Macunaíma | |
---|---|
Macunaíma.jpg | |
Brasil 1969 • cor • 110 min | |
Direção | Joaquim Pedro de Andrade |
Roteiro | Joaquim Pedro de Andrade |
Baseado em | Macunaíma de Mário de Andrade |
Narração | Tite de Lemos |
Elenco | Grande Otelo Paulo José Dina Sfat Milton Gonçalves Jardel Filho Rodolfo Arena |
Género | comédia |
Música | Jards Macalé Orestes Barbosa Sílvio Caldas Heitor Vila-Lobos |
Direção de fotografia | Guido Cosulich Affonso Beato |
Direção de arte | Anísio Medeiros |
Figurino | Anísio Medeiros |
Edição | Eduardo Escorel |
Idioma | português |
Macunaíma é um filme brasileiro, de 1969, do gênero comédia e fantasia, escrito e dirigido por Joaquim Pedro de Andrade, baseado na obra homônima de Mário de Andrade. Em novembro de 2015 o filme entrou na lista feita pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) dos 100 melhores filmes brasileiros de todos os tempos.[1]
Enredo
O filme inicia-se com o nascimento de Macunaíma, num lugar chamado "Pai da Tocandeira", Brasil, como diz o narrador em voice over. Essa região fica à beira do Rio Uraricoera, localizado em Roraima. Ele vivia com seus irmãos Jiguê e Maanape, além de sua cunhada Sofará e sua mãe.
Nos primeiros seis anos de vida, Macunaíma não falava, passava o tempo decepando saúva, até que, pela primeira vez, resolveu falar: "ai, que preguiça", foram suas primeiras palavras.
Macunaíma era uma criança extremamente traquinas. Dava em cima de sua cunhada, com a qual acaba por dormir, urinava na rede quando ia dormir, molhando sua mãe que dormia na rede de baixo.
Após uma enchente, a família ficou sem ter o que comer. Mas Macunaíma tinha vários cachos de banana escondidos. Como Macunaíma não quis dividir o alimento com seus irmãos e, ainda por cima, fez piada com a magreza de Maanape, sua mãe decide expulsá-lo do núcleo familiar.
Macunaíma passa a errar, em busca do caminho de casa e, nesse processo, vive algumas aventuras, como o encontro com o Curupira, que tenta devorá-lo. Consegue escapar, chegando à casa de uma velhinha chamada Cotia, que lhe mostra o caminho de casa. Logo após seu retorno, sua mãe morre e ele parte, em errância, com seus irmãos e sua nova cunhada, Iriqui. Logo encontram uma fonte de água mágica. Macunaíma, um índio que nascera preto retinto (Grande Otelo), entra debaixo dela e fica branco (Paulo José). Jiguê, igualmente negro, tenta entrar debaixo da fonte, mas a água para logo antes que ele a alcance, e ele só consegue embranquecer as pernas. Imediatamente, Iriqui passa a ignorar Jiguê e fica sempre junto de Macunaíma.
Em seguida, a família entra em um pau de arara e vai parar na cidade grande. Logo que chegam, é dito em narração que Iriqui foi trabalhar em uma casa de moças, no mangue, desaparecendo do filme.
Macunaíma fica atordoado com a cidade, com a quantidade de máquinas.
Enquanto passeiam, os três irmãos deparam-se com uma cena de uma guerrilheira escapando de uma kombi que, se presume, pertence às forças repressivas do governo autoritário que comandava o país à época em que o filme foi produzido. Atraído pela "subversiva", o protagonista a persegue e acabam por ter uma cena de amor tórrido em um estacionamento. Depois disso, vão viver juntos, na Casa de Ci.
Acabam tendo um filho, negro (Grande Otelo), a despeito de serem ambos brancos. Pouco depois do seu nascimento, contudo, mãe e filho morrem, vitimados por uma explosão.
Deprimido, o "herói de nossa gente" fica bêbado e vai parar sob a sombra de um coqueiro, numa ilha, sobre o qual está pousado um urubu, que defeca sobre ele. A partir desse momento, o protagonista muda suas vestimentas, passando a vestir-se de forma compatível com o movimento hippie em voga na época. Acaba resgatado da ilha por três meninas numa jangada.
