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Epicurismo

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Busto de Epicuro.

O epicurismo é o sistema filosófico que prega a procura dos prazeres moderados para atingir um estado de tranquilidade e de libertação do medo, com a ausência de sofrimento corporal pelo conhecimento do funcionamento do mundo e da limitação dos desejos. Já quando os desejos são exacerbados podem ser fonte de perturbações constantes, dificultando o encontro da felicidade que é manter a saúde do corpo e a serenidade do espírito, ensinado por Epicuro de Samos, filósofo ateniense do século IV a.C., e seguido depois por outros filósofos, chamados epicuristas. Epicuro também é conhecido como o Filósofo do Jardim, pois "O Jardim" foi como ficou conhecida a escola por ele fundada e que consistia numa comunidade de amigos e seguidores. Lá, escreveu com detalhes a filosofia que iria se tornar conhecida como epicurismo.[1][2]

Segundo Epicuro, para ser feliz seria necessário controlar os nossos medos e desejos de maneira que o estado de prazer seja estável e equilibrado, com um consequente estado de tranquilidade e de ausência de perturbação.

No Jardim, em Atenas, Epicuro escreveu mais de 300 trabalhos, dos quais nenhum sobreviveu; deles restam apenas notícias de seus discípulos ou alguns fragmentos. Sua filosofia é de cunho materialista, não havendo espaço para a imortalidade.[3] O filósofo acreditava que o maior bem era a procura de prazeres moderados de forma a atingir um estado de tranquilidade, chamado de ataraxia, e de libertação do medo, assim como a ausência de sofrimento corporal, conhecida como a aponia; por meio do conhecimento do funcionamento do mundo e da consciência da limitação dos desejos. A combinação desses dois estados constituiria a felicidade na sua forma mais elevada.

A finalidade da filosofia de Epicuro não era teórica, mas bastante prática. Buscava sobretudo encontrar o sossego necessário para uma vida feliz e aprazível, na qual os temores perante o destino, os deuses ou a morte estavam definitivamente eliminados. Para isso, fundamentava-se em uma teoria do conhecimento empirista, em uma física atomista e na ética.

No mundo mediterrânico antigo, a filosofia epicurista conquistou grande número de seguidores. Foi uma escola de pensamento muito proeminente por um período de sete séculos depois da morte do fundador. Posteriormente, quase relegou-se ao esquecimento devido ao início da Idade Média, período em que se perderam a maioria dos escritos deste filósofo grego.

A ideia que Epicuro tinha era a de que, para ser feliz, o homem necessitava de três coisas: liberdade, amizade e tempo para filosofar. Na Grécia Antiga, existia uma cidade na qual, em todas as paredes do mercado, se havia escrito toda a filosofia da felicidade de Epicuro, procurando conscientizar as pessoas de que comprar e possuir bens materiais não as tornariam mais felizes, como elas então acreditavam.[4]

História

O epicurismo foi uma corrente filosófica surgida durante o período da Antiguidade conhecido como helenismo, que se inicia no final do século IV a.C. "Trata-se, portanto, do período iniciado com a formação dos reinos que dividiram entre si o império de Alexandre, o Grande, e que durou até a conquista romana, em 146 a.C., quando a Grécia foi declarada província romana. Segundo alguns historiadores, esse período iria até o advento de Augusto e a definitiva consolidação do Império Romano (aproximadamente 20 a.C.)".[5]

Como figura notória deste período, tem-se Alexandre III da Macedônia, que ficou conhecido historicamente como Alexandre, o Grande. Educado por Aristóteles e familiarizado com a cultura grega, Alexandre foi responsável por conquistar a Mesopotâmia, a Pérsia, a Fenícia, a Palestina e o Egito. Uma de suas técnicas de dominação era realizar a manutenção das instituições culturais dos vencidos, o que resultou na fusão dos elementos culturais gregos e orientais; a esta nova cultura chamou-se de helenismo. A conquista do Oriente provocou uma série de alterações políticas e culturais, e as tendências filosóficas do período são a expressão dessas mudanças, como no caso do epicurismo.[5]

Princípios filosóficos

Epicuro viveu as contradições deste novo mundo. Sua filosofia se opôs à metafísica de Aristóteles, cuja origem ele chama de espiritualismo de Platão, que defendia a ideia de uma dimensão além do insensível, supra-real, ao qual seria o fundamento que constituiria o mundo que vemos, tocamos e participamos. Com uma filosofia de não determinismo, Epicuro defende a ideia de que nada está além dos nossos sentidos, e que não existiria nenhuma realidade que não poderia ser entendida com auxílio dos nossos cinco sentidos, princípio denominado "naturalismo radical". Para esclarecer este fundamento, que é compreendido por três tomadas de consciência do indivíduo e funciona como um caminho para a felicidade, divide-se ele em três postulados, segundo o estudioso Juvenal Savian Filho:[5]

