Durante a Revolução Francesa, o Período do Terror, ou O Terror, ou Reinado de Terror, ou Reino de Terror ou Período dos Jacobinos, foi um momento da história da França compreendido entre 5 de setembro de 1793 (queda dos girondinos) e 27 de julho de 1794 (prisão de Maximilien de Robespierre, ex-líder dos Jacobinos que foi um precursor da ideia de um Terrorismo de Estado nos séculos posteriores).[1] Entre junho de 1793 e julho de 1794, cerca de 16 594 pessoas foram executadas durante o Reinado de Terror na França, sendo 2 639 mortes só em Paris.[2] Apesar disso, há um consenso de que o número é muito maior, com cerca de 10 mil mortes que ocorreram sem julgamentos ou em prisões.[3]
Inicialmente, o Terror, que era voltado principalmente aos realistas e aos girondinos tornou-se uma perseguição geral a todos os "inimigos" da Revolução, inclusive alguns elementos jacobinos e revolucionários, como Danton.[4] O Comitê de Salvação Pública era o órgão que conduzia a política do terror; sua figura de maior destaque foi Robespierre. Após a instituição da Convenção, o governo, precisando do apoio das massas populares (os sans-culottes) promulgou diversas leis que visavam consolidar a Revolução. Houve resistência interna contra essas leis, que se somava à pressão externa das potências europeias contra a França.
O Terror terminou com o golpe de 9 de Termidor em 27 de julho de 1794, que desalojou Robespierre do cargo de presidente do Comitê de Salvação Pública e no dia seguinte, Robespierre, Saint-Just e mais de uma centena de jacobinos foram executados na guilhotina.
Antecedentes
Entre os anos de 1789 e 1791, a Assembleia Constituinte se dedicou à formulação da nova Constituição, que decretou o fim do Antigo Regime. Porém ,este foi um processo muito delicado, por conta das diferentes facções políticas que surgiram no processo revolucionário - aristocratas, monarquistas e patriotas - e a dificuldade de incorporar os interesses de cada uma. Ainda nesse período, também foram elaboradas a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão e a Constituição Civil do Clero, que incorporava o clero às carreiras de estado e retirava parte dos seus privilégios.
A divergência de ideias entre os revolucionários e a Corte era muito grande, situação agravada pela resistência da monarquia em colaborar com os legisladores. Em 1791 ocorreu o chamado “Fuzilamento do Campo de Marte”, onde apoiadores da deposição do rei Luís XVI foram atacados e fuzilados pela Guarda Nacional. Antes mesmo disso, já eram comuns os levantes das classes populares urbanas e dos camponeses em apoio aos revolucionários e cresceu a ameaça de intervenção externa, com o objetivo de acabar com a Revolução. A tentativa de fuga do rei em junho de 1791, seguida do assalto ao palácio de Tulherias em 10 de agosto de 1792, levaram ao julgamento de Luís XVI e à extinção da monarquia francesa.[5]
Primeira República
Assim teve início a Primeira República e logo foi convocada a Convenção Nacional eleita por voto universal masculino. Esse governo é marcado pela instabilidade, pelos conflitos entre Girondinos e Jacobinos - que disputavam o poder - e pela intervenção constante das massas populares parisienses nas disputas parlamentares.
Por fim, o aumento dos conflitos externos e internos - como a Guerra Civil da Vendéia em 1793, motivada pelo recrutamento em massa da população[6] – o confisco do patrimônio do clero, o uso generalizado do papel moeda e a pressão dos sans-culottes culminam numa grave crise que levou às medidas radicais tomadas pelo Terror.[5]
As influências do terror
Uma das marcas do terror é o aumento da violência institucional, violência esta utilizada para a repreensão e controle das forças contrarrevolucionárias. A repressão generalizada e a limitação dos direitos individuais era certamente contrária aos princípios iluministas da Revolução.
Teoria do Governo Revolucionário
Para compreender melhor a institucionalização do terror, pode-se recorrer à Teoria do Governo Revolucionário de Robespierre. Maximilien de Robespierre foi um dos mais influentes jacobinos no governo revolucionário, em 25 de Dezembro de 1793 ele expôs à Convenção os princípios que determinavam que a função fundamental do governo revolucionário era a fundação da república. Considerado o grande líder do Terror, comandava o Comitê da Salvação Pública, além de ser um dos criadores do Clube Jacobino. Robespierre acreditava que o governo revolucionário deveria consolidar um ideal de República, rejeitando a ideia de que o terror era um poder ditatorial, pois sua origem era o povo.