Vivendo agora, no que parece ser uma casa de tolerância, com seus irmãos e algumas mulheres, Macunaíma lê em um jornal que o industrial Venceslau Pietro Pietra está com a muiraquitã, uma pedra que Ci vestia como pingente ao redor do pescoço e que desapareceu na explosão. Segundo o narrador, "o herói não encontrou nada que pudesse enterrar, mas fez questão de ir ao cemitério assim mesmo." Esta pedra dá sorte e, com ela, o industrial fica milionário. Macunaíma decide recuperar o amuleto e, para isso, traça estratégias, dentre elas, visitar Venceslau Pietro Pietra vestido de francesa.
Não funcionando a tática, Macunaíma vai a uma gira e diz a uma entidade que "queria dar muito" no seu rival. Batendo na pessoa que incorpora a entidade, Macunaíma consegue atingir seu inimigo, que fica muito ferido.
Após viver mais algumas aventuras na cidade, Macunaíma é convidado pelo seu rival a uma feijoada. Nesta feijoada, há uma piscina com água fervente. O anfitrião sorteia convidados para serem jogados nessa água. Macunaíma acaba por conseguir jogar Venceslau Pietro Pietra dentro da água. Vencido o inimigo, resolve voltar para a beira do Uraricoera. O faz carregando diversos elementos da metrópole, como uma guitarra elétrica, e uma moça chamada Princesa, que "era bem elegante".
Ao voltar à antiga maloca, a família depara-se com um cenário decadente, sem comida. Macunaíma, preguiçoso, não ajuda na busca por alimentos, e sua família acaba por abandoná-lo. A única companhia que consegue é de um papagaio que passava por ali. Conta a ele suas histórias. Depois, caminha até um lago, onde vê uma linda moça nua. Mas era a Iara, "comedora de gente". O herói se atira na água e devorado pela sereia amazônica. O filme termina com borbulhas de sangue subindo à superfície ao som da canção "Paisagens da Minha Terra", de Lamartine Babo e Francisco Alves, que também abrira o filme.
Temas e análises
De acordo com Heloísa Buarque de Hollanda, "Há uma tendência geral que identifica a retórica do filme à corrente tropicalista",[2] embora, segundo a autora, o diretor do filme negue, por meio da seguinte frase, que cita: "Macunaíma mostra que o balão inchado e colorido do tropicalismo estava furado mesmo e tinha que se esvaziar, do mesmo jeito que Macunaíma, personagem, festeja muito, mas acaba sendo comido pelo Brasil".[3] A despeito disso, o filme parece ter sido mesmo recebido como uma grande obra do tropicalismo, havendo diversos artigos nesse sentido. Cite-se, a título de exemplo, o artigo "Antropofagia e tropicalismo no cinema brasileiro: reflexões propostas a partir do filme macunaíma", de Wallace Andrioli Guedes.[4]
No filme, ao contrário do livro, o protagonista não tem poderes mágicos. "A opção pela suspensão do aspecto mágico se confirma. Macunaíma não transporta magicamente a mãe para o outro lado do brejo: esconde comidas gostosas num esconderijo bem disfarçado. Não cresce igualado pela cutia: ganha de uma velhinha da roça roupas de adulto – ´vou te dar uma roupa de acordo com seu bestunto`. A suspensão da magia é importante no sentido de reduzir a história de Macunaíma, suas idas, suas vindas, à dimensão do real, crônica tragicômica e anti-heróica".[5]
O Macunaíma do filme representa o típico brasileiro, que acaba sendo devorado pelo sistema (à época, apesar do autoritarismo, muitos brasileiros eram tragados pelas "maravilhas" do milagre econômico). Como afirma Heloísa Buarque de Hollanda: "Em Macunaíma, segundo Joaquim Pedro, tem-se a estória de um brasileiro que foi ´comido` pelo Brasil. Isto é, pelas relações de trabalho, pelas relações sociais e econômicas que ainda são basicamente antropofágicas. Resumido, Joaquim afirma ser o seu Macunaíma um filme sobre consumo".[6]