Compreensão dos deuses

Segundo a crença dos gregos, os deuses estariam preocupados com o ser humano, sendo responsáveis pelas suas vitórias ou desgraças, o que acarretaria um medo inerente ao homem, que temeria ser punido a qualquer momento por um de seus atos. Epicuro critica esta ideia e defende que os deuses existem, mas não estão preocupados conosco. Afinal, como afirma em sua metodologia do conhecimento, os juízos que temos dos deuses não se baseiam em prolepses, isto é, em imagens formadas pelas repetições, que produzem veracidade, e nos permitem chegar em conclusões sobre o real. Os deuses, para alguns estudiosos da filosofia de Epicuro, não tomam consciência dos humanos, afinal, na perfeição não poderia caber a imperfeição, sequer por conhecimento. Se os deuses não se encarregam de nosso destino, benção ou maldição, cabe a nós mesmos a responsabilidade. A felicidade ou o sofrimento depende das escolhas de cada um.[5]

Compreensão da morte

Para acabar com o temor da morte, Epicuro defende a ideia da morte como sendo o nada. A dor e o sofrimento residem nas sensações, na vida como fardo, e se a morte é o total aniquilamento do "viver", o sábio de nada tem a temer. A lógica é que se é a vida e as sensações que causam o sofrimento do indivíduo, a morte existiria para cessar as sensações, ser o nada, a privação total. Portanto, é inadmissível aceitar que ocorreria sofrimento, pois a morte ocasionaria o extermínio das sensações.[5]

Compreensão dos desejos

É necessário compreender a distinção entre os desejos naturais e desejos inúteis, infundados ou também chamados de frívolos. Para Epicuro, o desejo se origina de uma falta, que pode partir da natureza (desejo natural) ou de uma opinião falsa (desejo frívolo). Os desejos podem ser divididos em:

  • Desejos naturais e necessários: são os desejos que livram o corpo da dor da fome e da sede;
  • Desejos naturais e não necessários: são os desejos que surgem da vontade de variar, por exemplo o alimento ou a bebida, para variar também o prazer do corpo;
  • Desejos não naturais e não necessários: são os que nascem de uma opinião falsa sobre o mundo, incentivados por sentimentos de vaidade, orgulho ou inveja.

Epicuro tem uma finalidade concreta: a eliminação das dores e a busca dos prazeres. O sábio deveria desejar os objetos simples e naturais e saber que, por ser imperfeito, sentirá dor, inevitavelmente.[6]

O sábio é, portanto, aquele que toma consciência da própria existência e destino, não aceitando o determinismo de nenhum deus. Para ele, o importante na busca é a saúde física e a serenidade interior, ocasionadas pela escolha de quais desejos deverão ser saciados. A felicidade reside, então, na saúde do corpo e da alma, que não pode ser entendida, obviamente, como metafísica, mas parte fundamental da própria existência corpórea. Ser feliz é ter pleno domínio destes prazeres, o que pode ser alcançado com a compreensão da natureza dos deuses, da morte e dos desejos.[5]

O caminho do conhecimento

A teoria do conhecimento epicurista caracteriza-se pela valorização da experiência imediata,[7] ou seja, para Epicuro, todo o conhecimento tem como origem as sensações e impressões dos sentidos e todas as sensações são sempre verdadeiras. Por exemplo: um remo, se visto dentro da água, possui uma imagem retorcida, porém, se visto fora dela, possui aparência reta e plana. Neste caso, qual das sensações estaria correta? Para Epicuro, não há erro, apenas uma precipitação. O remo sempre aparentará ser retorcido, caso visto de dentro da água. Para esclarecer isto, o filósofo utilizou do termo "prolepse", que pode ser entendido como um resquício de percepção anterior, uma espécie de "arquivo de nossa memória." Será a repetição das percepções que irá determinar qual a "verdadeira" forma do remo e construir o conhecimento dentro da ética epicurista.[8]

Diferença entre epicurismo e hedonismo

Embora o epicurismo seja uma doutrina muitas vezes confundida com o hedonismo, já que declara o prazer como o único valor intrínseco, a sua concepção da ausência de dor como o maior prazer e a sua apologia da vida simples tornam-no diferente: o hedonismo, além de levar em conta os prazeres sexuais, incentiva o prazer intensamente, enquanto no epicurismo o prazer possui papel passivo, na ausência de paixões e na eliminação de qualquer fator que cause o sofrimento ou temor, como a morte.[1]

Os aforismos de Epicuro

No livro Máximas Principais,[9] João Quartim de Moraes, professor aposentado da Universidade Estadual de Campinas, traduz os principais aforismos que apresentam a ética das ideias de Epicuro. Em síntese, na forma como foram traduzidos pelo estudioso, com um breve comentário:

Aquele que é plenamente feliz e imortal não tem preocupações, nem perturba os outros; não é afetado pela cólera ou pelo favor, já que tudo isso é próprio à fraqueza.

