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Exposição do Mundo Português

Bandeira da Exposição

A Exposição do Mundo Português (23 de Junho de 1940 — 2 de Dezembro de 1940) foi uma exposição realizada em Lisboa em 1940.

Historicamente coincidente com o primeiro ano da Segunda Guerra Mundial, teve o propósito de comemorar a data da Fundação do Estado Português (1140) e da Restauração da Independência (1640), mas, também (e esse seria o objetivo primordial), de celebrar o Estado Novo, então em fase de consolidação. Foi o acontecimento político-cultural mais marcante do Regime e a maior exposição do seu género realizada no país até à Expo 98 (1998).

História

Génese

Eduardo Anahory, capa do Guia oficial da Exposição

A ideia de celebrar o Duplo Centenário da Fundação e da Restauração da Nacionalidade (1140 e 1640) que esteve na origem da Exposição do Mundo Português foi lançada em 1929 pelo embaixador de Portugal na Bélgica Alberto de Oliveira; seria assumida em Março de 1938 por Salazar através de uma Nota Oficiosa da Presidência do Conselho onde se fixava, com alguma minúcia, o programa das comemorações. A exposição surgiu na sequência da participação portuguesa nas grandes Exposições Internacionais de Paris (1937), Nova Iorque e S. Francisco (1939).[1]

A mostra teve lugar num período de consolidação do Estado Novo, assumindo então, no que respeita aos recursos materiais e humanos, uma dimensão inédita, tornando-se no acontecimento político-cultural mais marcante do Regime. "O empenho político nas comemorações resulta da compreensão do que estava em jogo: passar ao ato (em forma de comemoração) a consagração pública de uma legitimidade representativa própria, desta feita, eminentemente ideológica e histórica. [...] Esforçou-se o Estado Novo por associar os traços mais marcantes do seu nacionalismoautoritarismo, elitismo, paternalismo, conservadorismo – a um passado mítico legitimador do presente. [...] Corolário de uma «política de espírito», lançada na década anterior pelo audacioso diretor do Secretariado de Propaganda Nacional, António Ferro, assiste-se à mais conseguida conciliação da arte com a política no Estado Novo".[2] A opção estética adotada nas comemorações provocou críticas violentas por parte dos artistas académicos, liderados pelo Coronel Arnaldo Ressano Garcia (presidente da Sociedade Nacional de Belas-Artes), e que ficariam maioritariamente à margem do evento.[3]

A comissão nacional foi presidida por Alberto de Oliveira, secretariada por António Ferro, integrando um vasto número de personalidades da vida pública nacional. A comissão executiva foi presidida por Júlio Dantas, tendo como secretário-geral António Ferro. A comissão especial foi dirigida por Augusto de Castro (Comissário-Geral), secundado por Sá e Melo (Comissário-Geral-Adjunto),[4] tendo Cottinelli Telmo como Arquiteto-Chefe. Gustavo de Matos Sequeira encarregou-se da coordenação histórica, José Leitão de Barros dos serviços externos e Gomes de Amorim do ajardinamento dos espaços. Acontecimento nacional, prolongado em congressos, cerimónias e espetáculos vários, a exposição incluiu pavilhões temáticos relacionados com a história de Portugal, suas atividades económicas, cultura, regiões e territórios ultramarinos, e o pavilhão do Brasil (o único país estrangeiro presente).[1]

A exposição

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Exposição do Mundo Português, 1940 – Jardim da Praça do Império; Mosteiro dos Jerónimos; Pavilhão de Honra e de Lisboa (de Luís Cristino da Silva)
Jardim da Praça do Império, 2011

Situado entre a margem direita do rio Tejo e o Mosteiro dos Jerónimos, o evento ocupou uma área de cerca de 560 mil metros quadrados e implicou a renovação urbana da zona ocidental de Lisboa. O local era particularmente favorável ao efeito teatral desejado, criando-se desde logo uma monumental Praça do Império (atual Jardim da Praça do Império), ladeada a nascente e poente por dois grandes pavilhões longitudinais perpendiculares ao mosteiro quinhentista: o Pavilhão de Honra e de Lisboa (de Luís Cristino da Silva) e, do outro lado, o Pavilhão dos Portugueses no Mundo (do próprio Cottinelli Telmo).[1]