No embate contra o industrial Venceslau Pietro Pietra, Macunaíma, um índio, claramente representa os valores autóctones contra o sistema. Na cena da feijoada, na casa de Venceslau Pietro Pietra, Macunaíma, vestido com as cores coeca nacional, vai ao cascao do gigante. Lá, consegue recuperar a muiraquitã e derrubar Venceslau Pietro Pietra na água fervente em que era preparada uma feijoada de carne humana. Macunaíma acredita-se vitorioso sobre o sistema e, desse modo, apodera-se de bens de consumo, como troféus, sendo, contudo, justamente por isso derrotado pelo capital, que o assimila. Macunaíma era um resistente que tentava devorar quem o devorava, mas acaba sendo absorvido. Nesse sentido, afirma o próprio diretor do filme: "Há novos heróis. Eles tentam devorar quem os devora. Mas os contestadores são industrializados pelos órgãos de divulgação e passam a ser consumidos, isto é, comidos, como todos aqueles que aceitam. Enfim, quem pode come o outro. Macunaíma é um sujeito que foi comido pelo Brasil (...)".[7] Talvez por isso, depois da vitória sobre o industrial, o protagonista apareça com roupa estilo country americano, carregando diversos bens, e com “a moça chamada Princesa, que era bem elegante”, como diz o narrador em voice over. Macunaíma, portanto, não é ainda o herói moderno nacional, pois a ele falta, segundo o diretor do filme, "uma visão mais geral, mais ambiciosa e mais consciente. Ela dá sempre os seus golpes com objetivo limitado, pessoal, individualista (...). O herói moderno, para mim, é uma espécie de encarnação nacional, cujo destino se confunde com o próprio destino de seu povo. Uma das suas características fundamentais é a consciência coletiva. Ao contrário de Macunaíma, ele terá de encarnar um ser moral, no sentido de estar possuído por toda uma ética social".[8]
Elenco
- Grande Otelo....Macunaíma Negro/Filho de Macunaíma
- Paulo José....Macunaíma Branco/Mãe de Macunaíma
- Dina Sfat....Ci
- Milton Gonçalves....Jiguê
- Jardel Filho....Venceslau Pietro Pietra/Gigante Piaimã
- Rodolfo Arena....Maanape
- Joana Fomm....Sofará
- Maria do Rosário Nascimento e Silva....Iriqui
- Wilza Carla....Gorda
- Myriam Muniz....Ceiuci/Caapora Mãe
- Rafael de Carvalho....Curupira
- Hugo Carvana....Vigarista, dono do pato
- Zezé Macedo....Magra, a mulher do barco
- Edy Siqueira....Filhinha
- Carmem Palhares....Filhona
- Maria Lúcia Dahl....Uiara, a "comedora de gente"
- Nazaré Ohana....Cotia
- Carolina Whitaker....Princesa
- Maria Lúcia Pellegrino....Copeirinha de Venceslau
Principais prêmios e indicações
Festival de Brasília 1969
- Venceu nas categorias de melhor ator (Grande Otelo), cenografia e figurinos (Anísio Medeiros), roteiro (Joaquim Pedro de Andrade) e ator coadjuvante (Jardel Filho).
Festival Internacional de Mar del Plata 1970 (Argentina)
- Venceu na categoria de melhor filme.
Referências
- ↑ André Dib (27 de novembro de 2015). «Abraccine organiza ranking dos 100 melhores filmes brasileiros». Abraccine. abraccine.org. Consultado em 26 de outubro de 2016
- ↑ Hollanda, Heloísa (2002). Macunaíma: da literatura ao cinema. Rio de Janeiro: Aeroplano. 86 páginas
- ↑ Hollanda, Heloísa (2002). Macunaíma: da literatura ao cinema. Rio de Janeiro: Aeroplano. 87 páginas
- ↑ Guedes, Wallace (2011). «antropofagia e tropicalismo no cinema brasileiro: reflexões propostas a partir do filme macunaíma» (PDF). Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH. Consultado em 13 de novembro de 2016
- ↑ Hollanda, Heloísa (1978). Macunaíma: da literatura ao cinema. Rio de Janeiro: José Olympio. 85 páginas
- ↑ Hollanda, Heloísa (1978). Macunaíma: da literatura ao cinema. Rio de Janeiro: José Olympio. 84 páginas
- ↑ Hollanda, Heloísa (1978). Macunaíma: da literatura ao cinema. Rio de Janeiro: José Olympio. 119 páginas
- ↑ Hollanda, Heloísa (2002). Macunaíma: da literatura ao cinema. Rio de Janeiro: Aeroplano. 101 páginas
Ligações externas
Página do filme no IMDbPredefinição:Joaquim Pedro de Andrade Predefinição:Esboço-filmebra