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Joana de Trastâmara

Joana de Castela, uma rainha sem reino. Depreciativamente chamada pelos seus detractores de «A Beltraneja», mereceu o reconhecimento em Portugal, onde ficou conhecida para a posteridade como «A Excelente Senhora».

A infanta Joana de Castela, depreciativamente cognominada como a Beltraneja, nasceu em 1462 e morreu em Lisboa em 1530.

A sua mãe era a princesa Joana de Portugal, filha do rei D. Duarte, casada com o rei Henrique IV de Castela. Contudo, Henrique, sem filhos dos casamentos anteriores, tinha a fama de ser impotente (condição, de resto, expressa pelo seu cognome - Henrique, o Impotente), e por isso logo se urdiu na Corte que sua mulher estava envolvida num caso amoroso com o nobre D. Beltrán de La Cueva. Joana foi pois considerada ilegítima pelos Grandes de Castela, que se recusaram a reconhecê-la como herdeira, e desde o berço foi conhecida pelo aviltante título de a Beltraneja, como referência ao seu putativo pai verdadeiro.

O seu nascimento provocou portanto um escândalo na corte de Castela e o pedido de divórcio de Henrique de Castela, tendo a rainha D. Joana de Avis sido repudiada em 1468, e regressado a Portugal, embora a filha permanecesse em Castela.

À parte a questão da legitimidade, Joana continuava a ser a única criança que podia ser (ainda que remotamente) atribuída a Henrique IV de Castela, o qual gostava bastante dela. Henrique obrigou os nobres castelhanos a jurarem fidelidade à princesa e a reconhecerem-na como herdeira; como o não conseguisse, delegou a sucessão no seu irmão Afonso, o qual viria, no entanto, a falecer, pelo que se viu forçado a escolher como sucessora, muito a contragosto, a sua meia-irmã Isabel, com a condição de que esta aceitasse o casamento que o rei lhe propusesse.

Como em 1469 esta se casasse em segredo com Fernando, herdeiro da Coroa de Aragão, contra a vontade de Henrique, o rei castelhano considera violado o acordo que estabelecera com Isabel, e declara Joana a sua única legítima herdeira, procurando nos últimos anos de vida arranjar-lhe marido.

Depois de alguns contratos falhados, Joana acabou prometida em casamento ao tio (devendo para tal pedir dispensa papal, dada a grande consanguinidade entre os dois), o rei Afonso V de Portugal, o qual jurou defender os direitos dela (e por conseguinte de si próprio) ao trono de Castela. A partir deste momento estão delineadas duas facções - uma que apoia Isabel e, por conseguinte, a união dinástica de Castela com Aragão; outra, com pouquíssimos apoios, que suporta Joana e, subsequentemente, a união de Castela com Portugal.

Quando Henrique IV morre em 1474, praticamente ninguém em Castela leva a causa de Joana a sério; somente a Galiza toma voz por Joana e Afonso de Portugal. Ao invés, como rainha, a maior parte dos nobres castelhanos prefere aclamar a tia de Joana, Isabel. Em 1475, dando sequência ao projecto de Henrique IV, Afonso V casa com Joana e, no ano seguinte, invade Castela para defender os seus interesses.

O recontro de ambas as forças é travado em Toro, nas proximidades de Zamora, não longe da fronteira portuguesa. A batalha tem um desfecho militar inconclusivo - embora Afonso V tenha saído vencido, a ala do exército comandada pelo herdeiro português D. João saiu invicta. Não obstante, o desfecho político não é favorável ao monarca português e à sua sobrinha-esposa. Afonso e Joana, depois deste revés, procuraram uma aliança com o rei Luís XI de França (a aranha universal, como foi chamado, conhecido pela forma como habilmente criava intrigas políticas), prometendo Afonso mediar a luta entre o monarca francês e Carlos, o Temerário, duque da Borgonha - primo do rei de Portugal -, a troco do auxílio militar daquele contra o bloco Castela-Aragão.

