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Jornalismo gonzo: mudanças entre as edições

 
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'''Gonzo''' é um estilo de narrativa em jornalismo, cinematografia ou qualquer outra produção de mídia em que o narrador abandona qualquer pretensão de objetividade e se mistura profundamente com a ação.
{{Jornalismo}}'''Gonzo''' é um estilo de narrativa em jornalismo, cinematografia ou qualquer outra produção de mídia em que o narrador abandona qualquer pretensão de objetividade e se mistura profundamente com a ação.


== Jornalismo Gonzo ==
== Jornalismo gonzo ==
O originador do estilo foi o jornalista [[Estados Unidos|norte-americano]] [[Hunter S. Thompson]]. O termo foi criado por [[Bill Cardoso]], repórter do [[Boston Sunday Globe]], para se referir a um artigo de Thompson. Segundo Cardoso, "gonzo" seria uma gíria [[Irlanda|irlandesa]] do sul de [[Boston]] para designar o último homem de pé após uma maratona de bebedeira.


O originador do estilo foi o jornalista [[estados Unidos da América|americano]] [[Hunter S. Thompson]]. O termo foi cunhado por [[Bill Cardoso]], repórter do [[Boston Sunday Globe]], para se referir a um artigo de [[Hunter S. Thompson|Thompson]]. Segundo [[Bill Cardoso|Cardoso]], "gonzo" seria uma gíria [[Irlanda|irlandesa]] do sul de [[Boston]] para designar o último homem de pé após uma maratona de bebedeira.
O mais famoso texto gonzo é "''Fear and Loathing in Las Vegas''" (literalmente "Medo e asco em Las Vegas", lançado no Brasil em 1984 pela editora Anima como "Las Vegas na Cabeça"), originalmente uma matéria sobre uma corrida no deserto, a Mint 400, encomendada pela revista [[Rolling Stone]]. Thompson gastou todo o dinheiro com drogas, fez enormes dívidas no hotel, destruiu quartos e fugiu sem pagar. Não cobriu o acontecimento e, no lugar da matéria que deveria escrever, descreveu o ambiente sob seu ponto de vista entorpecido e virou o precursor de um novo estilo jornalístico.


O mais famoso texto gonzo é "''Fear and Loathing in Las Vegas''" (literalmente "Medo e Ódio em Las Vegas", lançado no Brasil em 1984 pela editora Anima como "Las Vegas na Cabeça"), originalmente uma matéria sobre uma corrida no deserto, a Mint 400, encomendada a [[Hunter S. Thompson|Thompson]] pela revista [[Rolling Stone]]. [[Hunter S. Thompson|Thompson]] gastou todo o dinheiro com drogas e álcool, fez enormes dívidas no hotel, destruiu quartos e fugiu sem pagar. Não cobriu o acontecimento e, no lugar da matéria que deveria escrever, descreveu o ambiente sob seu ponto de vista entorpecido e virou o precursor de um novo estilo jornalístico.
O '''jornalismo gonzo''' é por muitos nem considerado uma forma de [[jornalismo]], devido à total parcialidade, falta de objetividade e pela não seriedade com que a notícia é tratada, fugindo a todas as regras básicas do jornalismo. O estilo vigora até os dias de hoje e ganha maior número de adeptos entre jovens, que se interessam pela narrativa literária de vivências e descobertas pessoais em situações extremas ou de transgressão. Se o jornalismo gonzo é ou não um modelo jornalístico, se é subjetivo demais ou se não é digno de crédito, são questões que permeiam o ambiente acadêmico.
 
O '''jornalismo gonzo''' é por muitos nem considerado uma forma de [[jornalismo]], devido à total parcialidade, falta de objetividade e pela não seriedade com que a notícia é tratada, fugindo a todas as regras básicas do jornalismo. O estilo vigora até os dias de hoje e ganha maior número de adeptos entre jovens, que se interessam pela narrativa literária de fatos verídicos. Se o jornalismo gonzo é ou não um modelo jornalístico, se é impessoal demais ou se não é digno de crédito, são questões que permeiam o ambiente acadêmico.
 
== Jornalismo Gonzo no Brasil ==
 
2.1. Precursores do jornalismo gonzo no Brasil
 
2.1.1. Memórias de um repórter X
 
Figura lendária do jornalismo português, Reinaldo Ferreira teve, nas primeiras décadas do século passado, lugar de grande evidência. Afirmou-se, fundamentalmente, como repórter. Atraído para o macabro, o fantástico, os labirintos das grandes questões sociais, deu um cunho peculiar à reportagem. Utilizava todas as manhas e expedientes para arrancar a face oculta do cotidiano e revelá-la em primeira mão e de um modo original e audacioso.
 
Era capaz de de se intrometer nos bastidores das conspirações e nas trincheiras de combate; violar o sigilo dos tribunais, das polícias e antecâmeras militares; penetrar na escumalha das prisões, nos gabinetes políticos nos salões das embaixadas e na atmosfera sórdida dos bairros exceêntricos. Uma das suas proezas foi disfarçar-se de mendigo para escrever um inquérito exaustivo sobre a verdadeira e falsa pobreza.
Nasceu em Lisbôa em 11897 e faleceu em 1935. Tinha 37 anos e 22 de profissão. Envolveu-se por completo na droga de que nunca conseguiu se libertar e que o tornou um farrapo humano. Assim como Hunter Thompson era conhecido sob a alcunha de ''Raoul Duke'', Reinaldo Ferreira assumiu o apelido ''Repórter X'' depois uma confusão para se entender sua caligrafia, o que obrigou um tipógrafo a lhe assinar como os textos como ''Repórter X''.
Não se pode atribuir a Reinaldo Ferreira qualquer evidência na história da literatura. Fora os livros e revistas policiais publicados tanto em Portugal como no Brasil, a sua ficção oscila entre a digressão romântica e certo tipo de intenção social. Isso facilitou seu alcance às preocupações e ao gosto de um público determinado.
Uma questão fundamental na vida e obra de Reinaldo Ferreira é esclarecer o que se deve situar antes e depois do consumo permanente da droga. Ele é internado, em finais de 1932, para uma cura de desintoxicação. Meses depois decide confessar a sua morfinomania nas páginas do "Repórter X", dando também à estampa o primeiro volume - e o único que publicou em vida - das "Memórias de um ex-morfinómano", obra que tem a força de um documento humano patético.
 
Mesmo antes do recurso sistemático à toxico-dependência, para se evadir deste drama íntimo e excitar a capacidade de trabalho e o poder de efabulação, Reinaldo Ferreira teve sempre uma tendência para inveterada para transfigurar a objetividade das situações cotidianas.
 
Pouco resta, hoje, desta obra que transgride os códigos deontológicos, que surpreendem em flagrante os conflitos e mistérios da alma humana. As Memórias de Um Ex-Morfinómano são o espelho de uma vida de extremos:
Os episódios melhor gravados no doloroso friso do meu morfinismo relacionam-se com a viagem que realizei, em outubro de 1930, a Londres (...) Azougava-me o entusiasmo profissional pela viagem, mas, com sempre sucede nos toxicómanos que se deslocam, acorvadava-me, num pavor, a ameaça de que pudesse sofrer a falta da droga em terra estranha (...) Em Dover, entro na alfândega. Os aduaneiros ingleses procedem... à inglesa! Antes de vasculharem as bagagens – ou de apalparem os viajantes – apresentam-lhes um quadro onde, em letras garrafais, estão indicados todos os artigos indicados pela lei. Depois perguntam:
– Traz consigo algum desses artigos.
Só depois – revistam as malas e os fatos! Creio que este sistema objectivo agrava a culpa ao desobediente, por tentativa de logro – quando surprrendem o contrabando... Que se visione o que seria a minha aterrorizada angústia ao ler a palavra morfina – encabeçando a lista que o aduaneiro me apresentou fitando-me nos olhos, perscrutando-os, como se suspeitasse de que mentia...
 