A entrada principal localizava-se na Praça Afonso de Albuquerque, junto ao Mosteiro dos Jerónimos; outras duas entradas, de ambos os lados da linha de caminho de ferro, faziam-se por portas agenciadas entre quatro construções quadrangulares tendo, nas faces principais, baixos relevos representando guerreiros medievais com grandes escudos.[5] Atravessando a linha férrea através da passarela monumental encontrava-se a Secção Histórica, (Pavilhão da Formação e Conquista; Pavilhão da Independência; Pavilhão dos Descobrimentos; Esfera dos Descobrimentos). Do outro lado, situava-se o Pav. da Fundação, o Pav. do Brasil (país convidado para tal efeito), e o Pav. da Colonização. Atravessando o Bairro Comercial e Industrial, chegava-se perto do Mosteiro dos Jerónimos, à entrada da Secção Colonial. No canto precisamente oposto, um Parque de Atrações fazia a delícia dos mais novos. Descendo em direção ao rio Tejo, e para além do Pavilhão dos Portugueses no Mundo, a Secção de Etnografia Metropolitana, com o seu Centro Regional, contendo representações das Aldeias Portuguesas e os Pavilhões de Arte Popular. Por trás deste último pavilhão, encontrava-se o Jardim dos Poetas e o Parque Infantil. Frente ao rio Tejo, com as suas docas, um Espelho de Água com um restaurante abria o caminho para o Padrão dos Descobrimentos e para a Nau Portugal.[1]

Entre as obras de maior relevo destaque-se o Pavilhão da Honra e de Lisboa, que recebeu as melhores opiniões da crítica. Com 150 metros de comprimento por 19 de altura e uma imponente torre de 50 metros, este pavilhão traduziu o ideal arquitetónico historicista e revivalista que o Estado Novo tentava impor, tal como os outros regimes totalitários europeus então faziam. Do Pavilhão dos Portugueses no Mundo, com um risco mais simples, destacava-se a possante estátua da Soberania, de Leopoldo de Almeida, imagem de uma severa mulher couraçada, segurando a esfera armilar e apoiada num litor legendado com as partes do Mundo, em caracteres góticos.[1]

O Padrão dos Descobrimentos, da autoria de Cottinelli e Leopoldo de Almeida, pretendia ilustrar a importância histórica dos descobrimentos. A estrutura do monumento representava, de modo esquemático, uma embarcação com três velas. Sobre um plano inclinado, ladeando o velame estilizado, duas sequências de figuras, lideradas, à proa, pelo timoneiro de todo o projeto expansionista português: o Infante D. Henrique. O padrão original foi construído em materiais perecíveis; viria a ser reconstruído em betão e cantaria de pedra, em 1960, por ocasião da comemoração dos 500 anos da morte do Infante.[1][6]

A ideia da Nau Portugal partiu de Leitão de Barros e mostrou ser uma assinalável reconstituição do passado. Embora apelidada de nau, esta embarcação era na realidade a réplica de um galeão da carreira da Índia do século XVII. Foi construída nos estaleiros de Aveiro e saiu a primeira vez com destino a Lisboa em Julho, tombando minutos após a partida; com grandes esforços foi devolvida à posição vertical, acabando mais tarde por ser pilotada até Lisboa por marinheiros ingleses, sob a direção do comandante Spencer.[7]

Grande documentário da civilização cristã, exposição histórica e de afirmação do regime do Estado Novo, "ato de espírito e de arte notavelmente sustentado por uma plêiade de arquitetos, escultores, pintores e decoradores", a Exposição do Mundo Português culminou meia dúzia de anos de afirmação e estratégia política. Com ela se encerrou, de modo sistematizado, o primeiro modernismo nacional, que emergira por volta de 1915, arrastando-se ao longo de uns anos 20 provincianos, um modernismo que seria em parte afirmado, em parte negado, no período áureo da «Política do Espírito» de António Ferro e das suas Exposições de Arte Moderna do S.P.N.. O necessário «equilíbrio estético» defendido por Ferro devia materializar-se numa "nova fase de maturidade orientada para valores nacionalistas e folclóricos, com a recuperação ideológica, estilizada ou modernizada, de formas do passado nacional", princípios que marcaram grande parte da produção artística desse período, em particular a estatuária pública e a arquitetura (na arquitetura essa involução viria a gerar o estilo comumente apelidado Português Suave).[8][9]

A exposição foi inaugurada a 23 de Junho de 1940 – já em plena Segunda Guerra Mundial –, pelo Chefe de Estado, Marechal Carmona, pelo Presidente do Conselho, Oliveira Salazar e pelo Ministro das Obras Públicas, Duarte Pacheco. O encerramento ocorreu a 2 de Dezembro desse mesmo ano. A exposição recebeu cerca de três milhões de visitantes, constituindo a mais importante iniciativa cultural do regime (regime este que enfrentaria a sua primeira crise política cinco anos mais tarde, com o fim da guerra e derrota dos regimes totalitários de Hitler e Mussolini). A maioria das edificações da exposição foi demolida ao seu término, restando apenas algumas, entre as quais o Jardim da Praça do Império, o Monumento aos Descobrimentos e o edifício que hoje acolhe o Museu de Arte Popular.[carece de fontes?]

