o sistema conta com o bom comportamento do personagem título, sem nenhum sinal de corrompimento ou questionamento.[8] A música desenvolve-se através de um diálogo entre o indivíduo que busca se emancipar e aquele outro que já aceitou as regras normais, com um "componente de melancolia pela separação que isso acaba impondo às pessoas".[9]
"Ave Maria da Rua" é uma canção em que Raul associa o sentimento religioso com as mulheres comuns, utilizando até sua mulher e a de Paulo como exemplos.[6] A música parte de uma relação sincrética entre Iemanjá e Ave Maria para chegar na religiosidade da mulher comum,[10] sendo, por isso mesmo, uma música anarquista ao chamar a atenção para o sagrado no comum.[11] "Quando Você Crescer" e "Cantiga de Ninar" são duas músicas compostas por Raul para sua filha então recém-nascida. "Dia da Saudade" foi feita em parceria com o seu cunhado e guitarrista, Jay Anthony Vaquer. O Lado B abre com "Eu Também Vou Reclamar" na qual Raul utiliza a irreverência e o humor para criticar o que ele considerava uma ressurgência da "música de protesto" dos anos 60, especialmente com os compositores Sílvio Brito e Belchior.[6] Segue uma nova versão - mais hard rock - de "As Minas do Rei Salomão", lançada originalmente em seu álbum de 1973, Krig-ha, Bandolo!, e que, além de ter como temática o amor, também traz Raul ironizando a sua condição de outsider.[12] "Os Números" é um repente estilizado como forró com raízes esotéricas.[6][13]
O disco fecha com "Eu Nasci Há 10 Mil Anos Atrás", um rock estilizado com pitadas de música country e o título, tema e letra da música são inspirados em uma canção gravada por Elvis Presley - ídolo de Raul - em seu álbum Elvis Now, de 1972. A canção chama-se "I Was Born About Ten Thousand Years Ago" e foi adaptada e arranjada por Elvis, já que se trata de uma canção tradicional, de domínio público. Comparando-se as duas versões, Raul e Paulo fizeram diversas modificações na letra e ampliaram as ideias da canção original que se utiliza somente de temas bíblicos. A versão de Raul expande para citar outras religiões, acontecimentos históricos recentes e até contos de fadas.[14] Além disso, a canção adquire outro sentido sob Raul já que faz referência a troca das eras na astrologia (reverberando o título de seu disco anterior, Novo Aeon).[15] Também, a letra contém críticas, como a oposição entre a mensagem de Cristo e o agir da Igreja organizada.[16]
Recepção
Lançamento
O álbum foi lançado em dezembro de 1976[17] e beneficiou-se da divulgação por parte da gravadora para vender em torno de 100 mil cópias no ano de seu lançamento.[18] Para a divulgação foram lançados um compacto simples em junho[6] - numa tentativa de não repetir o que a gravadora considerava um erro na divulgação do álbum anterior[19] - e um compacto duplo junto com o disco. Também, Raul gravou dois clipes musicais para o programa dominical da Rede Globo, o Fantástico ("Eu Também Vou Reclamar"[20] e "Eu Nasci Há 10 Mil Anos Atrás"[21]), e teve duas participação no programa Globo de Ouro, uma em julho e outra em setembro.[22] O lançamento deste álbum representou uma retomada das vendas - após a baixa com Novo Aeon - trazendo uma retomada no interesse pela carreira do cantor baiano. No ano seguinte, Raul deixaria a Philips Records para trabalhar com o produtor dos seus quatro primeiros discos, Marco Mazzola, que tinha se mudado para a WEA, de André Midani. Este álbum representa, também, o último com grande participação de Paulo Coelho, com quem Raul brigaria. A parceria seria retomada brevemente em Mata Virgem, dois anos depois.[2][23]