Além das suas reportagens, entre as quais se contam fascinantes visões futuristas do Porto e Lisbôa do ano 2000, Reinaldo Ferreira deixou ainda uma quantidade assombrosa de novelas, sobretudo policiais e de espionagem, além de várias peças de teatro.
 
2.2.1. Revista Realidade
 
Trinta e oito anos atrás vivia-se em outro mundo, e o Brasil era um país muito diferente. O homem não havia pisado na Lua. A seleção de futebol não era tricampeã. Os transplantes de coração não existiam, os brasileiros não podiam se divorciar, a Guerra do Vietnã continuava e a Jovem Guarda era a grande revolução da juventude. Sobre todos os pequenos e grandes fatos, pairava no Brasil a sombra de dois anos do governo militar, um esboço ainda leve do regime que sufocou o país por outros 19 anos. Nesse cenário, que prenunciava conquistas inimagináveis e decepções profundas, nasceu a revista Realidade.
 
Em abril de 1966, a primeira edição da revista, com um Pelé real e sorridente na capa, já indicava ser aquela uma publicação que se tranformaria em documento de época. A carta de Victor Civita apresentando o primeiro número era esclarecedora: a revista surgiu porque o Brasil estava crescendo em todos as direções, era um país que se preparava para olhar de frente os seus muitos problemas a fim de analisá-los e procurar solucioná-los.
 
Fatos rendem notícias, mas nem sempre ficam na história. Revistas, também não. Realidade entrou para a história do jornalismo brasileiro porque soube retratar a partir de uma linguagem apropriada a dinâmica do país que mudava. Com suas grandes reportagens, foi a precursora de um jornalismo investigativo, inventivo e exaustivo que lhe rendeu muitos seguidores até os dias de hoje e nos quais este trabalho fundamenta sua análise.
Em um aépoca de censura e hipocrisia, a revista não teve medo de expor temas considerados tabus nos anos 60, fossem a guerra entre estudantes e a polícia, o casamento de padres ou a situação da mulher brasileira. Em janeiro de 1967, uma edição inteira criada seis meses antes, que teve a audácia de discutir sexo, casamento e aborto do ponto de vista feminino, foi apreendida e só liberada 20 meses depois.
O resultado deste trabalho logo se fez sentir: em seis meses, a revista alcançou a maior tiragem do país até então, com 475 mil exemplares e mais de um milhão e meio de leitores por edição. Em seus dez anos de existência, ganhou prêmios, provocou debates, contribuiu para revelar e discutir os grandes problemas que se apresentavam no país – muitos ainda hoje sem solução.
Em março de 1976, dez anos depois de lançada, realidade desapareceu, varrida das bancas por jornais mais ágeis, um novo conceito de revistas semanais e pela aceleração dos acontecimentos e sua cobertura na televisão. Mas a revista permanece como marco, referência para a história recente do país e do jornalismo.
Entre toda a série de reportagens pertinentes ao tema deste texto, a melhor delas é a matéria escrita pelo repórter José Hamilton Ribeiro.
 
Enviado especial de Realidade à Guerra do Vietnã, ele se transformou em mais uma vítima da guerra: pisou em uma mina terrestre e acabou perdendo parte da perna esquerda. O trabalho de reportagem de Hamilton Ribeiro no conflito começou em Saigon, capital do Vietnã do Sul, no dia 6 de março de 1968. – Detalhar com a matéria.
 
No dia 20 (último de sua permanência no país), ele participou de uma patrulha feita pela Companhia Delta, da Primeira Divisão de Cavalaria do Exército Americano. A trilha por onde caminhava era famosa pelas trilhas terrestres e tinha o nome de "Estrada sem Alegria".
 
Ele estava ao lado do fotógrafo Keisaburo Shimamoto, que registrou as imagens publicadas por Realidade, e do soldado americano Henry (destacado para acompanha-lo), quando todos escutaram uma explosão, 20 metros à frente. Correram para ver o que acontecia. Ribeiro descreveu:
Observando a movimentação de todos em direção aos feridos, por um momento me passou pela cabeça a certeza de que o terreno entre a minha posição e a dos feridos, já tão fartamente pisado, não podia ter mais mina nenhuma. Com a máquina em posição de ataque, corri para os feridos, Henry ao meu lado. A cinco metros do local, vejo uma bota com um pé dentro, minando sangue. Penso sem querer pensar:
– Isso é que é pé frio!
 
Ouço uma explosão fantástica. É um tuimmm interminável que me atravessa os ouvidos de um para o outro lado, dá-me uma sensação de grandiosidade. Sinto-me no ar, voando (...) Um segundo após me no chão, sentado. A cortina de fumaça se esgarçou e vi aproximar-se de mim Shimamoto, o fotógrafo japonês. Pergunto-lhe:
– Shima, você está bem?
Sem responder, ele continuou caminhando para mim. Foi aí que senti a perna esquerda. Os músculos repuxaram para a coxa com tal intesidade que eu não me equilibrava sentado. Para não cair, rodopiava sobre mim mesmo, em círculos e aos saltos. Instintivamente, levei as duas mãos para ‘acalmar’ a minha perna esquerda, e foi então que a vi em pedaços.
A reportagem prosseguiu narrando os instantes de dor e os 15 dias de recuperação nos hospitais vietnamitas. José Hamilton Ribeiro deixou o Vietnã em 4 de abril de 1968, depois de viver os "dias mais dolorosos, tristes e infelizes que jamais teria imaginado passar em minha vida".
Em outra reportagem, de junho de 1967, o repórter Milton Coelho e o fotógrafo Geraldo Mori observaram a haitianos. Em seus rostos, viram apenas a desesperança, a resignação e o medo impostos pela ditadura de François Duvalier.
O ditador construiu um império de terror e controla a vida do país nos mínimos detalhes. É ele, pessoalmente, quem autoriza os vistos de saída para quem quer viajar ao exterior, e é ele também quem conduz os interrogatórios dos prisioneiros políticos mais importantes.
Os dois jornalistas brasileiros sentiram na pele a pressão do governo haitiano. Para entrar no país, fingiram ser da revista Quatro Rodas e alegaram fazer uma viagem turística. Mesmo assim, foram seguidos nas ruas pelos homens da VSN (Volontiers de la Securité Nationale), grupo criado quando o exército deixou de merecer a confiança de Duvalier.
 
Apelidados pela população de "tonton macoute" (algo como bicho-papão), esses homens eram um misto de milícia civil, partido político e polícia secreta, uma versão subdesenvolvida das SS nazistas e formavam uma rede de 7 mil pessoas, que extorquiam a população, delatavam e torturavam quem conspirasse contra o governo.
Outras duas reportagens relatam de maneira excepcional fatos que ainda fazem parte do repertório da sociedade brasileira, mesmo depois de trinta anos. Em agosto de 1967, o repórter Roberto Freire e o fotógrafo Geraldo Mori seguiram os passos de meninos de rua na cidade do Recife (PE). Eram crianças entre sete e 15 anos que tentavam sobreviver roubando, se prostituindo, traficando drogas e que passavam as noites debaixo de pontes e estações ferroviárias. Na matéria, os repórteres conheceram Maria e Maurício, que há oito anos tentavam salvar menores abandonados. Para contar a história do casal (de nomes fictícios), a reportagem recuou até janeiro de 1959, quando os dois chegaram a Recife.
 