Pavilhões / Iniciativas

Predefinição:Double image A estrutura da exposição foi assegurada por um grupo de arquitetos, quase todos de passado modernista, dirigido por Cottinelli Telmo (direção e planificação global; autor do Padrão dos Descobrimentos de parceria com Leopoldo de Almeida e do Pavilhão dos Portugueses no Mundo). Entre os 17 arquitetos que trabalharam no conjunto destaque-se ainda Cristino da Silva, autor do Pavilhão de Honra e de Lisboa, segundo José-Augusto França, "o melhor edifício da exposição – e talvez a melhor obra da maturidade de Cristino da Silva".[5]

Assinalem-se ainda as seguintes participações: Porfírio Pardal Monteiro (Pavilhão dos Descobrimentos); Carlos Ramos (Pavilhão da Colonização); Veloso Reis (Pavilhão da Vida Popular); Jorge Segurado (núcleos das Aldeias Portuguesas); Raul Lino (Pavilhão do Brasil); Rodrigues Lima (3 pavilhões históricos: Pavilhão da Fundação, Pavilhão da Formação e Conquista, Pavilhão da Independência); etc.[1]

Pintura e Escultura:

Ao todo participaram 43 pintores, entre os quais os membros da equipa encarregue dos Pavilhões de Portugal nas Feiras Internacionais de Paris (1937), Nova Iorque e S. Francisco (1939): Fred Kradolfer, Bernardo Marques, Thomaz de Mello, Carlos Botelho, José Rocha, Emmerico Nunes, Paulo Ferreira. E também: Almada Negreiros, Jorge Barradas, Lino António, Martins Barata, Manuel Lapa, Sarah Afonso, Estrela Faria, Clementina Carneiro de Moura, Mily Possoz, etc.

Participaram 24 escultores de onde podem destacar-se Canto da Maia (grupo D. Manuel, Gama e Cabral; baixo-relevo na fachada do Pavilhão de Honra e de Lisboa) e Leopoldo de Almeida (estátua da Soberania; estatuária do Padrão dos Descobrimentos). E também: António da Costa, Barata Feyo, Ruy Gameiro, António Duarte, Martins Correia, João Fragoso, Raul Xavier, etc.[1]

E ainda:

  • Nau Portugal (reconstituição por Leitão de Barros, Martins Barata e Quirino da Fonseca).
  • De 31 de Janeiro de 1939 a Dezembro de 1940 foi publicada a Revista dos Centenários, que acompanhou a exposição e os acontecimentos com ela articulados ocorridos em todo o país (urbanizações, construção de estradas e pontes, restauros de monumentos, inaugurações de edifícios e estátuas, exposições de arte, congressos, publicações, cortejos, festas diversas).[1]

Bandeiras

Tiveram em destaque várias bandeiras municipais, para além de terem sido criadas outras exclusivamente para a exposição, com influências diversas, como a bandeira utilizada na Batalha de Almansa, a bandeira regimental napoleónica e ainda as cores da Ordem do Império, numa tentativa de criar uma bandeira colonial representativa de todas as colónias portuguesas.

Ver também

Referências

  1. 1,0 1,1 1,2 1,3 1,4 1,5 1,6 1,7 1,8 A.A.V.V. – Os anos 40 na Arte Portuguesa (tomo 1). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1982, p. 54-63.
  2. «Efemérides – Exposição do Mundo Português (1940)». Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 7 de julho de 2014 
  3. «Exposição do Mundo Português». In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora. Consultado em 7 de julho de 2014 
  4. «Manuel Duarte Moreira de Sá e Melo» (PDF). Parlamento. Consultado em 3 de julho de 2014 
  5. 5,0 5,1 França, José AugustoHistória de Arte em Portugal: o modernismo. Lisboa: Editorial Presença, 2004, p. 81-85. ISBN 972-23-3244-9
  6. «O monumento». Padrão dos Descobrimentos. Consultado em 7 de julho de 2014 
  7. «The Story of the Nau Portugal». Portugal Remixed. Consultado em 7 de julho de 2014 
  8. Fernandes, José Manuel – Português Suave: Arquiteturas do Estado Novo. Lisboa: IPPAR, Departamento de Estudos, 2003. ISBN 972-8736-26-6
  9. França, José-Augusto – "Os anos 40 na arte portuguesa". In: A.A.V.V. – Os anos 40 na Arte Portuguesa (tomo 1). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1982, p. 23-42

Ligações externas

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