Prevenção quaternária é o conjunto de ações que visam evitar danos associada às intervenções médicas e de outros profissionais da saúde como excesso de medicação ou cirurgias desnecessárias (iatrogenias).[1] Assim, quando o tratamento for considerado pior que a doença, deve-se buscar uma alternativa a esse tratamento.[2]
A prevenção quaternária deve prevalecer em qualquer outra opção preventiva, diagnóstico e terapêutica, segundo o princípio hipocrático:primun non nocere (em primeiro lugar, não prejudicar [o paciente]).[3]
Conceito
Ideia principal: evitar o sobrediagnóstico e o sobretratamento dos pacientes.
Objectivo: diminuir a incidência da iatrogenia.
Aplicação: durante todo o episódio de prestação de cuidados (período pré-clínico e clínico).
A Prevenção Quaternária define-se como o conjunto de ações que se desenvolvem visando a «identificação de pacientes em risco de sobremedicalização, com o fim de os proteger de novas intervenções médicas inapropriadas e de lhes sugerir alternativas eticamente aceitáveis». Conceito cunhado pelo Clínico Geral/Médico de Família belga Marc Jamoulle[4][5] e recolhido no Dicionário de Medicina General e Familiar da WONCA.[6]
Praticar a prevenção quaternária significa dizer “não” a muitas propostas francamente inaceitáveis, e oferecer alternativas prudentes e científicas (a ética da negação, e a ética da partilha da ignorância). Fazer prevenção quaternária é trocar o medo explorado pela malícia em saúde pelo bem estar de saber que o importante é a qualidade de vida.[7]
A prevenção quaternária não intenta eliminar, mas apenas temperar a medicalização da vida diária, pois uma parte dessa medicalização é estranha ao acto médico e possui profundas razões sociais, culturais e psicológicas. A prevenção quaternária trata apenas de evitar ou atenuar os aspectos médicos da medicalização da vida diária.
Fazer prevenção quaternária na consulta significa cumprir o objectivo científico da Medicina, que busca “a máxima qualidade com a mínima quantidade, de uma forma tão próxima do paciente quanto possível”.
"Mais vale prevenir que remediar (curar) – quando prevenir faz menos mal do que curar". Evitar as actividades curativas e preventivas desnecessárias é fazer prevenção quaternária. Dever-se-á introduzir a prevenção quaternária em todos os encontros médico-paciente, para evitar/limitar os danos causados pela própria actividade do sistema de saúde. Fazê-lo é reerguer o velho principio primum non nocere.[8]
Outros níveis de prevenção
Formas de prevenção[3] | Ponto de vista do médico | |||
Doença | ||||
ausência | presença | |||
---|---|---|---|---|
Ponto de vista do paciente |
Sintomas | ausência | Prevenção primária (sem sintomas sem doença) |
Prevenção secundária (sem sintomas com doença) |
presença | 'Prevenção quaternária' (com sintomas sem doença) |
Prevenção terciária (com sintomas com doença) |
- Primordial: Estreitamente associada às doenças crónico-degenerativas, visa evitar a emergência e o estabelecimento de estilos de vida que se sabem contribuir para um risco acrescido de doença
- Primária: Evitar a doença em pessoas saudáveis
- Secundária: Diagnosticar antes que apareçam sinais, sintomas e complicações
- Terciária: Reabilitar, reduzir os prejuízos, evitar doenças secundárias
- Quaternária: Evitar diagnósticos, exames e tratamentos desnecessários
- Quinquenária: Evitar que o cuidador adoeça
Meio
1.- Medicina Baseada na Narrativa
O meio mais forte de alcançar isso é ouvir melhor nossos pacientes. Isto é o que foi chamado de Medicina Baseada na Narrativa, que significa adaptar o medicalmente possível ao individualmente necessário e desejado. O que precisamos é de uma relação forte e sustentável com nossos pacientes e sua confiança em nossa honestidade e conhecimento específico.[9]
2.- Medicina Baseada em Evidências
O outro meio importante é o que chamamos de Medicina Baseada em Evidências. O conhecimento dos valores prováveis preditivos de exames de diagnóstico e as probabilidades do tamanho dos efeitos benéficos e nocivos da terapia e medidas preventivas nos dão a oportunidade de deixar de lado muitos procedimentos inúteis.
Tipos de intervenções
Os profissionais de saúde devem estar conscientes das consequências das suas decisões, e incluir intervencões de prevenção quaternária na sua prática diária com cada paciente.[10]
- Prevenir efeito cascata:
- - Prevenir a cascata diagnóstica
- - Prevenir a cascata terapêutica
- Prevenir a promoção de doenças
- Prevenir a medicalização
Actividades
- Não confundir factor de risco com doença,[11][12]
- Evitar exames de rotina (“check –up”) ou exames complementares desnecessários,[13][14]
- Evitar o intervencionismo tecnológico na saúde.
- Evitar o sobrediagnóstico da escoliose (denominado escuoliosis – “escolaliose” – em espanhol).
- Evitar o tratamento farmacológico da hipercolesterolémia em prevenção primária.[15]
- Evitar o tratamento hormonal de substituição durante a menopausa.