Como se escrevesse um diário, Freire narrou alguns episódios marcantes do primeiro ano de trabalho dos dois. O casal queria conhecer a realidade das crianças na capital pernambucana e fundar uma sede da OAF (Organização de Auxílio Fraterno), entidade que ajudava prostitutas e mendigos. A maneira de o casal se aproximar dos meninos foi viver como eles. O repórter explicou: "Maria e Maurício passam os dias e parte da noite caminhando pela cidade, vendendo café e doces. O que ganham dá apenas para pequenas refeições. Dormem onde dormem os meninos: nas calçadas debaixo das pontes, nas escadarias de igrejas ou nas estações". Aos poucos, conquistaram a confiança das crianças.
Entre cada capítulo da história do casal em 1959, Roberto Freire intercalou notícias dos jornais de 1967, como esta do Diário de Pernambuco: "Desde o princípio do ano, a Fundação do Bem-Estar do menor fechou a porta dos abrigos do Estado aos meninos abandonados das ruas do Recife, alegando que vai promover melhoramentos, alargar instalações, ampliar os tais abrigos. Mas estamos em junho e a situação continua a mesma, os abrigos não recebem ninguém".
 
Com isso, o repórter mostrou que pouca coisa havia mudado naqueles oito anos e as crianças continuam desamparadas. Por este trabalho, a equipe de Realidade ganhou o prêmio Esso de Reportagem de 1967.
Outubro de 1967. No centro de São Paulo, um casal chama a atenção das pessoas. Ele é um homem negro, ela, uma branca. Estão abraçados. As atitudes de quem observa os dois são sempre iguais. Muitos olham, param, tornam a andar, apontam, cochicham e riem.
Durante cerca de 20 dias, dois jornalistas de Realidade simularam a mesma situação formando casais diferentes. Narciso Kalili, branco, era acompanhado de uma moça negra. Odacir de Mattos, negro, seguia uma branca. Eles visitaram seis capitais do país (Belém, Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre) e fizeram esse e outros testes para demonstrar a existência do preconceito racial. As experiências foram fotografadas por Luigi Mamprin e Geraldo Mori.
Os dois repórteres vivenciaram sempre as mesmas situações, mas para Odacir, ao contrário de Narciso, muitas vezes não havia vagas nos hotéis e escolas, os restaurantes e boates exigiam reservas ou cobravam mais caro do que o normal.
 
A dura verdade que os jornalistas encontraram nas cidades brasileiras já era esperada por eles, mas precisava ser denunciada, como afirmou Narciso Kalili:
Eu sabia que os brancos, por seu lado, sentem-se envergonhados com o preconceito. Não querem mostrar que através de atividades encobertas e disfarçadas eles privam milhões de pessoas de viver como gente. E mais: não querem tocar no problema com medo de que ele se agrave e se transforme em luta aberta. Esses negros e brancos se esquecem, porém, que os problemas não discutidos não se resolvem.
 
2.2. Vertentes do jornalismo gonzo no brasil
2.2.2. Revista O Cruzeiro e Jornal da Tarde
 
Em seu livro intitulado "O que é jornalismo?", Clóvis Rossi questiona a padronização dos textos e a buracratização dos profissionais de Jornalismo. Ele dá exemplos de publicações bem-sucedidas que preferiram deixar margem à criatividade e ao estilo pessoal de seus jornalistas. Nos anos 50, a extinta revista O Cruzeiro chegou a atingir a tiragem de 800 mil exemplares. Tal patamar só foi alcançado nos anos 80 pela revista Veja. Mas, como a população brasileira passou por um boom demográfico no meio-tempo, o recorde de O Cruzeiro continua de pé.
A revista não seguia padrões rígidos, apoiando-se na boa qualidade de seu cortpo de repórteres e fotógrafos. A revista Veja serve como exemplo do extremo oposto. É uma publicação de sucesso, mas segue uma padronização tão rigorosa que procura dar a impressão de que é escrita pela mesma pessoa da primeira à última linha.
Há, portanto, modelos a serem citados, tanto para defender a padronização absoluta como para condená-la absolutamente. mas o êxito alcanado pelo vespertino Jornal da Tarde, na época de seu lançamento, em 1966, traz o fiel da balança para o lado da não-padronização. O JT alcançou picos de tiragem e mantém, até hoje, uma boa vendagem exatamente porque rompeu com as normas de estilo então vigentes.
A redação deu ênfase ao lado humano, procurando, em cada reportagem, enfocar mais os homens e mulheres responsáveis por um determinado acontecimento do que o fato propriamente dito. Nessa busca pelo humano, cometeu alguns pecados graves de informação. Como exemplo, Clóvis Rossi lembra uma experiência que remete diretamente ao clássico gonzo de Hunter S. Thompson, Medo e delírio em Las Vegas: "Certa vez, dedicou-se largo espaço a uma corrida de automóveis, falando do público, dos personagens e do espetáculo, sem informar, entretanto, quem vencera a corrida."
 
2.3. Nova leva de Jornalismo Gonzo no Brasil
2.3.1. Arthur Veríssimo
 
Domingo, 26/9/2004 16h27, Bombaim, Índia
 
Assunto: Bombando Bombaim
 
Renatinha, definitivamente comecei a compreender um pouco mais sobre a figura extraordinária de Ganpati, ou melhor Ganesha. Sua lenda está inserida nos livros sagrados hindus. O que acontece atualmente no mega-festival é algo surpreendente.
 
Estive nesta mesma época no ano passado em Bombaim acompanhando o início do festival. O batuque e celebração rolam durante 10 dias. Existem datas especiais para imersão dos ídolos e estatuas do Ganesh no mar. Ontem acompanhamos um frenesi turbinadíssimo de adoradores e fieis se jogando pelas beiradas do acostamento e soltando a franga nas avenidas.
 
Segundo a rapaziada local o bicho ira pegar literalmente na segunda feira. Ontem foram centenas de pequenos blocos carnavalescos acompanhados por uma banda de percussão. Com estes grupos aparecem sempre uns tipinhos tocando pianola. O resultado é disrítmico e frenético.
 
Nos embrenhamos em uma favela à beira mar. A grande maioria das famílias é de pescadores. O clímax de jogar no mar os ídolos é da mais pura devoção. Continuo a me arrastar pelas quebradas. Tive uma ruptura nos ligamentos do tornozelo direito e deslizo pelas ruas de Bombaim como uma enguia. Uma equipe de curandeiros, doutores, massagistas e palpiteiros ajudam esta criatura a circular com desenvoltura pelos quatro cantos da cidade. Hoje terei um dia cheio com o vovozinho pai-de-santo de Ganesh. Ele sabe tudo sobre o panteão hinduísta e outras religiões.
Fiquei a noite inteira debruçado sobre o livro Adoradores de Ganesh. Os rituais, devoção, mito, lendas, política, reinos e mistérios desta figura mítica. O inacreditável de Bombaim é o contraste dos edifícios góticos-indianos com a publicidade massacrante dos filmes de Bollywood. Você se sente dentro de uma maquete gigantesca.
 