Fortuna crítica
Predefinição:Críticas profissionais A recepção da crítica especializada esteve entre o frio e o favorável com diversos dos críticos musicais tarimbados não tendo se dedicado a escutar e realizar uma apreciação da obra, resultado do esfriamento da crítica relativamente ao cantor baiano e sua obra após o lançamento de Novo Aeon. O disco aposta na imagem do místico, lugar comum nesta fase inicial da carreira de Raul Seixas. Havia, desse modo, uma grande discussão ainda sobre o lugar do cantor e compositor baiano dentro da tradição da MPB.[24] Aposta, também, no confronto e na crítica a certas posturas que se estabeleciam na musica popular no período, como o que era considerado pelo cantor como um retorno da "música de protesto" dos anos 60 a partir das manifestações de Sílvio Brito e Belchior.[6]
Uma das exceções é Nelson Motta, escrevendo para O Globo, que elogia muito o novo disco de Raul chamando-o de "um grande trabalho", especialmente pelo ecletismo de Raul e por suas letras, consideradas ótimas e cheias de humor.[6]
Relançamentos
O álbum foi relançado em LP em 1983, pelos selos Philips Records (série azul) e Fontana Records (série verde). Seu primeiro lançamento em CD foi feito no ano de 1994, pelo selo Philips Records.[25] O álbum seria relançado dentro de uma caixa contendo os seis discos lançados por Raul na gravadora (Os 24 Maiores Sucessos da Era do Rock, Krig-ha, Bandolo!, Gita, Novo Aeon, Há 10 Mil Anos Atrás e Raul Rock Seixas), intitulada Maluco Beleza.[26] A caixa seria relançada em 2009, com o título 10.000 Anos à Frente.[27]
Legado
Este álbum é considerado hoje como um dos melhores e mais significativos lançamentos de Raul Seixas, trazendo duas de suas mais conhecidas e melhores canções.[28]
Faixas
Predefinição:Lista de faixas Predefinição:Lista de faixas
Créditos
Créditos dados pelo Discogs.[25]
Músicos
- Violões: Rick Ferreira e Jay Anthony Vaquer
- Guitarra elétrica: Rick Ferreira e Jay Anthony Vaquer
- Piano: Miguel Cidras, Túlio Mourão
- Acordeon: Chiquinho do Acordeom
- Baixo: Juan Capobianco, Paulo César Barros e Liminha
- Bateria: Pedrinho Batera
- Percussão: Miguel Cidras, Áureo de Souza, Ariovaldo Contesini, Jackson do Pandeiro e Marco Mazzola
Ficha técnica
- Produção e direção: Sérgio de Carvalho
- Coordenação Musical: Jay Anthony Vaquer
- Arranjos e regência: Miguel Cidras
- Engenheiro de Som: Luigi Hoffer, Ary Carvalhães e Luis Claúdio Coutinho
- Mixagem e Corte: Luigi Hoffer e Sérgio de Carvalho
- Capa: Aldo Luis
- Arte Final: José Paulo e Jorge Vianna
- Foto: Januário Garcia
Referências
- ↑ 1,0 1,1 1,2 1,3 Rada Neto, 2013, pp. 157-163.
- ↑ 2,0 2,1 2,2 2,3 Souza, 2011, pp. 135-138.
- ↑ Motta, 1976-1.
- ↑ Seixas; Essinger, 2005, p. 110.
- ↑ Motta, 1976-4.
- ↑ 6,0 6,1 6,2 6,3 6,4 6,5 6,6 Motta, 1976-2.
- ↑ Boscato, 2006, p. 183.
- ↑ Jorge, 2012, p. 194.
- ↑ Boscato, 2006, pp. 27-28.
- ↑ Jorge, 2012, pp. 173-174.
- ↑ Boscato, 2006, pp. 186-188.
- ↑ Boscato, 2006, pp. 50-51.
- ↑ Boscato, 2006, p. 75.
- ↑ Rada Neto, 2011, p. 11.
- ↑ Jorge, 2010, p. 14.
- ↑ Boscato, 2006, p. 19.
- ↑ Motta, 1976-3.