Após a criação e estabilização do novo regime, seria a função do governo constitucional conservá-lo. Robespierre afirmava ainda que o governo revolucionário deveria a todos os bons cidadãos a proteção e a morte aos inimigos do povo. Nessa perspectiva, a instituição do terror se fazia necessária para a proteção da república, da revolução e das conquistas iluministas que surgiriam delas.
O regime revolucionário sob o Terror
O terror teve início com a invasão dos Sans-Culottes à Convenção Nacional em 1793 e com a expulsão dos Girondinos. A partir desse ponto, os Jacobinos tomaram o poder, com o apoio dos Sans-Culottes.
Por medo da violência anárquica, como ocorreu nos massacres de setembro de 1792, os jacobinos tentaram criar formas de burocratizar e tornar institucional o Terror, centralizando-o nas mãos do governo. O radicalismo do Terror era organizado legalmente e oficializado por meio de leis. As principais sendo a Lei dos Suspeitos (17 de setembro de 1793) - que permitia uma longa lista de enquadramento de suspeitos de oposição e facilitava as suas prisões - e a Lei de 22 de Prairial - que inaugura o “Grande Terror” (ápice da violência terrorista), e que tornou os procedimentos jurídicos mais rápidos, por conta da quantidade de presos, resultando em julgamentos sumários e execuções frequentes.[7]
Ainda nesse sentido, foi criado o Tribunal Revolucionário, onde ocorriam os julgamentos dos presos e suspeitos de crime político. Tem-se também a criação do Comitê da Salvação Pública, que como o nome já diz, tinha o objetivo de “salvar” a República – das guerras e dos problemas internos do país - e, por isso, dispunham de poderes plenos, sendo passíveis de autoritarismo.
Lei do Maximum Géneral
Além das questões militares e da repressão política, algumas reformas econômicas foram postas em prática durante o terror, como foi o caso da Lei do Maximum Général, uma demanda dos Sans-culottes para enfrentar a inflação e a escassez de alimentos. Em outubro de 1793, o governo se declarou revolucionário até a paz. Tal decisão significava que a convenção não mediria esforços para enfrentar as ameaças internas e externas que se projetavam contra a república francesa, inclusive estabelecendo controles de preços e de salários e combatendo a especulação e o açambarcamento de grãos.
Constituição de 1793
Um dos maiores legados do governo revolucionário foi a votação da Constituição de 1793. Essa constituição dava continuidade às demandas humanistas da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, e ampliava seu alcance sobre as áreas sociais. Além de garantias no campo econômico, com planos de facilitar o acesso à pequena propriedade para todos os franceses, sacramentava o sufrágio masculino universal e o direito do povo à insurreição.
Descristianização
No ano II, já sob o regime do Terror, Hébert, um dos líderes do Comitê de Salvação Pública, iniciou um movimento de descristianização do país, com a destruição de igrejas e o estímulo à perseguição dos sacerdotes que não haviam jurado a constituição (os refratários). Contudo, o próprio Robespierre era contrário ao movimento e o via como potencialmente perigoso, sendo um dos motivos para a posterior repressão aos Herbertistas. Para Robespierre a existência de uma divindade significava o triunfo da virtude,[8] logo, como era a virtude que justificava o Terror, o ateísmo poderia desqualificar o sentido das ações do governo revolucionário.
Figuras Importantes
Algumas personalidades são essenciais para compreender a mentalidade e o contexto no qual o terror se instalou na França. Dentre tantos, pode-se destacar dois: Jacques-René Hébert e Saint-Just. Ideologicamente, Hébert se posicionava à esquerda e defendia uma maior radicalização da Revolução, seus seguidores ficaram conhecido como hebertistas, e foi uma das vozes principais na defesa do movimento de descristianização. Hébert eram o apoiador ativo do terror, porém, sua influência sobre os sans-culottes de Paris o colocou em rota de colisão contra o governo Revolucionário. Temendo sua força de mobilização popular, a convenção o condenou, juntamente com vários de seus partidários, à guilhotina.[9] Saint-Just, por sua vez, foi um jovem político e escritor que assim como Robespierre defendia a diferenciação entre a ordem revolucionária e a ordem constitucional. Saint-Just foi um dos mais importantes teóricos da revolução francesa. Muito próximo de Robespierre, trabalhou para a queda da gironda e dos hebertistas.