Bombaim é alucinante e sombria.
beijos,
 
Arthur Veríssimo
O expoente do Jornalismo Gonzo no Brasil é Arthur Veríssimo, repórter responsável por pautas como a que conta sua saga ao atravessar o Brasil, de Fortaleza a Porto Alegre de ônibus, sentado ao lado do banheiro, comprovam que vale tudo para garantir ao leitor, momentos inusitados de jornalismo investigativo.O estilo de Arthur pode ser claramente demonstrado na introdução da reportagem "Passageiro da Agonia": "Depois de uma tensa reunião com a equipe da TRIP, novamente a diretoria me lançou numa extenuante roubada. Por um grande vacilo, havia soltado na reunião da revista um "já pensou, uma matéria sobre cruzar o Brasil de ponta a ponta, num busão?". Os olhos dos caciques se alumiaram no ato. Aprovaram a maldita pauta. E quem foi designado?" (Trip n.º 92). Arthur passou dias viajando ao lado do banheiro de um ônibus de linha e contou sua saga para deleite dos leitores da Trip:
Embarcamos num ônibus comum da Viação Penha, que há anos navega nesta rota. A princípio, o Mercedes-Benz estava com cara de limpeza. Mas o pessoal da revista havia armado nova patifaria: nossos assentos se localizavam exatamente ao lado do fedorento banheiro do Penhão. Ainda arranco o escalpo de alguém na TRIP.
Entenda o itinerário: nossa longa viagem duraria 71 horas, com 28 breves paradas. O fascinante da epopéia é que atravessaríamos, após 4.534 quilômetros, nove Estados: Ceará, Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
A "casinha" ao lado de nossas poltronas exalava um odor gambarífero. Claro que o trinco não se encaixava na fechadura, e a porta do lançador de urina e fezes batia incessantemente. Decididos, eu e Carlinhos, capoeirista nativo de Canoa Quebrada de bronzeado amarelo-icterícia, consertamos a porta da jaula na porrada.
De ponta a ponta o ônibus estava empesteado com a catinga de gambá podre. Junto a um grupo de passageiros, interpelei o motorista sobre limpar o pardieiro. Fomos à garagem da empresa, onde descarregaram toda a imundície da rodolatrina. Percebi depois que o problema não era tanto o banheiro – e sim a eca dos próprios passageiros.
Comecei a contar as piadas mais dementes: misturando a famosa trilogia de humor, sexo e inteligência. Um senhor de aparência enigmática era meu principal alvo. Perguntava sobre sua vida sexual, se tomava pilequinhos – e, educadamente, ele só respondia que vivia em paz.
O perigo das rodovias no Brasil lembra minhas experiências em solo indiano. Uma grande roleta-russa: os passageiros estão entregues a Deus, e os motoristas são anjos da guarda. As estradas estragadas com buracos, crateras, desvios e centenas de caminhões e carros com faróis apagados confundem e assustam quem está sentado no trono do busão.
Para as pessoas que despencaram do Ceará com o objetivo de voltar para casa, visitar parentes, encontrar marido, começar vida nova ou retornar para o convento, tudo tinha um significado. Mas Christian [o fotógrafo] e eu experimentávamos outra sensação: a de saber como ilustres anônimos tiram de letra uma jornada de 72 horas de muita resistência. Qual será a próxima roubada trilegal em que a redação vai me colocar?
Um episódio pitoresco do Jornalismo Gonzo no Brasil envolveu repórter e entrevistada, em 1994. O jornalista Alex Solnik, da revista Sexy, fora escalado para entrevistar a então musa televisiva Dóris Giesse. Não houve entrevista. Pelo contrário. Ao entrar no apartamento de Dóris, Solnik lhe deu um beijo na boca e os dois foram parar no chão. O gravador ficou no bolso do paletó. Foram quatro horas de loucuras sexuais, todas narradas com detalhes em primeira pessoa pelo repórter e registradas em fotos:
Fui buscar champanhe na sala, quando voltei ao quarto, ela já estava de calcinha, me esperando. As taças na mão, ela na beira da cama, tira minha camisa, passa a mão pelos pêlos do corpo, (...) Humildemente, ela também desce. Sinto meu pau em sua boca. O encontro é maravilhoso. A boca dela faz tudo o que ele queria. Minha respiração dispara, me reteso todo. (...) Encantada com a cena, Doris exclamou: 'Quero ser fotografadda assim com você!' Não tocamos no gravador naquela noite, embora ele tivesse dormido dentro do paletó. Mas decidimos gravar os próximos encontros. Ninguém ainda tinha feito isso.
A entrevista e a matéria foram publicadas na íntegra pela revista com anuência da própria Dóris Giesse. Ela e o repórter casaram-se logo depois do ocorrido, mas ambos enfrentaram uma espiral descendente em suas carreirias, e terminaram por se separar alguns anos depois.
 
2.3.2. Jornalismo Gonzo invade a Internet
Entretanto, é na Internet que o gonzo jornalismo tem cravado seu espaço. Talvez porque na Internet ninguém vai ditar uma regra, que seja única para todos. Na Internet cabe todo mundo, de qualquer tribo. E não poderia ser diferente com o gonzo, que aceita toda e qualquer pauta, desde que ganhe a atenção do leitor do princípio ao fim.
Os blogs também se tornaram grandes divulgadores do gonzo jornalismo. Espécie de mania entre os internautas (um tanto quanto parte da contracultura, dentro desta democrática teia virtual), os blogs permitem ao usuário publicar tanto diários virtuais quanto matérias jornalísticas específicas, como aconteceu recentemente na cobertura da Invasão norte-americana ao Iraque e nas convenções presidenciais nos Estados Unidos.
 
Com a explosão da Internet em meados da década de 90, diversos escritores e jornalistas começaram a utilizá-la como ferramenta para divulgar idéias e fatos. No Brasil, destacou-se um zine eletrônico chamado "Cardosonline". Criado em 1998 e composto por oito colunistas e colaboradores evetuais, a publicação alcançou um sucesso inesperado para o formato zine. Chegou à marca de 4,5 mil assinantes e mantinha uma periodicidade de duas edições semanais. Em janeiro de 2001, foi publicada a primeira reportagem gonzo no zine, o que começou a despertar o interesse de centenas de internautas.
 
A matéria, intitulada "Vai um 1984 aí?", descreveu um dia na vida do repórter durante a terceira edição do Rock in Rio, evento musical ocorrido na cidade do Rio de Janeiro. Assinado pelo pseudônimo ''Suruba'', o autor relata os absurdos que envolviam toda a atmosfera do lugar, a começar pelo seu próprio estado de saúde:
O sol inicia sua jornada 40 graus. Me escondo nas asas de Nossa Senhora de Copacabana. Assim, tenho mais chance de ver gente, e não crustáceos. Agora, eu sei por que a Globo insiste em chamar o Rio de cidade Maravilhosa. Eles perderam alguma coisa no meio do caminho. Se acomodaram com o papel que lhes foi dado. OK. Nada mal pra uma primeira análise.
Minhas perspectivas não são nada boas. Na fila, com o sol a pino, feirantes atacando de todos os pontos cardeais, Charlie e seus asseclas bebendo caipirinha na piscina do Copa. Com as minhas credenciais de imprensa, claro. Passava das duas horas, e o ácido começara a corroer minhas sinapses como uma fórmula ultraconcentrada de cálcio. No momento em que passo as roletas, me apercebo do mundo melhor: um muro de pessoas propositalmente vitaminadas, trajando shortinhos e camisas apertadas, querem que me torne um deles. Pense neles como uma espécie à parte. Até mesmo os infláveis frenéticos conseguiriam melhores resultados. Envio uma mensagem às minhas pernas, e dois minutos depois estou correndo para minha salvação. Nenhum dos crustáceos tenta me impedir. Sabem que os derrrotarei nem que seja esmigalhado. Lembro-me do segundo propósito dessa expedição: encontrar o que resta da alma brasileira, soterrada nos escombros do cotidiano transnacional.
Abrem minha mochila, mas não encontram meus mais importantes bens. A minha camêra fotográfica e meu suco. Sem eles, não há como seguir adiante. Vocês sabem: máquinas e bebidas alcoólicas são proibidas dentro da cidade do rock. Paradoxalmente, no instante de sua entrada, a você é dado um folder sobre a nova Polaroid com ADESIVOS (nada como tornar esse evento em algo ainda mais efêmero). E não podemos esquecer a cerveja oficial do Rockinrio: Schincariol. Chopp. 500ml. E é só que temos de alcoólico. Cerveja inclemente para um clima idem. As pessoas correm, patéticamente a qualquer sinal daqueles caminhões - pipa. Eu, por acaso, estou no caminho de um deles. De relance, vejo minhas mãos e elas estão fora de foco. Tento com minhas havaianas. Apenas para descobrir que já derreteram. Agora sim, estou fudido. Coloco meu chapéu e tento ver alguma luz à frente. Mas tudo está muito claro.
A partir daí, internautas começaram a difundir e procurar ativamente mais informações sobre o assunto na rede, mostrando, mais uma vez, a mudança da prática e do discurso do fluxo da informação para o jornalismo atual.
 