- ↑ Rada Neto, 2013, p. 159.
- ↑ Souza, 2016, pp. 252-254.
- ↑ «Fantástico: Raul Seixas canta Eu também vou reclamar». Globo.com. 15 de junho de 2009. Consultado em 7 de dezembro de 2017
- ↑ «Fantástico: Raul Seixas em 'Eu nasci há 10 mil anos atrás'». Globo.com. 15 de junho de 2009. Consultado em 7 de dezembro de 2017
- ↑ Programação. O Globo, 02 de julho de 1976, p. 44.
- ↑ Molina, André (5 de outubro de 2009). «Conheça 10 importantes obras de Raul Seixas». Whiplash.net. Consultado em 12 de agosto de 2012
- ↑ Souza, 2011, p. 137.
- ↑ 25,0 25,1 «Raul Seixas - Há 10 mil anos atrás». Discogs. N.d. Consultado em 12 de dezembro de 2017
- ↑ Sanches, Pedro Alexandre (18 de outubro de 2002). «Universal reata com o brega subversivo de Raul Seixas». Folha de S.Paulo. Consultado em 12 de dezembro de 2017
- ↑ Garcia, Lauro Lisboa (26 de janeiro de 2010). «Bons rocks do baú de Raul: é som na caixa». Estadão. Consultado em 12 de dezembro de 2017
- ↑ Forastieri, 1989.
Bibliografia
- Predefinição:Aut. É Raul Seixas, a metamorfose ambulante. O Globo, 16 de dezembro de 1976.
- Predefinição:Aut. Vivendo a sociedade alternativa. Tese de Doutorado. São Paulo: FFLCH/USP, 2006.
- Predefinição:Aut. Raul Seixas: cada cabeça é um mundo. Folha de S.Paulo, 27 de dezembro de 1976.
- Predefinição:Aut. Volta aos palcos em 88 foi triunfal. Folha de S. Paulo, Ilustrada, publicado em 22 de agosto de 1989.
- Predefinição:Aut. Raul Seixas: Um Produtor de mestiçagens musicais e midiáticas. Tese de Doutorado. São Paulo: PUC-SP, 2012.
- Predefinição:Aut. Conheça 10 importantes obras de Raul Seixas. Publicado em Whiplash.net em 15 de outubro de 2009. Página visitada em 12 de agosto de 2012.
- Predefinição:Aut. Há dez mil anos, Raul. O Globo, 26 de abril de 1976, p. 36.
- Predefinição:Aut. Belchior: agitos, dúvidas e sucesso. O Globo, 1 de julho de 1976, p. 42.
- Predefinição:Aut. Saindo, saiu e vai sair. O Globo, 8 de novembro de 1976.
- Predefinição:Aut. O novo Raul de sempre: melhor do que nunca. O Globo, 9 de novembro de 1976.
- Predefinição:Aut. Nosso tipo inesquecível: um ator, um magro abusado. O Globo, 21 de dezembro de 1976.
- Predefinição:Aut. O Iê-Iê-Iê Realista de Raul Seixas: trajetória artística e relações com a indústria cultural. Monografia de Conclusão de Curso. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2013.
- Predefinição:Aut. O Rock 'n' roll invade os palcos da MPB: Raul Seixas e a influência do rock and roll. Artigo apresentado no XXVI Simpósio Nacional de História. São Paulo: ANPUH, julho de 2011.
- Predefinição:Aut. In: ESSINGGER, Silvio (org). O baú do Raul Revirado. São Paulo: Ediouro, 2005.
- Predefinição:Aut. Eu devia estar contente: a trajetória de Raul Santos Seixas. Dissertação de mestrado. Marília: Unesp, 2011.
- Predefinição:Aut. Construção e autoconstrução de um mito: análise sociológica da trajetória artística de Raul Seixas. Tese de Doutorado. São Paulo: Usp, 2016.
- Programação. O Globo, 02 de julho de 1976, p. 44.