- Evitar o uso de antibióticos indiscriminadamente (muitas vezes desnecessário, com o consequente aumento não justificado das resistências bacterianas).
- Evitar o diagnóstico genético desnecessário (por exemplo: a promoção do rastreio da hemocromatose, de duvidoso valor científico, mas com indubitável efeito na medicalização da sociedade).[16]
- Evitar o sobrediagnóstico e sobretratamento da perturbação de hiperactividade com défice da atenção (PHDA).[17]
- Elaborar protocolos diagnostico-terapêuticos validados que se mostrem eficazes na prevenção da lesão renal na minoría de pacientes con ectasia piélica “complicada”, e evitar os excessos de intervenção na maioria dos pacientes con ectasia piélica “simples”.[18]
Ver também
Referências
- ↑ Jamoulle M. About prevention; the Quaternary prevention. UCL. 2008.
- ↑ «Gervás J. La prevención cuaternaria. OMC. 2004;(95):8» (PDF). Consultado em 13 de fevereiro de 2011. Arquivado do original (PDF) em 26 de julho de 2011
- ↑ 3,0 3,1 «Kuehlein T, Sghedoni D, Visentin G, Gérvas J, Jamoule M. Prevenção quaternária, uma tarefa do clínico geral. PrimaryCare. 2010; 10(18):350-4.» (PDF). Consultado em 12 de janeiro de 2011. Arquivado do original (PDF) em 30 de agosto de 2011
- ↑ Jamoulle M. Information et informatisation en médecine générale. In: Berleur J, Labet-Maris Cl, Poswick RF, Valenduc G, Van Bastelaer Ph. Les informa-g-iciens. Namur (Belgique): Presses Universitaires de Namur; 1986. p.193-209.[ligação inativa]
- ↑ Jamoulle M. Quaternary prevention, an answer of family doctors to overmedicalization. International Journal of Health Policy and Management. 4-Feb-2015; 4:1–4.
- ↑ «Bentzen N, editor. WONCA Dictionary of general/family practice. Copenhagen: Maanedskift Lager; 2003.». Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original em 30 de junho de 2012
- ↑ «Gérvas J. Malicia sanitaria y prevención cuaternaria. Gac Med Bilbao. 2007; 104:93-6». Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original em 4 de março de 2016
- ↑ Gérvas J. Prevención cuaternaria. Acta Sanitaria. 2011/01/10.[ligação inativa]
- ↑ Greenhalgh T, Hurwitz B (ed.). Narrative based Medicine – Dialogue and Discourse in Clinical Practice. London: BMJ Books; 1998.
- ↑ «Gérvas J. ¿El trabajo diario? ¡Basado en la prevención cuaternaria!. Boletín REAP. 2007; 4(1):6-7.» (PDF). Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original (PDF) em 17 de março de 2012
- ↑ «Gérvas J. Pérez Fernández M. Uso y abuso del poder médico para definir enfermedad y factor de riesgo, en relación con la prevención cuaternaria. Gac Sanit. 2006; 20(Supl 3):66-71.» (PDF). Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original (PDF) em 23 de setembro de 2011
- ↑ Miguel F. Factores de riesgo: una nada inocente ambigüedad en el corazón de la medicina actual. Aten Primaria. 1998; 22:585-95.
- ↑ «Gérvas J. Chequeos. Acta Sanitaria. 2010/09/06.». Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original em 3 de setembro de 2011
- ↑ «Segura Benedicto A. Cribado de enfermedades y factores de riesgo en personas sanas. El lado oscuro de la fuerza. Humanitas. 2008 sept; (31):1-17.». Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original em 22 de março de 2012
- ↑ «Gérvas J. Moderación en la actividad médica preventiva y curativa. Cuatro ejemplos de necesidad de prevención cuaternaria en España. Gac Sanit. 2006; 20(Supl 1):127-34.» (PDF). Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original (PDF) em 27 de março de 2010
- ↑ «Gérvas J, Pérez Fernández M. Genética y prevención cuaternaria. El ejemplo de la hemocromatosis. Aten Primaria. 2003; 32:158-62.» (PDF). Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original (PDF) em 17 de março de 2012
- ↑ Morell Sixto ME, Martínez González C, Quintana Gómez JL. Disease mongering, el lucrativo negocio de la promoción de enfermedades. Rev Pediatr Aten Primaria. 2009; 11(43):491-512.
- ↑ «González de Dios J, Ochoa Sangrador C. Ectasia piélica perinatal, efecto cascada y prevención cuaternaria. An Pediatr (Barc). 2005; 63(1):83-5.» (PDF). Consultado em 30 de março de 2011. Arquivado do original (PDF) em 27 de março de 2010
Bibliografia
- UEMO, European Union of General Practitioners / Family Physicians, Santiago LM. Quaternary prevention. Document 2008/040, October 2008.[ligação inativa]
- Marc Jamoulle. la prévention quaternaire, une tâche explicite du médecin généraliste. Prospective Jeunesse. 2012; 7–11.[ligação inativa]
Ligações externas
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