2.3.3. Irmandade Raoul Duke
 
A Irmandade Raoul Duke foi idéia do Suruba em um daqueles telefonemas de meio-dia que a gente trocava quando estávamos desempregados. Surgiu primeiro como lista de discussão acerca do gonzo journalism e evoluiu para um site que publica escritores metidos a jornalistas (e vice-versa) que gostam de emular um dos mais famosos alter-egos de Thompson. (apud Cardoso)
Em março de 2002, entrou no ar a primeira versão do site de Jornalismo Gonzo brasileiro "Irmandade Raoul Duke". Apesar de ter durado cerca de um ano, a revista ajudou a fomentar de forma inédita o estilo no país. Focada na publicação de reportagens de campo – fato raro em sites de conteúdo exclusivo –, a IRD possuía cerca de 12 repórteres fixos e uma quantidade quase indefinida de colaboradores. Quase dois anos depois de desativada, seus editores (Cardoso e Suruba) ainda recebem perguntas, sugestões e matérias a respeito de Jornalismo Gonzo, que podem ser respondidas a partir do manifesto postado no site:
A Irmandade Raoul Duke reúne escritores, jornalistas e outros vagabundos da mesma estirpe interessados em diversos aspectos do gonzo jornalismo, das técnicas caóticas de reportagem desenvolvidas por Hunter Thompson ao traço nervoso de Ralph Steadman.
Apesar de nos auto-denominarmos uma irmandade de gonzo jornalismo, não somos gonzo jornalistas. O único gonzo jornalista de verdade que já pisou nessa terra foi o próprio Thompson, uma vez que esta é apenas uma denominação que outro jornalista bebum chamado Bill Cardoso deu pro nosso amigo. Sendo assim, limitamo-nos a fazer a nossa interpretação tosca do que seria gonzo e escrever nossas histórias seguindo alguns preceitos que fazem parte da nossa Carta de Princípios, inspirada nas técnicas e na filosfia desenvolvidas por Thompson em sua busca pela verdade.
Um dos mais populares repórteres da IRD é o jornalista André "Cardoso" Czarnobai. Natural de Porto Alegre e formado pela Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação da UFRGS, ele se destacou por sua criação profílica e cheia de maneirismos característicos no Jornalismo Gonzo:
A porta aberta nos catapultou para um universo paralelo. Um imenso placar eletrônico piscando números vermelhos, dezenas de aparelhos de televisão mostrando bolas numeradas, centenas de mesas ocupadas pelos mais diversos tipos de ouvintes do Zambiasi. O pé direito altíssimo, espaço gelado nas cores cremes da parede e numa arquitetura cheia de colunas e firulas. Apesar do meu pequeno conhecimento das artes aplicadas, a palavra "rococó" me veio à cabeça, mas não vamos interferir no barroco.
Eu me sentia em um sonho: todas as sensações eram novas. Meus passos em câmera lenta. Eu pisava em carpetes macios e a voz de aeroporto que anunciava os números ressoava na minha caixa craniana. O conceito de "universo paralelo" era cada vez mais claro. Ninguém notou nossa entrada. Todos permaneciam de cabeça baixa, concentrados em riscar números em suas cartelas. Me distraí com o ambiente por um momento. Meu procurador já havia encontrado uma mesa vaga e estava sentado quando finalmente o encontrei. "Caralho, olha só a cara dessas pessoas", ele disse. "Um bando de drogaditos".
 
2.4. O futuro do Gonzo no Brasil
2.4.1. Viabilidade do Gonzo no Brasil
 
O interesse do público em um jornalismo mais personalista acompanha a visível decadência da fórmula engessada à qual a maioria das redações no Brasil aparenta estar presa. Outro reflexo disso pode ser encontrado na cultura individualista que se abate no imaginário popular ocidental (ou mundial) através da mídia. Em seu livro "Metamorfoses da cultura liberal", o filósofo francês Gilles Lipovetsky explica sobre este cruzamento de tendências da seguinte forma:
O poder da mídia coincide com uma capacidade de imposição de modelos que, por não serem obrigatórios, não deixam de ter menos eficácia. Daí os inúmeros alertas contra as ameaças de conformismo e de despersonalização engendradas pela mídia, cuja influência, para falar como Heidegger, permitiria o desenvolvimento da típica ditadura do 'se', do impessoal. (...) Mesmo se, de fato, a mídia dirige-se a todos, ela não homogeneíza o corpo social mais do que a escola, sendo que os gostos e práticas continuam amplamente determinados pelas culturas de classe e pelas lutas travadas em nome da aquisição de sinais de distinção.
 
À mitologia da massa indiferenciada, é preciso opor os estilos de vida, classificados e classificadores, os diferentes habitus, as lutas simbólicas entre as classes. Essas críticas têm seus fundamentos, embora não cheguem a penetrar no essencial das práticas da mídia em nossas sociedades democráticas, ou seja, no que se refere à contribuição da mídia para o advento histórico de uma novoa cultura individualista. (...) Os meios de comunicação contribuem para a multiplicação dos valores de referência, para liberar os indivíduos da fidelidade a partidos políticos e igrejas, emanciapando-os das ideologias monolíticas.
 
Isso não elimina o conformismo nem os clichês, mas os torna menos rígidos, menos firmes, mais rapidamente questionáveis. (...) A mídia destrói as experiências afetivas comuns e o prazer das enormes reuniões (...) Paralelamente à multidão solitária, surgem as novas multidões emocionais pós-modernas, que cabem mal na grade da "sociedade do espetáculo", ou seja, da fabricação da passividade e da separação generalizadas.
 
A partir destas idéias e de outros argumentos postos nos capítulos anteriores em relação à mudança no sistema emissor/receptor ensinado nas faculdades com as novas tecnologias de comunicação, é perfeitamente exeqüível a teoria de que os leitores estão enfastiados do formato narrativo predominante na imprensa brasileira. Apesar da crise financeira do setor, soluções podem e estão sendo procuradas por editores que conseguem se manter a par do que realmente acontece ao seu redor.
 