O rei francês foi protelando até mais não poder o auxílio ao seu congénere português (o que se tornou evidente após a morte do Temerário em Nancy e a incorporação da Borgonha no reino de França, demonstrando assim o fracasso da tentativa de mediação de Afonso V), pelo que este, sentindo-se traído, acaba por abdicar das suas ambições, em seu nome e no da sua esposa (com a qual não chegara sequer a consumar o matrimónio), num tratado assinado em 1479 com os Reis Católicos - o Tratado das Alcáçovas-Toledo, pondo assim fim à guerra de sucessão em Castela (isto para além de se terem definindo ainda os limites para a expansão de ambas as Nações no Atlântico e no Magrebe).

Entretanto o Papa Sisto IV dissolveu o casamento devido à consaguinidade, e os reis católicos procuraram consorciar Joana com o seu filho e herdeiro, João de Aragão. Joana recusou-se casar com o primo - por considerar vexatório para a sua posição de herdeira natural ter que casar com o herdeiro de quem lhe roubara o trono para o poder vir a recuperar no futuro - e retirou-se para um convento em Coimbra.

A princesa viveu em Portugal até à sua morte em 1530; mesmo assim, enquanto foi viva constituiu um empecilho permanente para a coroa de Castela, e um argumento de peso habilmente esgrimido por D. João II na sua política externa com Espanha. Aí radica o título que o Príncipe Perfeito lhe concedeu: A Excelente Senhora. De facto, foi a primeira vez que se usou o título de Sua Excelência em Portugal - já que o uso de infanta seria indecoroso para com a sua pessoa, e o título de rainha não podia ser usado por passível de ser considerado insultuoso no quadro das relações bilaterais com Castela.

Tal epíteto, de resto, viria a justificar-se plenamente, dado a Beltraneja se ter recusado ver-se envolvida em mais manobras políticas, tendo dedicado o resto da vida à devoção a Deus, à prática de obras de caridade e de apoio aos desfavorecidos. De resto, estiveram presentes embaixadores castelhanos na cerimónia dos seus votos solenes - não só porque tal acto constituía uma desistência de quaisquer eventuais pretensões que Joana ainda mantivesse ao trono que, de jure, lhe pertencia (impossibilitando também o aparecimento de qualquer presumível herdeiro que fosse seu lídimo descendente), mas igualmente para testemunhar as formas de tratamento usadas para com a sua pessoa, assegurando-se assim que se cumpria o estabelecido nos acordos das Alcáçovas-Toledo.

Contudo, a rainha, ingressada num convento, assinou sempre, até à sua morte, em 1530, Yo la reina. Os seus restos mortais andam desaparecidos, pelo que se torna impossível determinar, através do ADN, se realmente era filha de Henrique IV ou de Beltrán de la Cueva...

Curiosamente ou não, a primeira filha havida do casamento de Isabel e Fernando após o início do conflito sucessório seria baptizada, precisamente, de Joana. Por acaso do destino, foi esta Joana que sucedeu aos Reis Católicos, sob o nome de Joana I de Castela, a Louca - não deixando o seu numeral espaço para dúvidas: em Castela, o reinado da Beltraneja jamais fora reconhecido.

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  1. RedirecionamentoPredefinição:fim

ca:Joana la Beltraneja de:Johanna von Kastilien (Portugal) en:Joan, Princess of Castile es:Juana la Beltraneja

Precedido por
Isabel de Coimbra
Rainha consorte de Portugal e dos
Algarves daquém e dalém-mar em África

14751481
Sucedido por
Leonor de Viseu
Precedido por
Joana de Portugal
Rainha de Castela, Leão, Toledo, Galiza, Sevilha,
Córdova, Múrcia, Jaén, Algarve, Algeciras e Gibraltar,
Senhora da Biscaia e de Molina

de jure 14741479
Sucedido por
Isabel, a Católica

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