Para Epicuro, os deuses existem, mas não se preocupam conosco. Como seres perfeitos de nada necessitam, nem de ninguém. Sentir ódio, raiva e medo é condição própria de seres imperfeitos, não dos deuses, cuja condição divina não permite que careçam de algo além de si mesmos.

É impossível viver prazerosamente sem viver prudente, bela e justamente, nem viver prudente, bela e justamente sem viver prazerosamente. Aquele que está privado daquilo que permite viver prudente, bela e justamente, não pode viver feliz, mesmo se for correto e justo.

"É preciso ser sábio, não para ter prazer (todos os experimentam), mas para viver prazerosamente".[10] Para Epicuro, a vida prazerosa exige paz de espírito, não sendo somente a totalidade dos prazeres da vida. A principal diferença, portanto, do epicurismo e do hedonismo é que o primeiro considera o prazer do repouso, a experiência psíquica da lembrança também é um prazer; enquanto a segunda considera apenas a experiência prazerosa no momento de sua fruição.

Nenhum prazer é em si mesmo um mal, mas aquilo que produz certos prazeres acarreta sofrimentos bem maiores do que os prazeres.

Nenhum prazer é, por essência, ruim: é o que produzimos com ele que, dependendo do tamanho de seu sofrimento, ditará se realmente valerá ser saciado. O prazer de tomarmos um copo de água quando estamos com muita sede é tão verdadeiro quanto o sofrimento de ser afogado pelas águas do mar. As drogas, por exemplo, usadas sem critério médico, podem produzir um mal muito maior que a euforia ou bem-estar que causam quanto ao prazer imediato que proporcionam. Em síntese, o prazer e o sofrimento resultam da relação do corpo com os objetos circundantes.

Aqueles desejos naturais que quando permanecem insatisfeitos não provocam padecimento, mas suscitam forte tensão, são produto de uma vã opinião, e quando não se dissipam não é por causa de sua natureza própria, mas da futilidade humana.

"Epicuro considera naturais e necessários os desejos que suprimem o padecimento, por exemplo, de beber quando temos sede, ao passo que por naturais e não necessários ele entende aqueles que apenas diversificam o prazer sem remover o padecimento" (MORAES, 2010, p. 47). A passagem é um escólio de Diógenes Laércio, que esclarece um ponto fundamental do aforismo quanto a diferenciação dos desejos ditos "naturais e necessários" e outros "naturais e não necessários." Por serem desejos naturais, logo, não deveriam nos perturbar. Se isso realizam, são baseados em opiniões vazias, ocas. É comum chamarmos de "futilidade" o vício de seguir esse tipo de opinião.[9]

Ver também

Referências

  1. 1,0 1,1 MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. - 8ª Edição. - Rio de Janeiro: Jorhe Zahar Ed., 2001.
  2. Buckingham, W. et al. O Livro da Filosofia. São Paulo, Globo Livros, 2011.
  3. AZEVEDO, Antonio Carlos do Amaral. Dicionário de termos e conceitos históricos. Colaboração de Rodrigo Lacerda. - Rio de Janeiro; Nova Fronteira, 1997. 2ª edição revista e ampliada.
  4. Documetário: Epicuro e a Felicidade. Francisco Marvão.
  5. 5,0 5,1 5,2 5,3 5,4 5,5 FILHO, Juvenal Savian. O Epicurismo e a ética: uma ética do prazer e da prudência. - Centro Universitário São Camilo - 2009;3(1):10-17.
  6. DE CARVALHO, Ericsson Venâncio Coriolano Ruy. O DESEJO NO EPICURISMO."
  7. [Marcondes, Danilo: Iniciação à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein/Danilo Marcondes. 8ª ed. - Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.]
  8. Silva, Daniel Linhares Araujo da. O sistema de Epicuro: dos elementos primordiais ao cultivo de si para a vida feliz / Daniel Linhares Araujo da Silva; orientadora: Irley Fernandes Franco. – 2009. 113 f.; 30 cm. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008.
  9. 9,0 9,1 [MORAES, João Quartim de Moraes. Epicuro: Máximas Principais, Edições Loyola, São Paulo, 2010.]
  10. MORAES, 2010, p. 23

Bibliografia

Wikiquote
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  • SPINELLI, Miguel. Epicuro e as bases do epicurismo. São Paulo: Paulus, 2013

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