2.4.2. O caso da Folha de S. Paulo e seu publisher, Otávio Frias Filho
A Folha de S. Paulo tem um novo e temerário manual de redação. Seu diretor Otavio Frias Filho correu o risco de pôr em livro sete reportagens exemplares. Cada uma delas, sozinha em seu capítulo, tem qualidades de sobra para animar o domingo de qualquer jornal do país. A Folha inclusive. Mas, juntas nas 288 páginas de ‘Queda Livre’, elas sacodem quase todas as normas que homogeneizaram, muitas vezes para pior, a imprensa brasileira. A Folha inclusive. (Marcos Sá Corrêa, "Um manual para todas as redações", copyright No mínimo (http://nominimo.ibest.com.br), 14/12/03
Um homem entra na sala e observa casais sentados, trocando carícias. Ao fundo, duas mulheres nuas ao redor de um sujeito e adiante três outras ajoelhadas satisfazem oralmente três homens, enquanto outros olham em roda, como num acidente de trânsito. O livro registra um paradoxo. Por falta de espaço, dinheiro, tempo e também vontade, não haveria mais lugar para o gênero na imprensa brasileira, seja nas revistas, seja nos jornais, como o dirigido pelo autor. Quer dizer, talvez os textos do Otavio escritor não encontrassem lugar no jornal do Otavio diretor de Redação.
O que parece unir os relatos é o medo colocado em teste, mas um medo específico, o de perder o controle.
No texto "Viagem ao Mapiá", Frias Filho relata bem esse temor ao participar de algumas sessões do culto ao Santo Daime:
Eu havia tomado o Santo Daime pela primeira vez no final de maio de 1999, em São Paulo (...) O problema para quem vai experimentar a bebida não se resume a eventuais mirações, que podem assumir feição desagradável e até aterradora, como nos relatos de pessoas que alegam ter assistido a própria morte ou visto entes queridos desfigurados em seus caixões, nem ao risco de que a ayhuasca desencadeie pertirbações de ordem psiquiátricaou faça do neófito um joguete de forças (químicas: psíquicas: espirituais:) fora de seu controle. (...) Quando entramos, o templo já estava repleto de fardados, fiéis que passaram pela cerimônia de iniciação, vindo a integrar o estado-maior da doutrina. Parecia um sabá de bruxos, um encontro de congregados marianos, um congresso da maçonaria, um uma assembléia do sondicato de garçons. Eu me perguntava quem seriam aquelas pessoas.
Neste e em outros momentos autobiográficos – poucos e dispersos pela narrativa – muito como a prosa do próprio Otavio, o leitor descobre que ele tem claustrofobia e acrofobia, pensou em suicídio, é ateu, aos 30 e tantos anos passou por um revés amoroso violento e, adolescente, fez análise. São pequenas revelações, quase deslizes, entremeadas pela experiência em si, que conduz cada uma das sete narrativas, estas embaladas por muito detalhe e informação histórica – a pesquisa é realmente exaustiva. Sai-se de um texto sabendo tudo sobre a invenção do pára-quedas.
Em maio de 2004, Frias Filho foi palestrante no Master em Jornalismo para Editores, no Centro de Extensão Universitária (CEU) da Universidade de Navarra, Espanha, em São Paulo. Em resumo, Frias Filho disse que a imprensa brasileira vive um momento de muitas dificuldades e elas são geradas por problemas econômicos, pela falta de clareza no jornalismo e por uma crise de valores na sociedade.
Para ele, os problemas econômicos geram limitações para o jornalismo de qualidade, que está sendo confrontado com outras formas de informação nas quais notícia e entretenimento se misturam e se confundem. Não tenho dúvida de que jornais de qualidade devem investir em informação, não em entretenimento.
Frias salientou que há uma grande insatisfação em relação ao jornalismo de hoje, que deveria ser mais vivo e mais curioso. Mas, como não é, os nossos jornais são chatos e iguais. "Os jornais correm o risco de se assemelharem demais e existem até pessoas para as quais tanto faz ler um ou outro periódico". O publisher da folha acrescentou que "a pauta tradicional está fatigada". Sobre os manuais de redação, disse que o da Folha passa por uma descompressão.
Dentro da redação do jornal, um repórter se destacou com matérias onde o narrador leva às últimas conseqüências a procura pelas informações. Cláudio Tognolli trabalhou na editoria de Reportagem Especial da FSP e publicou textos como este:
No dia 1º de novembro a reportagem da Folha viajou com os Gaviões a Curitiba, numa caravana de 15 ônibus. O empate sem gols com o Paraná enervou as duas torcidas. Na saída do jogo, por volta das 17h30, o torcedor Carlos Carvalho Jr., o "Alemão", 21, foi cercado por torcedores do Paraná. Queriam arrancar-lhe a camiseta e começaram a atirar garrafas nele.
Os policiais não fizeram nada para protegê-lo, mas quando ele reagiu e acertou uma garrafada no torcedor paranaense, foi detido e levado à delegacia. Os amigos de "Alemão" avisaram ao responsável pelo ônibus 11, da Gaviões, o Paulinho, que o torcedor estava preso, no 6º Distrito Policial, a 10 km do estádio. Paulinho prometeu ir resgatá-lo com o ônibus. "Pode esperar lá que todo mundo nesse ônibus é de minha responsabilidade". "Alemão" ficou preso por cinco horas, acusado de tentativa de homicídio. O ônibus da Gaviões não foi buscá-lo. O torcedor só saiu da cadeia porque a reportagem da Folha se ofereceu para depor a seu favor, relatando que ele não era réu, mas vítima que agiu em defesa própria.
"Alemão" foi abandonado sem dinheiro para voltar a São Paulo. Viajou e jantou com dinheiro emprestado pelo repórter.
Apesar destes exemplos, o caso de Frias Filho não deixa de ser contraditório. A despeito de mostrar um lampejo do que pode ser feito no país, o publisher da Folha de S. Paulo assinou a extinção da editoria de repórteres especiais – à qual o repórter Cláudio Tognolli pertenceu em sua passagem pelo jornal – da redação na última leva demissionária na alameda Barão de Limeira.
 
2.4.3. Carta Capital e o Velho Novo Jornalismo de Gianni Carta
 
Outro bom exemplo desta técnica jornalística em veículos consagrados na imprensa brasileira é o livro Velho novo jornalismo, de Gianni Carta, reunião de 26 reportagens do atual correspondente da revista Carta Capital em Londres. Resultado do trabalho de quatorze anos de correspondência para diferentes veículos entre Europa e Estados Unidos, a obra torna-se um elogio ao estilo jornalístico chamado de novo jornalismo. Carta produziu os textos do livro para as revistas GQ, da Espanha, Maxim, da França e IstoÉ, brasileira. Foi correspondente, ainda, do Diário do Grande ABC, jornal paulista e do The Guardian, periódico inglês.
Além das matérias, o livro traz ainda uma entrevista realizada em 1992 com o escritor baiano Jorge Amado (morto em 2001), realizada no apartamento do escritor em Paris. Várias outras reportagens do livro foram publicadas pela revista Carta Capital, principalmente no tempo em que sua periodicidade era mensal.
A narração elaborada nos textos é rica em detalhes sobre as histórias relatadas. Impressões de temperatura, luzes, aromas e semblantes conferem às matérias a capacidade de informar com uma profundidade, sem que elas percam a clareza jornalística. O estilo de Gianni Carta dá ao leitor informações de um modo que torna mais agradável a leitura, mais compreensível o contexto dos fatos. Estes fatores levam a uma leitura mais interessada, e a uma retenção dos fatos como verdadeira história pelo leitor.
 