O fim do Terror
9 de Termidor
O fim do Terror sucede com a desmobilização do movimento popular de Paris, enfraquecido com os expurgos dos Herbertistas e com a crescente resistência na própria Convenção ao poder pessoal de Robespierre e de sua facção. Ao mesmo tempo, as vitórias militares, nos fronts interno e externo afastaram os riscos de uma vitória da contrarrevolução.[10] Em 9 de Termidor, 27 de julho de 1794, a Convenção tramou contra Robespierre e seus apoiadores, que foram presos e guilhotinados. Houve, ainda, uma tentativa mal-sucedida de insurreição para resgatar Robespierre. Nos meses seguintes, as instituições e as leis terroristas foram encerradas, os comitês de vigilância foram desmanchados e o Clube dos Jacobinos fechado.
Vítimas do Terror
Há uma certa discordância quanto ao número exato de mortes produzidas pelo terror revolucionário, mas é possível perceber um consenso em suas aproximações. As execuções judiciais, lavradas pelo Tribunal Revolucionário, foram 10 mil.[11] Esse número não engloba as mortes “não oficiais”, que aconteceram nas prisões, pela lotação e por doenças, ou as execuções sumárias que aconteceram nas guerras e revoltas. A maior parte dessas vítimas eram camponeses, que muitas vezes se revoltaram contra a Revolução, como é o caso da Guerra Civil de Vendéia, onde foram massacrados; estima-se que pelo menos 128 mil pessoas morreram nessa guerra[11]. Outros grupos também sofreram com a repressão do terror, como os padres refratários que não aceitavam a nova constituição, os nobres, além dos próprios revolucionários, de diferentes facções, que foram engolidos pela luta fratricida. Milhares de pessoas emigraram do país e muitas mais sofreram com a destruição de cultivos e de propriedades produzida pela invasão estrangeira e pela guerra civil.
Posterior
Após o 9 de Termidor, foi realizada toda uma reestruturação do governo. A população pobre urbana foi quem mais sofreu com isso, por conta da desvalorização dos assignats (o papel da revolução) e da fome. Porém, com a volta da moeda metálica há uma queda inflacionária e por consequência a queda dos preços.[8]
O movimento sans-culotte foi sistematicamente reprimido, os Jacobinos não se fizeram mais presentes no governo e os levantes populares contra a reação termidoriana foram derrotados. O crescimento do movimento monarquista, principalmente da Juventude Dourada, estimulou o fenômeno do Terror Branco, entre dezembro de 1794 até o final 1795, com a perseguição aos antigos militantes Jacobinos.
Ver também
- Culto da Razão
- Revolução Francesa
- Iluminismo
- Calendário revolucionário francês
- Guilhotina
- Comuna de Paris
- Sans-culottes
- Assembleia dos Estados Gerais
- Consulado (Revolução Francesa)
- Montanha (Revolução Francesa)
- Girondino
- Constituição Civil do Clero
- Controvérsia da Revolução
- Primeira República Francesa
Bibliografias
- Vovelle, Michel. A Revolução Francesa explicada à minha neta. São Paulo: UNESP, 2007.
- Vovelle, Michel. A Revolução Francesa (1789-1799). São Paulo: UNESP, 2019.
- HOBBSBAWN, Eric (1996). A Revolução Francesa. Rio de Janeiro: Paz e terra, 2008.
- Richard J. Evans. In Defence of History (Granta Books, 2000).
- Greer, Donald (1935). The incidence of the terror during the French Revolution.
Referências
- ↑ Isis jihadis aren’t medieval – they are shaped by modern western philosophy
- ↑ Linton, Marisa. «The Terror in the French Revolution» (PDF). Kingston University. Consultado em 28 de fevereiro de 2019. Arquivado do original (PDF) em 17 de janeiro de 2012
- ↑ «Reign of Terror | History, Significance, & Facts». Encyclopedia Britannica (em English). Consultado em 21 de agosto de 2020
- ↑ Richard J. Evans, In Defence of History (Granta Books, 2000) p245
- ↑ 5,0 5,1 VOVELLE, Michel (2012). A Revolução Francesa (1789-1799). São Paulo: UNESP. p. 177
- ↑ «Reign of Terror | History, Significance, & Facts». Encyclopedia Britannica (em English). Consultado em 3 de fevereiro de 2021
- ↑ LINTON, Marisa. The Terror in the French Revolution. UK: Kingston University
- ↑ 8,0 8,1 Vovelle, Michell (2007). A Revolução Francesa explicada à minha neta. [S.l.: s.n.]
- ↑ SOBOUL, Herbert (1981). História da Revolução Francesa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. p. 324-330
- ↑ SOBOUL, Albert (1981). História da Revolução Francesa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. p. 356-358
- ↑ 11,0 11,1 Vovelle, Michel (2012). A Revolução Francesa. São Paulo: Unesp. p. 47