Segundo discorre Gianni em seu livro, "escrever na primeira pessoa não é (ou não deveria ser) um ato de vaidade: é, muitas vezes, a única maneira de escrever para escapar das garras do jornalismo que não toma partido e, talvez ainda mais importante, o melhor atalho para se soltar". A bagagem necessária antes de escrever cada artigo pode dependendo do caso, ser importante para a grande reportagem, ou perfil. Já na crônica espontânea, você não precisa se munir de informações antes de investigar. Um exemplo dessa teoria no livro está no capítulo "Artistas e Marqueteiros". O jornalista vai a Panzano um vilarejo na Toscana, Itália, para entrevistar o rei da bisteca, dario Cecchini, sabendo muito pouco sobre ele.
 
Entretanto, antes de escrever a maioria dos artigos do livro, leu artigos e livros sobre os temas em questão e consultou diversas fontes. Para o jornalista, seu estilo evoluiu rapidamente depois que foi morar em Londres, Inglaterra. Ele considera, por exemplo, o novo jornalismo britânico superior ao americano em três aspectos:
(...) primeiro, a visão que o jornalista britânico tem do mundo é mais ampla; segundo, o inglês escreve levando em conta sua tradição literária – com senso de humor. Aqui, ser witty (espirituoso) é tão fundamental quanto ler Baudelaire na França; terceiro, o jornalista britânico tem um compromisso moral com a informação. Por tabela, a investigação aqui é levada a sério. E apurada ad nauseam por uma simples razão: o leitor vem em primeiro lugar.
Como correspondente especial da GQ espanhola, Gianni produziu durante sete anos reportagens nas quais era apresentado aos leitores como ''nosso intrépido correspondente'' – o que dá uma idéia das situações em que se metia. Para fazer a matéria ''Do pó ao pó'', foi parar em Huila, na Colômbia:
(...) O som ensurdecedor dos motores força o major Clavijo a gritar suas últimas instruções:'Não sabemos se vamos regressar. Caso nos atinjam e pousemos em território ocupado pelos guerrilheiros, vocês terão que seguir minhas ordens..' Carlos Linares, o fotógrafo incumbido de fazer as imagens da fumigação de papoula, (...) jocosamente abre os braços para me dar um abraço de consolo. Em poucos minutos, estaríamos sob a mira das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
(...) Eu acordava na calada da noite em meu hotel com o som da geladeira, convencido de que as metralhadoras matraqueavam na rua. (...) Começamos a descer o El Cartucho. Linares e eu estamos cercados por cinco policiais, todos armados com metralhadoras. O cenário é assustador. Vejo gente prostrada nas calçadas, envoltas em mantas imundas; (...) Em seus olhos detecto uma mistura de raiva e delírio. (...) Percebo um grupo, a uns 50 metros de distância, nos apontando e falando alto. Um deles abaixa-se, pega uma pedra...Não vi mais nada. Corremos todos uns três quarteirões e só paramos quando nos encontramos fora do El Cartucho. Ainda Ofegante, perguntei a um dos policiais: – Você não tem medo? "Quem não tem?", respondeu ele."
Um fato curioso é que Carta assume outras formas de inspiração além das conhecidas influências americanas. Cita diários e colunistas italianos e ingleses que ainda acreditam na grande reportagem.
Eles escrevem como nos velhos tempos. Recheiam páginas com imagens, impressões, análises. Todos nós queremos saber como o enviado especial enxerga quadros que, para nós, de fora, parecem bastante abstratos. Gostaríamos, por exemplo, de entender como vive uma família nos subúrbios da moscou pós-União Soviética. Nesses dias de globalização, em que a CNN, assim como o diário USA Today, contam tudo em três minutos ou linhas, a grande reportagem européia é um grande alívio.
Na revista de seu pai, Mino Carta, destaca-se uma sessão dedicada a textos escritos no estilo estudado. Em toda edição, é publicada uma matéria nas duas primeiras páginas da revista que traça minúcias que não costumam ser utilizadas nos manuais de redação. O redator-chefe, Bob Fernandes, registrou a cobertura de diversos jornalistas esportivos durante a partida entre Brasil e Inglaterra, válida pelas quartas de final da Copa do Mundo da Coréia do Sul e Japão, em 2002. O repórter registra as opiniões e reações dos comentaristas - sem suprimir a sua - em um estúdio improvisado no hotel Alphaville, em São Paulo:
Fábio Kadow, desta Carta Capital, sonha:
- Três a dois para o Brasil, sofrido.
Kajuru revela:
- O Juca Kfouri apostou comigo, uma caixa de vinho, na Inglaterra.
Este que vos escreve também cruzou algum na Inglaterra, velha quizila de torcedores fanáticos. Com uma vantagem adicional, caso venha a derrota, pelo menos se leva um troco para afogar as mágoas.
(...)
No estúdio não se ouve a Galvão Bueno. Imagem na tela e a voz de Kleuber Santos. Sofre-se muito menos, é possível afirmar. Mesmo com o delay. (...) Sufoco. Mas aqui no estúdio, euforia. Eu soube antes. O delay me contou. Seis da manhã. O Brasil vence. a Inglaterra e está na semifinal.
P.S: Cento e cinqüenta pilas a pagas por duas apostas. Nunca uma dívida foi paga com tanta alegria.
 
== Outros Escritores ==


== Outros escritores ==
O jornalismo gonzo pode ser considerado uma extensão do [[New Journalism]] de [[Tom Wolfe]], [[Lester Bangs]], e [[George Plimpton]]. Outros escritores que poderiam ser classificados como gonzo são [[P. J. O'Rourke]] e [[Timothy Edward Jones]]. [[Kurt Vonnegut]] pode ser considerado uma espécie de precursor do estilo.
O jornalismo gonzo pode ser considerado uma extensão do [[New Journalism]] de [[Tom Wolfe]], [[Lester Bangs]], e [[George Plimpton]]. Outros escritores que poderiam ser classificados como gonzo são [[P. J. O'Rourke]] e [[Timothy Edward Jones]]. [[Kurt Vonnegut]] pode ser considerado uma espécie de precursor do estilo.


== Livros e Filmes ==
No Brasil, um dos pioneiros escribas a se aventurar no gênero Gonzo foi o jornalista Arthur Veríssimo, repórter da [[Revista Trip]] e, mais tarde, no Jornalismo de Estrada criado pelo jornalista mineiro Bernardo Biagioni. Outros experimentos Gonzo podem ser atualmente encontrados em matérias publicadas em revistas como a [http://www.codigonoize.com.br Código Nóize], a [[Void]] e na edição nacional da [[Vice]], entre outras, como a publicação ''underground'' e independente Tarja Preta.  
 
As matérias de [[Hunter S. Thompson|Thompson]] viraram livros, que se tornaram ''best-sellers'' na categoria; e até filmes: "Where the Buffalo Roam", dirigido por [[Art Linson]] em 1980, com [[Bill Murray]] no papel de [[Hunter S. Thompson|Thompson]]; e '' Fear and Loathing in Las Vegas'' (lançado no Brasil como "Medo e Delírio"), dirigido por [[Terry Gilliam]] em 1998, com [[Johnny Depp]] no papel de [[Hunter S. Thompson|Thompson]] e [[Benicio del Toro]] como seu [[Oscar Zeta Acosta| advogado]]; além de um documentário feito para a TV em 1978, "Fear and Loathing in Gonzovision".
 
== Pornografia ==
 
Apesar de não ter nenhuma conexão com [[Hunter S. Thompson|Thompson]], "Pornografia Gonzo" é o termo usado para denotar o estilo aonde uma única pessoa faz os papéis de diretor, operador de câmera e ator, mostrando a relação sexual do modo como ela acontece, sem cortes nem edição. [[Buttman]] e [[Max Hardcore]] são os dois mais famosos expoentes deste estilo.
 
== Ligações Externas ==


[http://imdb.com/title/tt0081748/?fr=c2l0ZT1kZnxteD0yMHxsbT01MDB8dHQ9b258ZmI9dXxwbj0wfHE9d2hlcmUgdGhlIGJ1ZmZhbG8gcm9hbXxodG1sPTF8bm09b24_;fc=1;ft=20;fm=1| IMDB - Where The Buffalo Roam]
Outro adepto do estilo é o jornalista gaúcho e professor doutor em Comunicação Social, Eduardo Ritter, que lançou o livro "Jornalismo Gonzo: medo, delírio, mentiras sinceras e outras verdades" (1ª edição - 2018), que traz à tona toda sinceridade, mostrando como Hunter Thompson fez uso de sua parresía (fala franca) no jornalismo.


[http://imdb.com/title/tt0120669/?fr=c2l0ZT1kZnxteD0yMHxsbT01MDB8dHQ9b258ZmI9dXxwbj0wfHE9ZmVhciBsb2F0aGluZ3xodG1sPTF8bm09b24_;fc=1;ft=21;fm=1| IMDB - Fear and Loathing in Las Vegas]
== Livros e filmes ==
As matérias de [[Hunter S. Thompson|Thompson]] viraram livros, que se tornaram ''best-sellers'' na categoria; e até filmes: "Where the Buffalo Roam", dirigido por [[Art Linson]] em 1980, com [[Bill Murray]] no papel de Thompson; e '' [[Fear and Loathing in Las Vegas]]'' (lançado no Brasil como "Medo e Delírio"), dirigido por [[Terry Gilliam]] em 1998, com [[Johnny Depp]] no papel de Thompson e [[Benicio del Toro]] como seu [[Oscar Zeta Acosta|advogado]]; além de um documentário feito para a TV em 1978, "Fear and Loathing in Gonzovision".


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==Ver também==
*[[Tabloide]]s
*[[Transmetropolitan]]


[http://www.gonzo.org Gonzo.org]
== Ligações externas ==
 
*[http://imdb.com/title/tt0081748/?fr=c2l0ZT1kZnxteD0yMHxsbT01MDB8dHQ9b258ZmI9dXxwbj0wfHE9d2hlcmUgdGhlIGJ1ZmZhbG8gcm9hbXxodG1sPTF8bm09b24_;fc=1;ft=20;fm=1 IMDb - Where The Buffalo Roam]
 
*[http://imdb.com/title/tt0120669/?fr=c2l0ZT1kZnxteD0yMHxsbT01MDB8dHQ9b258ZmI9dXxwbj0wfHE9ZmVhciBsb2F0aGluZ3xodG1sPTF8bm09b24_;fc=1;ft=21;fm=1 IMDb - Fear and Loathing in Las Vegas]
===Veja também===
*[http://imdb.com/title/tt0362635/?fr=c2l0ZT1kZnxteD0yMHxsbT01MDB8dHQ9b258ZmI9dXxwbj0wfHE9ZmVhciBsb2F0aGluZ3xodG1sPTF8bm09b24_;fc=2;ft=21;fm=1 IMDb - Fear and Loathing in Gonzovision]
 
*[http://www.gonzo.org Gonzo.org]
*[[Tablóide]]s
*[http://www.omelete.com.br/games/hunter-s-thompson-e-o-jornalismo-gonzo/ Artigo no Omelete sobre Hunter Thompson]


[[Categoria:Jornalismo]]
[[Categoria:Jornalismo]]
 
[[Categoria:Contracultura]]
[[de:Gonzo-Journalismus]]
[[en:Gonzo journalism]]
[[fr:Journalisme gonzo]]
[[sv:Gonzojournalistik]]

Edição atual tal como às 13h14min de 17 de junho de 2020

Predefinição:Sem notas Predefinição:Sidebar with collapsible listsGonzo é um estilo de narrativa em jornalismo, cinematografia ou qualquer outra produção de mídia em que o narrador abandona qualquer pretensão de objetividade e se mistura profundamente com a ação.

Jornalismo gonzo

O originador do estilo foi o jornalista norte-americano Hunter S. Thompson. O termo foi criado por Bill Cardoso, repórter do Boston Sunday Globe, para se referir a um artigo de Thompson. Segundo Cardoso, "gonzo" seria uma gíria irlandesa do sul de Boston para designar o último homem de pé após uma maratona de bebedeira.

O mais famoso texto gonzo é "Fear and Loathing in Las Vegas" (literalmente "Medo e asco em Las Vegas", lançado no Brasil em 1984 pela editora Anima como "Las Vegas na Cabeça"), originalmente uma matéria sobre uma corrida no deserto, a Mint 400, encomendada pela revista Rolling Stone. Thompson gastou todo o dinheiro com drogas, fez enormes dívidas no hotel, destruiu quartos e fugiu sem pagar. Não cobriu o acontecimento e, no lugar da matéria que deveria escrever, descreveu o ambiente sob seu ponto de vista entorpecido e virou o precursor de um novo estilo jornalístico.

O jornalismo gonzo é por muitos nem considerado uma forma de jornalismo, devido à total parcialidade, falta de objetividade e pela não seriedade com que a notícia é tratada, fugindo a todas as regras básicas do jornalismo. O estilo vigora até os dias de hoje e ganha maior número de adeptos entre jovens, que se interessam pela narrativa literária de vivências e descobertas pessoais em situações extremas ou de transgressão. Se o jornalismo gonzo é ou não um modelo jornalístico, se é subjetivo demais ou se não é digno de crédito, são questões que permeiam o ambiente acadêmico.

Outros escritores

O jornalismo gonzo pode ser considerado uma extensão do New Journalism de Tom Wolfe, Lester Bangs, e George Plimpton. Outros escritores que poderiam ser classificados como gonzo são P. J. O'Rourke e Timothy Edward Jones. Kurt Vonnegut pode ser considerado uma espécie de precursor do estilo.

No Brasil, um dos pioneiros escribas a se aventurar no gênero Gonzo foi o jornalista Arthur Veríssimo, repórter da Revista Trip e, mais tarde, no Jornalismo de Estrada criado pelo jornalista mineiro Bernardo Biagioni. Outros experimentos Gonzo podem ser atualmente encontrados em matérias publicadas em revistas como a Código Nóize, a Void e na edição nacional da Vice, entre outras, como a publicação underground e independente Tarja Preta.

Outro adepto do estilo é o jornalista gaúcho e professor doutor em Comunicação Social, Eduardo Ritter, que lançou o livro "Jornalismo Gonzo: medo, delírio, mentiras sinceras e outras verdades" (1ª edição - 2018), que traz à tona toda sinceridade, mostrando como Hunter Thompson fez uso de sua parresía (fala franca) no jornalismo.

Livros e filmes

As matérias de Thompson viraram livros, que se tornaram best-sellers na categoria; e até filmes: "Where the Buffalo Roam", dirigido por Art Linson em 1980, com Bill Murray no papel de Thompson; e Fear and Loathing in Las Vegas (lançado no Brasil como "Medo e Delírio"), dirigido por Terry Gilliam em 1998, com Johnny Depp no papel de Thompson e Benicio del Toro como seu advogado; além de um documentário feito para a TV em 1978, "Fear and Loathing in Gonzovision".

Ver também

Ligações externas

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